Ex..mo Senhor
Capitão do Porto de Caminha
Largo Pêro Vaz
4910-131 CAMINHA
V.ª Ref.ª
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V.ª Comunicação
02/07/2012
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Nossa Ref.ª
Proc. Q-1669//12 (A1)
Proc. Q-2000/13 (A1)
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RECOMENDAÇÃO N.º 10/A/2013
(artigo 20.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 9/91, de 9 de abril, na redação da Lei n.º 17/2013,
de 18 de fevereiro)
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Assunto: Pesca lúdica – Troço internacional do rio Minho
1. Dirijo-me a V. Ex.a. depois de ter concluído a apreciação de duas queixas, em que se contestava a necessidade de, além da licença para praticar pesca desportiva em águas interiores, obter licença da Capitania do Porto de Caminha para pescar com cana, em terra firme, no troço internacional do rio Minho.
2. Houve oportunidade de sujeitar as questões controvertidas a contraditório pelo antecessor de V. Ex.a que insistia neste entendimento, louvando-se, no entanto, na Lei n.º 7/2008, de 15 de fevereiro, cuja entrada em vigor, contudo, continua a depender do decreto-lei de desenvolvimento (artigos 40.º e 42.º).
3. O quadro normativo aplicável continua a ser o da Lei n.º 2097, de 6 de junho de 1959 (Bases do Fomento Piscícola no Interior do País), com as alterações introduzidas pela Lei n.º 30/2006, de 11 de julho, e do Decreto n.º 44 623, de 10 de outubro de 1962, com alterações introduzidas por este último diploma e com outras anteriormente efetuadas pelo Decreto-Lei n.º 312/70, de 6 de julho.
4. E, neste contexto, concluímos faltar razão ao entendimento do antecessor de V. Ex.a, o que, de resto, já vinha sendo sufragado pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, IP, a cuja audição procedemos.
5. É verdade que o citado Decreto n.º 44 623, de 10 de outubro de 1962, afasta expressamente do seu âmbito de aplicação o exercício da pesca em águas sob jurisdição marítima.
6. E, por outro lado, não restam dúvidas quanto à jurisdição da Autoridade Marítima Nacional sobre o Troço Internacional do Rio Minho, nos termos do Regulamento Geral das Capitanias (artigo 2.º, n.º 1, artigo 4.º, n.º 1, e Anexo‑Quadro n.º 1, do Decreto-Lei n.º 265/72, de 31 de julho).
7. Como tal, a jurisdição marítima estende-se a algumas águas interiores, em certos troços de rios ou seus afluentes, afastando a jurisdição do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, IP (artigo 14.º, alínea a), do Decreto-‑Lei n.º 135/2012, de 29 de junho).
8. Estas premissas, contudo, não permitem afirmar que a licença para pesca desportiva, a partir de terra firme, não seja suficiente para esta prática no troço internacional do rio Minho.
9. Este dispõe de uma regulamento de pesca próprio, aprovado pelo Decreto n.º 8/2008, de 9 de abril, onde se determina que, para a pesca desportiva, contanto que a partir de terra firme, é válida também a licença comum para pesca desportiva em águas interiores, deferida pelas autoridades portuguesas ou espanholas.
10.Com efeito, determina-se que para a pesca nestas estas águas são exigidas as licenças e documentos emitidos pelas autoridades competentes de cada país (artigo 4.º, n.º 1).
11.Mas, acrescenta-se que «para a pesca desportiva desde terra firme são também válidas as licenças regulamentares previstas em cada país para a pesca desportiva em águas interiores» (artigo 4.º, n.º 2).
12.Por terra firme entende-se «o terreno das margens do troço internacional do rio Minho que na máxima baixa-mar não fique coberto ou circundado de água» e ainda «as ilhas que no Tratado de Limites[1] estão atribuídas a Portugal ou à Espanha» (artigo 2.º, n.º 1).
13.Apenas restam dúvidas quanto à situação dos denominados «areinhos», cuja caraterização hidrográfica varia, de tempos a tempos, e justifica, por isso, uma definição anual pela Comissão Permanente Internacional do Rio Minho (artigo 2.º, n.º 3).
14.Por seu turno, como pesca desportiva – por contraste com a pesca profissional – considera-se exclusivamente a pesca com cana ou artes similares (artigo 3.º, n.º 1).
15.Estas disposições do Regulamento da Pesca no Troço Internacional do Rio Minho não contrariam norma legal nem de direito internacional a que devam subordinar-se. Antes se revelam lei especial, no sentido do artigo 7.º, n.º 3, do Código Civil.
16.O facto de as águas do troço internacional do rio Minho pertencerem à jurisdição marítima não afasta a aplicação do Decreto n.º 44 623, de 10 de outubro de 1962, nem da Lei n.º 2097, de 6 de junho de 1959, na parte que respeita à pesca desportiva desde terra firme.
17.De resto, para efeito de aplicação das normas sobre o Sistema de Autoridade Marítima (Decreto-Lei n.º 43/2002, de 2 de março), consideram-se as águas interiores, de par com o mar territorial e a plataforma continental, «espaços marítimos» (artigo 4.º, n.º 1).
18.É permissão bastante, por conseguinte, a licença para a pesca desportiva regulada nos artigos 52.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 44 623, de 10 de outubro de 1962, validamente deferida pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, IP, nos termos do artigo 3.º, n.º 2, alínea m), do Decreto-Lei n.º 135/2012, de 29 de junho, ou pelos serviços públicos a que sucedeu nas suas atribuições.
CONCLUSÃO
Nos termos do disposto no artigo 20.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 9/91, de 9 de abril, e em face das motivações precedentemente apresentadas, recomendo a V. Ex.a que admita como suficiente para a prática da pesca desportiva desde terra firme, nas águas do troço internacional do rio Minho, a licença para praticar a pesca desportiva em águas interiores, prevista na Base V da Lei n.º 2097, de 6 de junho de 1959, e nos artigos 52.º e seguintes do Decreto n.º 44 623, de 10 de outubro de 1962.
Dignar-se-á V.Ex.ª comunicar-me, nos próximos 60 dias, para cumprimento do disposto no artigo 38.º, n.º 2, do Estatuto do Provedor de Justiça, a sequência que a presente Recomendação vier a merecer.
O PROVEDOR DE JUSTIÇA
(Alfredo José de Sousa)
[1] Tratado de Lisboa, assinado em 29 de julho de 1864, cujos instrumentos de ratificação foram solenemente trocados em Santiago de Compostela, em 23 de junho de 1868, em vigor desde 5 de novembro de 1868.