Presidente da Câmara Municipal de Lisboa

Rec. nº 111/A/1993
Processo: R-2585/89
Data: 5-8-1993
Área: A3

ASSUNTO: SEGURANÇA SOCIAL – APOSENTAÇÃO – NULIDADE


Foi recebida nesta Provedoria uma reclamação relativamente ao facto de A. …, jardineiro além do quadro com exercício de funções na creche do Bairro Padre Cruz, ter sido aposentado, por determinação dessa Câmara, não obstante os seus dezoito anos de actividade, e ter o mesmo solicitado que lhe fosse distribuido outro trabalho, mais consentâneo com a sua falta de visão, com base na qual foi aposentado.


A aposentação do interessado, que teve lugar em 1989, deu origem a que ele deixasse de receber o vencimento de 37.400$00 mensais para passar a auferir a pensão de 19.362$00.


Em termos de justiça social, parece-me aberrante que hoje – em que tanto se fala de reabilitação – se force à aposentação um trabalhador apenas por estar cego, sem lhe dar quaisquer hipóteses de reconversão.


Mas, mesmo em termos estritamente jurídicos, não posso aceitar a argumentação dessa Câmara, expressa na informação que acompanhou o ofício com a referência …, de 92.08.03.


Alega-se nessa informação que a promoção do processo de aposentação por parte da Câmara é num mero “acto preparatório” da aposentação.

Ele é, porém, a meu ver, mais do que isso: trata-se dum acto com suficiente autonomia enquanto acto administrativo (decisão autoritária de efeitos jurídicos individualizados) e sem o qual a posterior decisão de aposentação, por parte da Caixa Geral de Aposentações, não pode ter lugar.

Por outras palavras, a aposentação é um acto consequente da respectiva promoção (também esta um acto administrativo).


Sendo assim, é inexacto afirmar-se, como se faz na citada informação, que a decisão dessa Câmara só pela via contenciosa é impugnável.

O acto de promoção da aposentação pode, enquanto tal, ser revogado.


E ainda que esse acto administrativo seja, como efectivamente é, discriminatório, ele também pode ser revogado por ilegalidade.

Com efeito, é entendimento pacífico na doutrina e jurisprudência que os actos discricionários são susceptíveis de ilegalidade e, nessa medida, anuláveis e revogáveis com efeitos retroactivos, se se houverem baseado em erro de facto ou de direito.


Ora, aqui, em meu entender, o erro consistiu na circunstância de a Câmara Municipal de Lisboa ter entendido que, por estar cego, o interessado não poderia prestar qualquer trabalho útil à autarquia (erro de facto).


Conclui-se, assim que o acto de promoção da aposentação foi um acto administrativo discricionário, viciado de ilegalidade por erro de facto, susceptível de ser revogado com efeitos retroactivos, o que determina a nulidade do seu acto consequente – a aposentação, nulidade que não necessita de ser declarada por via judicial artigos 133º, nº 2, i) e 134º, nº 2, do C.P.A.).

Estes os argumentos que me levam a

RECOMENDAR

que essa Câmara Municipal venha a revogar, com efeitos retroactivos, o acto de promoção do reclamante para a aposentação, com vista à posterior declaração de nulidade do acto consequente – a aposentação.

Com o pedido de que me seja transmitida a posição que vier a ser assumida sobre este caso

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel