Presidente da Cãmara Municipal de Alcácer do Sal
Rec. nº 51/A/94
Proc.:R-1952/91
Data:1994-03-033
Área: A 1
ASSUNTO: URBANISMO E OBRAS – OBRAS PARTICULARES – RECONSTRUÇÃO E AMPLIAÇÃO – RESOLUÇÃO DESFAVORÁVEL – PLANO DE PORMENOR – PLANO DE URBANIZAÇÃO – ADOPÇÃO DO PROCEDIMENTO LEGAL PELA CÂMARA MUNICIPAL.
Sequência: Acatada
A Senhora ….. apresentou nesta Provedoria de Justiça uma reclamação acerca de questões relacionadas com a resolução desfavorável tomada por essa Câmara Municipal sobre um pedido de informação respeitante à viabilidade de reconstrução e ampliação de uma moradia situada na Comporta, concelho de Alcácer do Sal.
No decurso da instrução do processo acima referenciado, esse órgão Autárquico prestou os esclarecimentos constantes dos seus ofícios, respectivamente de 9.1.1992, 24.11.1992 e 26.7.1993.
A análise de tais esclarecimentos, à luz dos preceitos normativos em vigor, suscitou a esta Provedoria de Justiça as observações formuladas nas informações anexas aos ofícios de 16.7.1992, 19.4.1993, oportunamente remetidos a essa Câmara Municipal, bem como as considerações expendidas na nova informação de que agora se junta cópia.
Ponderados, pois, os elementos do processo em causa e as pertinentes normas legais, conclui-se o seguinte:
1. 0 requerimento de 5.3.1991, da interessada, respeitante ao pedido de informação sobre a viabilidade de ampliação e reconstrução do aludido prédio, foi objecto de deliberação desfavorável desse órgão autárquico em 27.3.1991.
Ao tempo estava ainda em vigor o Dec-Lei nº 166/70, de 15 de Abril, que, embora não previsse expressamente a formulação de pedidos daquela natureza, também não a impedia, sendo ela, aliás, geralmente admitida pelas Câmaras Municipais e frequentemente praticada pelos interessados na realização de obras sujeitas a licenciamento autárquico.
Ora, destinando-se a informação pretendida a elucidar e orientar os requerentes sobre a viabilidade e os de condicionamentos das obras cujo eventual pedido licenciamento desejassem submeter ulteriormente apreciação dos competentes municípios, certamente que o conteúdo daquela informação haveria de tomar em linha de conta os condicionalismos de facto e de direito que, na altura, se revelassem favoráveis, pudessem vir a condicionar ou se mostrassem susceptíveis de vir a prejudicar o eventual e ulterior pedido de licenciamento das obras em vista, face aos instrumentos urbanísticos devidamente aprovados para o local e aos demais
condicionamentos legais e regulamentares aplicáveis ao assunto.
2. O citado Dec-Lei nº 166/70 veio a ser revogado pelo Dec-Lei nº 445/91, de 20 de Novembro (sem prejuízo da ressalva prevista no respectivo artº 72º, nº 1), havendo esse novo diploma acolhido expressamente a possibilidade de os interessados requererem às Câmaras Municipais informações prévias sobre a possibilidade de realização de obras sujeitas a licenciamento autárquico (artºs 10º a 13º, 31º a 33º, 37º, 38º e 42º a 44º).
Por isso, qualquer novo pedido que porventura venha a ser apresentado pela Senhora …. acerca da viabilidade de realização da obra em vista e dos respectivos condicionamentos haverá de ser apreciado e decidido pela Câmara Municipal de Alcácer do Sal à luz das normas do Dec-Lei nº 445/91 (entretanto alterado, por ratificação, pela Lei nº 29/92, de 5 de Setembro), bem como dos demais preceitos legais e regulamentares aplicáveis à situação em causa.
3. Mas é inegável que a anterior deliberação desfavorável de 27.3.1991, dessa Câmara Municipal, que recaiu sobre o mencionado requerimento de 5.3.1991, da impetrante, careceu de adequada fundamentação jurídica, pois nem as razões em que então se baseou foram reportadas a preceitos legais que pudessem fornecer-lhes apoio normativo seguro, nem os instrumentos urbanísticos que vieram a ser chamados a campo pelo Município para abonar aquelas razões dispunham na altura da eficácia jurídica para o efeito necessária, como foi assinalado nas precedentes informações desta Provedoria de Justiça.
Por outro lado, o facto de o Dec-Lei nº 166/70 haver sido entretanto revogado pelo Dec-Lei nº 445/91 não significa que a plena eficácia jurídica dos planos municipais (aí se incluindo os planos directores municipais, os planos de urbanização e os planos de pormenor), bem como das medidas preventivas e das normas provisórias a que alude o Dec-Lei nº 69/90, de 2 de Março, não continua a depender da verificação de determinados requisitos, designadamente em matéria de publicação (v. artºs 2º, 7º, 8º, 18º, 19º e 20º do referido diploma, com as alterações do Dec-Lei nº 211/92, de 8 de Outubro).
4. Não compete, evidentemente, a este órgão do Estado apreciar e resolver sobre a viabilidade ou inviabilidade da pretensão da interessada relativa à ampliação e reconstrução do prédio em causa; isso caberá à Câmara Municipal de Alcácer do Sal, no exercício das suas competências em matérias de urbanismo e construção.
Considerando, todavia, o exposto no antecedente nº 3, e bem assim as demais observações já expendidas sobre o assunto nas precedentes informações desta Provedoria de Justiça,
RECOMENDO:
Que, de futuro, o exercício das competências dessa Câmara Municipal em matéria de urbanismo e construção se
conforme integralmente com o quadro normativo vigente em tal domínio, tendo especialmente em consideração, no que releva para o caso, as disposições legais concernentes à eficácia jurídica dos instrumentos de planeamento territorial e à fundamentação de facto e de direito das deliberações autárquicas.
Isso, sem que se pretenda imputar à actual Edilidade de Alcácer do Sal a génese da situação que deu origem à reclamação da interessada.
0 PROVEDOR DE JUSTIÇA
JOSÉ MENÉRES PIMENTEL
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Anexo: cópia de uma INFORMAÇÃO
_ INFORMAÇÃO _
1. As informações já elaboradas anteriormente nesta Provedoria de Justiça acerca do problema em causa basearam-se em princípios legais e doutrinários cuja pertinência (então reconhecida pela C.M. de Alcácer do Sal no ofÍcio de fls. 57/60) se mantém integralmente.
E não se alcança em que medida a procedência das razões em que se estribaram aquelas informações possa contender com as “preocupações de desigualdade e de equilíbrio” agora invocadas pela C.M. “relativamente a todos os munícipes que a procuram para satisfação de necessidades urbanísticas”.
Com efeito, e como se disse na altura, não estava (nem está) em discussão o exercício das competências legais do Município em matéria de urbanismo e construção, e tão pouco cabia a esta Provedoria de Justiça pronunciar-se sobre a viabilidade ou inviabilidade da pretensão da interessada respeitante à reconstrução e/ou ampliação do prédio em foco.
Mas, consoante se frisou igualmente, as restrições ao direito de construir e de lotear são apenas aquelas que a Lei prevê, e as Autarquias devem obediência à Constituição, às leis e aos regulamentos emanados das Autarquias de grau superior.
2. Ora, à data do requerimento de 5.3.1991, através do qual a interessada solicitou à C.M. de Alcácer do Sal informação acerca da “viabilidade de ampliação e reconstrução” do prédio em referência, ainda estava em vigor o Dec-Lei nº 166/70, de 15 de Abril, o qual (como anotou aquele órgão Autárquico) não previa expressamente a figura do “pedido de informação prévia” sobre a possibilidade de realizar determinada obra sujeita a licenciamento municipal e respectivos condicionamentos (como veio a ser consagrado no artº 10º do actual Dec-Lei nº 445/91, de 20 de Nov., que reformulou o regime de licenciamento municipal de obras particulares).
Mas também é verdade que o citado Dec.-Lei nº 166/70 não impedia a formulação de pedidos daquela natureza, a qual era, aliás, geralmente admitida pelas CC.MM. e frequentemente praticada pelos interessados na realização de obras sujeitas a licenciamento autárquico, como forma de evitar perda de tempo e desperdício de recursos na elaboração de projectos cuja aprovação viesse a revelar-se manifestamente inviável face aos condicionamentos urbanísticos do local e às normas legais e regulamentares aplicáveis ao assunto (cfr., a propósito, A. Pires de Lima e J. Almeida Correia, “Licenciamento de Obras”, págs. 23/24).
Ao contrário do que sucedia com as resoluções definitivas de deferimento dos pedidos de licenciamento de obras, as meras informações preliminares sobre a viabilidade e os condicionamentos de quaisquer obras sujeitas a licenciamento municipal, ainda quando favoráveis, em princípio, às pretensões dos interessados, não assumiam no contexto do Dec-Lei nº 166/70 a natureza de actos constitutivos de direitos (cfr., a propósito, o artº 13º do actual Dec-Lei nº 445/91 acerca da validade do conteúdo das informações prévias prestadas pelas CC.MM. nos termos do mesmo Diploma).
Todavia, destinando-se elas a elucidar e orientar os requerentes sobre a viabilidade e os condicionamentos das obras cujo eventual pedido de licenciamento pretendessem submeter ulteriormente à apreciação dos competentes Municípios, o conteúdo das mencionadas informações também haveria de tomar em linha de conta, naturalmente, os condicionalismos de facto e de direito que, na altura, se revelassem favoráveis, pudessem vir a condicionar ou se mostrassem susceptíveis de vir a prejudicar o eventual e ulterior pedido de licenciamento das obras visadas, considerando os instrumentos urbanísticos devidamente aprovados para o local, bem como as demais
normas legais e regulamentares aplicáveis ao assunto.
3. É exacto que o artº 15º, nº 1, al. a), do Dec-Lei nº 166/70, citado pela C.M. de Alcácer do Sal, previa o indeferimento de pedidos de licenciamento de obras no caso de inconformidade com plano ou anteplano, geral ou parcial,de urbanização e respectivo regulamento.
E assim facilmente se entendia que os Municípios também se pronunciassem desfavoravelmente sobre meros pedidos preliminares de informação sobre a viabilidade de realização de quaisquer obras que se revelassem desconformes com os mencionados instrumentos urbanísticos.
Mas os planos ou anteplanos, gerais ou parciais, de urbanização a que aludia o invocado preceito legal eram, obviamente, aqueles que reuniam condições de plena validade e eficácia à luz das normas jurídicas então vigentes, pois só eles possuíam adequada força vinculativa (cfr., v.g., o que dispunham os artºs 3º, 7º, 14º e 16º do Dec-Lei nº 560/71, de 17 de Dezembro).
4. Ora, no caso em foco não consta que a zona da Comporta estivesse abrangida por qualquer plano ou anteplano, geral ou parcial, de urbanização devidamente aprovado nos termos das pertinentes disposições legais, antes decorrendo dos autos que para o local existia apenas, ao tempo, um estudo de Plano de Pormenor que não foi ratificado pela S.E. da Administração Local e do Ordenamento do Território, consoante esclareceu a própria C.M. .
E como aquele estudo do Plano de Pormenor da Comporta não dispunha de plena eficácia jurídica, não podia ele servir de fundamento legal ao indeferimento de pedidos de licenciamento de obras a realizar no local, por apelo à injunção do artº 15º, nº 1, al. a), do Dec-Lei nº 166/70.
E, por identidade de razão, também não se vê que o falado preceito legal pudesse servir de esteio adequado à informação desfavorável de quaisquer pedidos prévios respeitantes à viabilidade de realização daquelas mesmas obras.
O exposto não significava, no entanto, que tais informações desfavoráveis não pudessem encontrar outros motivos fundamentados, considerando, designadamente, as diversas razões legais susceptíveis de servirem de esteio justificado ao indeferimento do eventual pedido de licenciamento das obras em vista, face ao disposto nas restantes alíneas do nº 1 do artº 15º do Dec-Lei nº 166/70 e nos demais preceitos legais e regulamentares aplicáveis ao assunto.
Continua a valer aqui, por consequência, tudo quanto se disse nas precedentes informações desta Provedoria de Justiça acerca da questão em apreço.
5. O Dec-Lei nº 166/70 foi revogado, entretanto, pelo Dec-Lei nº 445/91, que reformulou o regime de licenciamento de obras particulares.
Mas, de acordo com o artº 7º, nº 1, al. a), daquele novo Diploma, a interessada poderá solicitar ao Município informação acerca dos instrumentos de planeamento em vigor para a zona onde se localiza o seu prédio, bem como das demais condições gerais a que deverá obedecer a obra que pretende executar.
E, nos termos dos artºs 10º e 11º do citado Dec-Lei nº 445/91, a interessada também poderá requerer à C.M. de Alcácer do Sal informação sobre a possibilidade de realizar a obra em vista. A deliberação da C.M. será constitutiva de direitos, segundo dispõe o artº 12º, nº 3, do mesmo Diploma, e no caso de ser desfavorável deverá indicar, sempre que possível, os termos em que poderá ser revista, “por forma a serem cumpridas as normas estabelecidas, designadamente as constantes do plano de pormenor ou do alvará de loteamento, válido nos termos da lei “(cfr., igualmente, o artº 63º do Dec-Lei nº 445/91, quando, ao referir os fundamentos de indeferimento dos
pedidos de licenciamento de obras, alude no nº 1, al. a), à desconformidade com alvarã de loteamento ou com instrumentos de planeamento territorial, “válidos nos termos da lei”).
6. Pelo exposto, e considerando, por outro lado, os artºs 2º, nº 4, 7º, nº 6, 8º, nº 7, e 18º, nº 5, do Dec-Lei nº69/90, de 2 de Março (com as alterações do Dec-Lei nº 211/92, de 8 de Outubro), continuam a manter actualidade as observações oportunamente expendidas nas precedentes informações desta Provedoria de Justiça a propósito da falta de adequada eficácia jurídica do anterior estudo do Plano de Pormenor da Comporta e dos requisitos de que dependerá a plena eficácia jurídica do Plano de Urbanização daquela zona, o qual a C.M. de Alcácer do Sal referiu no ofício de fls. 57/60, já estar pronto para apreciação da C.C.R. do Alentejo.
Isto o que, merecendo concordãncia superior, se ponderaria à mencionada C.M., sem prejuízo de se transmitir à reclamante o teor do nº 4 do novo ofício de fls. 72/73, daquele órgão Autãrquico, para possível adopção do procedimento legal ali descrito.