A
Sua Excelência o Ministro da Justiça
Rec. n.º 190A/93
Proc.: R-3019/93
Data: 29-11-1993
Área: A 4
Assunto: FUNÇÃO PÚBLICA – CARREIRA OFICIAL DE JUSTIÇA – ALTERAÇÃO AO ESTATUTO – DECRETO-LEI N.º 364/93, DE 22 DE OUTUBRO.
Sequência:
1. Vários secretários judiciais apresentaram nesta Provedoria de Justiça reclamação onde põem em causa certos princípios legais inovadores introduzidos pelo Dec-Lei 364/93, de 22 de Outubro, que consideram lesivos dos seus direitos.
2. Assim, consideram discriminatório e inconstitucional o limite de idade fixado no art.º 49-A, entendendo, ainda, como injusta e punitiva a classificação de Muito Bom para manutenção do direito ao lugar, como é previsto no n.º 2 do mesmo preceito.
3. Analisada a reclamação, conclui assistir-lhes em parte razão, sendo certo, ainda, que em meu entender, há outros preceitos que carecem de alteração.
Vejamos:
4. Embora se vislumbrem as razões da fixação do limite de idade como motivo impeditivo da ascensão a lugar do topo da carreira, a verdade é que o Estado não pode ter comportamentos de ingratidão para muitos daqueles que dedicaram toda a sua vida à profissão, tornando impossível o objectivo primeiro da sua realização pessoal profissional.
5. Porque o fixado limite de idade não assenta em verdadeiras razões de interesse público, e porque apesar desse limite de idade o Estado continua, e bem, a permitir-lhes o exercício das suas funções, nada justifica que se corte de forma abrupta, o direito à evolução na carreira.
6. Considero, assim, que tal limite de idade carece de uma norma transitória que salvaguarde legítimas expectativas adquiridas.
7. De igual modo, considero que a exigência da classificação de Muito Bom para manutenção do lugar é excessivamente gravosa e contende com o direito ao lugar obtido na carreira.
8. Não pode esquecer-se que a classificação de Bom com distinção é já uma classificação de mérito.
9. Procede, também aqui, a reclamação apresentada.
10. No diploma em apreciação há, ainda, outros preceitos que suscitaram a minha preocupação, atendendo à sua filosofia inovadora que, por isso mesmo, alteram expressivamente o quadro normativo vigente e, por isso, são susceptíveis de causar sérias perturbações à vida e às profissões dos potenciais destinatários.
11. São eles o art.º 71-A e o art.º 86.º, na redacção dada pelo Dec.-Lei 364/93, de 22 de Outubro.
12. Por força do disposto no art.º 71-A é inquestionável que os funcionários de justiça, cujos lugares sejam extintos, passam à condição de supranumerários, podendo ser nomeados para lugar da respectiva categoria na secretaria do tribunal pertencente ao mesmo círculo judicial (redacção do n.º 2), podendo, ainda, na situação de supranumerários ser afectos ao serviço de qualquer comarca por despacho do Director Geral dos Serviços Judiciários (redacção do n.º 5).
13. Na esteira desta inovação há-de compreender-se a alteração dada à anterior redacção do art.º 86.º, onde se eliminou o n.º 2, preceito esse que garantia o direito ao lugar dos oficiais de justiça em caso de extinção dos lugares.
14. A verdade, porém, é que as inovações introduzidas não podiam esquecer as matrizes normativas em que assentava o direito ao local de trabalho dos oficiais de justiça, bem como dos demais trabalhadores, aqui se indicando, como é óbvio, os funcionários públicos.
15. Não pode ser esquecido que o oficial de justiça deve residir na localidade onde se encontra instalado o tribunal onde exerce funções (cfr. art.º 77.º n.º 1 do Dec-Lei 376/87, de 11 de Dezembro).
16. Por outro lado, era princípio assente que o funcionário só poderia ser destacado para outro tribunal, com a sua anuência (cfr. art.º 65-A na redacção dada pelo Dec-Lei 167/89, de 23 de Maio).
17. Sucedia, ainda, que em caso de transferência por extinção de lugares, os funcionários seriam colocados na secretaria do tribunal instalado na mesma comarca (cfr. art.º 86.º n.ºs 1 e 2 do Dec-Lei 376/87, de 11 de Dezembro).
18. Com a redacção dada ao art.º 86.º fica aberta livremente a possibilidade de transferência para fora da comarca, nos casos de extinção do lugar.
19. Havia, assim, até à entrada em vigor do Dec-Lei 364/93 uma preocupação saudável de estabelecer a garantia do princípio de estabilidade residencial do funcionário, como consequência do direito ao lugar.
20. Com as alterações introduzidas, e particularmente nos casos das secretarias judiciais ou secções centrais que passam a secretarias-gerais, instala-se a faculdade de livre mobilidade do funcionário.
21. Todavia, penso que as citadas disposições devem concitar a anuência dos interessados em prazo razoável, que se crê ser o de 2 anos ora previsto no n.º 4 do referido art.º 71-A.
22. É que entendo que a segurança do emprego abrange, de igual modo, a protecção do trabalhador, no caso oficial de justiça, na organização interna do serviço, pondo-o a coberto das mudanças arbitrárias do posto ou local de trabalho.
23. Têm, assim, em meu entender os secretários judiciais, bem como os demais oficiais de justiça, direito a que os seus empregos na forma dos lugares onde se encontram providos, sejam dotados de condições de estabilidade e de segurança.
24. Pelas razões indicadas, entendo haver razões para que a colocação oficiosa, só ocorra, esgotada que seja a hipótese de consenso.
25. A verdade é que a manter-se o quadro normativo recentemente entrado em vigor, muitos oficiais de justiça podem vir a ser sujeitos a medidas de transferência e de destacamento para fora da comarca onde exercem funções, com manifestos e imperiosos prejuízos para as suas vidas pessoais e profissionais.
26. Face ao exposto, tenho por bem RECOMENDAR a V.Ex.ª o seguinte:
a) Que seja sustado o movimento de oficiais de justiça previsto para Dezembro do corrente ano, conforme recomendação já dirigida ao Sr. Director-Geral dos Serviços Judiciários, de que se anexa cópia, ou que tal aconteça, pelo menos na parte relativa aos secretários judiciais em tribunais superiores e secretarias-gerais;
b) Que seja introduzida uma norma de carácter transitório por forma a não aplicar o limite de idade previsto no n.º 1 do art.º 49-A, na redacção do Dec.-Lei 364/93 de 22 de Outubro, aos oficiais de justiça que já tenham 57 anos ou aos que até ao próximo movimento perfaçam esse limite, mas em qualquer caso nunca aos oficiais de justiça que então já tenham sido providos na categoria de secretários judiciais;
c) Que seja eliminado o n.º 2 do art.º 49-A;
d) Que seja repristinado o art.º 86º na redacção anterior ao Dec-Lei 364/93;
e) Que seja alterado o art.º 71-A, passando a situação de oficiais de justiça na qualidade de supranumerários a ser regulada de modo seguinte:
N.º 1. No caso de passagem a supranumerários, por extinção do lugar, os oficiais de justiça serão colocados no quadro de pessoal da secretaria onde estavam colocados, podendo ser transferidos ou destacados para secretarias de outros tribunais da mesma comarca, ou de outras comarcas, obtida a anuência dos mesmos.
N.º 2. Em qualquer caso, a colocação oficiosa pelo Director-Geral dos Serviços Judiciários, teria lugar uma vez decorridos dois anos após a extinção do respectivo lugar.
0 PROVEDOR DE JUSTIÇA
JOSÉ MENÉRES PIMENTEL