Presidente do Conselho Directivo do Centro Nacional de Pensões

Rec. n.º 6/A/00
Proc.:R-1404/98
Data:2000-01-27
Área: A 3

Assunto: SEGURANÇA SOCIAL. PENSÃO DE REFORMA. PENSÃO UNIFICADA.

Sequência: Não Acatada

1. O Senhor …, beneficiário n.º …. dirigiu-me uma exposição na qual reclama do facto de lhe ter sido indeferido o pedido no sentido das pensões que lhe foram atribuídas por esse Centro Nacional de Pensões e pela Caixa Geral de Aposentações serem atribuídas de forma unificada, conforme previsto no Decreto–Lei n.º 159/92, de 31 de Julho.

2. Esse indeferimento fundamentou-se no facto de o beneficiário, no momento em que requereu aqueles pensões, ter optado por não as receber sob a forma unificada.

3. O exponente justifica a opção efectuada no desconhecimento do regime jurídico aplicável à pensão unificada e alega que os serviços de segurança social não lhe prestaram, oportunamente, as informações que o habilitassem a formular validamente aquela opção.

4. A opção efectuada pelo exponente implicou um prejuízo de 27 050$00 por mês, que correspondem à diferença entre o valor das duas pensões que vem a receber e aquele que receberia se essas pensões lhe tivessem sido atribuídas sob a forma unificada.

5. Tendo em consideração esse prejuízo, outra conclusão não pode retirar-se que não seja a de que se a vontade do reclamante se tivesse formado sem qualquer vício que a tivesse perturbado, a respectiva opção não recairia sobre uma solução que, conforme se veio a demonstrar, lhe era objectivamente menos favorável.
Não pode, pois, deixar de admitir-se que a vontade do exponente foi afectada por erro.
Com efeito, as declarações mais não são do que a manifestação da vontade de produção de certos efeitos, pelo que não basta que a declaração tenha sido querida, é necessário que aquela se tenha formado sem qualquer vício que a perturbe, que seja uma vontade livre e esclarecida.

6. A efectiva verificação desse erro constitui-se, pois, como um factor que não pode ser desconhecido na análise da situação em causa, sob pena de essa análise ter de ser considerada insuficiente.
Com efeito, não pode afastar-se liminarmente a possibilidade de a responsabilidade pelo erro não dever ser imputada ao beneficiário ou principalmente ao beneficiário.

7. Nessa medida, importa determinar as circunstâncias em que se terá verificado esse erro.
É certo, porém, que, no caso concreto, não existem elementos que permitam determinar essas circunstâncias e, desse modo, definir a quem deve ser imputada a responsabilidade ou a principal responsabilidade pela verificação do erro.

8. Na verdade, pode ter acontecido que o exponente pudesse ter formado a sua vontade por não ter sido diligente, não se ter informado devidamente, ou por ter apreendido mal os factos ou circunstâncias que lhe foram transmitidas. O erro diz-se, então, simples ou espontâneo (Prof. L. A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, vol. II, pags. 270 e segs.).

9. No entanto, também pode ter acontecido que o reclamante não tenha sido devidamente informado.
Esse facto assumiria, então, importância porque tornaria o erro desculpável e relevante.
Com efeito, dessa forma, encontrando-se a declaração do beneficiário que optou pela não concessão da pensão unificada afectada de vício na formação da vontade, o acto administrativo que, consequentemente, veio deferir a pensão separadamente ficou necessariamente afectado nos seus pressupostos.

10. É neste contexto que se me afigura importante realçar a V.Ex.ª uma situação cujo significado não pode deixar de ser tida em conta nesta análise.
O caso em apreciação não se trata de um caso isolado; pelo contrário, têm vindo a verificar-se situações idênticas com uma frequência cada vez maior, sendo esta reveladora de uma tendência que não pode, nem deve ser ignorada.
Até porque, um fenómeno desse tipo não pode encontrar a sua explicação, apenas e tão só, na conduta dos beneficiários e, nomeadamente, na menor diligência por parte destes.
Na verdade, essa tendência revela, também, que se verifica um significativo défice de informação quanto ao regime da pensão unificada.

11. No entanto, no caso da pensão unificada, o efectivo desenvolvimento de medidas informativas que visassem a habilitação dos beneficiários com os elementos necessários à formulação válida da opção que se torna necessário fazer por força do disposto no art.º 6.º, n.ºs 2, 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 361/98, de 18 de Novembro, ainda se justifica mais porquanto está em causa um direito que resulta, imediatamente, de um dos princípios básicos orientadores do sistema de segurança social, como é o princípio da unidade (art.º 5.º, n.º 2, da Lei de Bases da Segurança Social).

12. Apesar disso, que se saiba, os beneficiários são confrontados com a necessidade de formular aquela opção sem que, sequer no documento “tipo” utilizável para efeitos do requerimento das pensões, se faça qualquer esclarecimento quanto àquele regime e, nomeadamente, que essa opção é irreversível.

13. A responsabilidade por esse défice de informação que se verifica quanto ao regime da pensão unificada haverá que ser imputável à Administração Pública já que, como se sabe, sobre ela impende o dever de informar os beneficiários em matéria de segurança social, conforme decorre do art.º 42.º da Lei de Bases da Segurança Social.

14. É, pois, face a essas circunstâncias que, à luz dos princípios da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos, da proporcionalidade, da justiça e da boa fé, se me afigura como necessário admitir a desculpabilidade do erro do beneficiário.

15. A este propósito, permita-me V.Ex.ª que chame à colação a posição da Caixa Geral de Aposentações que, em caso idêntico que lhe foi apresentado pelos serviços da Provedoria de Justiça, veio a entender estar-se perante um caso de aplicação “…do regime do erro sobre o objecto do negócio jurídico regulado no art.º 251.º do Código Civil, que remete para o art.º 247.º, ou seja a anulabilidade da declaração depende de o destinatário da declaração conhecer ou não dever ignorar a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que incidiu o erro”.

Todavia, reconheceu-se que a Administração não podia nem devia conhecer qual o regime mais favorável ao interessado, competindo apenas a este cuidar de recolher as informações necessárias tendo em vista realizar a melhor opção.

Assim sendo, considerou a Caixa Geral de Aposentações que “…se não podemos falar de vontade viciada no sentido técnico, nos termos dos art.ºs 247.º e 251.º do Código Civil, sobre as declarações, haverá de compreender-se que aí estamos no âmbito dos negócios jurídicos entre particulares, pelo que para a segurança e certeza do tráfico jurídico, há que acautelar a confiança que o declaratário depositou nas declarações do declarante, de modo a igualar as posições das partes”. Mas, no caso concreto que estava em discussão, tratava-se “…de uma relação entre a Administração Pública e o particular, sujeita às regras do direito público, algumas delas vocacionadas para a protecção do interessado porque este está de certa forma mais desprotegido e menos esclarecido, porque não há uma paridade de posições, basta o privilégio de execução prévia da Administração Pública, para as desequilibrar.”

Concluindo a mesma Caixa que, atentas as circunstâncias específicas e pessoais que envolveram a situação concreta – onde se incluiu o facto de o interessado não ter sido devidamente informado sobre a melhor opção a realizar – “…não repugna que, a título excepcional, de acordo com um juízo de mérito, pois que resulta uma situação injusta e um sacrifício que não é justificado para o interessado”, possa ser alterada a situação.

16. Ora, também no caso em apreço, em que, pelas razões acima aduzidas, é de admitir como uma probabilidade séria a de o beneficiário não ter sido devidamente informado, o respeito pelos supracitados princípios impõe à Administração que se não prenda a razões formais e que atenda à verdade material e, que, desse modo, devolva o equilíbrio a uma relação que a falta de informação desvirtuou.

Em face do exposto, RECOMENDO

a V.Ex.ª a alteração do acto de atribuição da pensão ao beneficiário, de modo a que a mesma lhe seja atribuída sob a forma unificada.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL