Presidente do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos
Rec. n.º 11/A/92
Proc.: R-2621/87
Data:24-03-1992
Área: A 3
ASSUNTO: SEGURANÇA SOCIAL – PENA DISCIPLINAR – PENA DE PRISÃO – SUSPENSÃO DE ABONOS.
Sequência: Acatada
O ofício dessa Caixa com a referência de 88.03.11, relativo à situação do senhor …, suscita-me as seguintes considerações.
O art.º 75.º do Estatuto da Aposentação não e, presentemente, aplicável, por impossibilidade de verificação da sua previsão, quer a suspensão de abonos nele referida se configure como pena principal ou acessória, quer como efeito automático ou não duma pena.
De facto, no sistema do anterior Código Penal existiam, como efeito automático de certas penas, as penas acessórias de demissão e de suspensão de direitos políticos (e, com esta, do exercício de funções públicas e de percepção das correspondentes remunerações).
Mas existiam também, como penas autónomas e principais, a de suspensão de emprego público e de direitos políticos (art.ºs 55.º, n.º 6, 56.º, n.º 3, 17.º, n.º 2, 60.º, 61.º).
E era a estas penas, aliás, que essencialmente se reportava o art.º 75.º do Estatuto da Aposentação, conforme decorria da sua conjugação com o subsequente art.º 77.º, n.º 2 (v. Simões de Oliveira, Estatuto da Aposentação anotado, pg. 177).
Ora, no Código Penal actual, desapareceram, totalmente, quer as penas acessórias automáticas (art.º 65.º) quer as penas principais, autónomas, de suspensão de emprego público e de suspensão de direitos políticos.
Mantém-se, é certo, a pena criminal de demissão, que terá de ser aplicada na sentença (art.º 66.º).
Mas o ora queixoso não foi porém alvo de tal pena, na condenação que o atingiu.
É verdade, também, que o art.º 67.º do actual Código Penal dispõe que o réu definitivamente condenado a pena de prisão, que não seja demitido, incorre na suspensão do cargo público que exercesse, durante o cumprimento da pena – e essa acarreta, reflexamente, a dos correspondentes abonos.
Só que este regime não é senão uma necessária consequência da impossibilidade prática que o réu teria, enquanto preso, de exercer as funções correspondentes a tal cargo (v. Código Penal anotado, Maria Gonçalves, pg. 108; e Código Penal de 1982, vol. I, Leal Henriques e Simões Santos, pg. 355).
Ora esta impossibilidade prática não ocorre na situação de aposentado, que passou a ser a do queixoso desde 83.12.28 (a impossibilidade do abono dos vencimentos só ocorreu, para ele, entre a condenação – 83.12.15 – e reaposentação – 83.12.28).
Acresce que o Código Penal actual é mesmo expresso em declarar (art.º 68.º, n.º 2) que a própria demissão não constitui obstáculo à aposentação.
Ora, se assim é, pareceria ilógico que o funcionário demitido (e preso) pudesse desde logo passar à situação de aposentado, com percepção da pensão, nos termos gerais – mas que o aposentado compulsivamente não pudesse receber a pensão enquanto não cessasse o cumprimento da pena de prisão.
É um facto, enfim, que o Estatuto Disciplinar prevê (art.º 15.º) a pena de suspensão de pensão por certo período, para os aposentados que pratiquem certas infracções disciplinares.
Trata-se, porém, de situação diversa da do queixoso: essa suspensão é uma pena (disciplinar) aplicável aos aposentados, que, já nessa situação, violaram deveres funcionais – a que, como aposentado, continuam sujeitos.
No caso presente, a pena disciplinar aplicada ao queixoso, por faltas praticadas enquanto funcionário, foi a de demissão, depois convolada em aposentação.
Se se quisesse fazer-lhe acrescer a suspensão do art.º 15.º do Estatuto Disciplinar, estar-se-ia a punir o mesmo facto com duas penas, sucessivas.
Neste contexto, permito-me Recomendar a essa Caixa que a solução dada ao caso vertente seja revista.
O PROVEDOR DE JUSTIÇA
JOSÉ MENÉRES PIMENTEL