Ministro Adjunto
Processo:R-1586/93
Número: 9/B/96
Data:29.05.1996
Área: A4

Assunto:FUNÇÃO PÚBLICA – CARREIRA MÉDICA – DOCENTE – INGRESSO – CONTRATO ADMINISTRATIVO DE PROVIMENTO – PRINCÍPIO DA IGUALDADE – MEDIDA LEGISLATIVA.

Sequência: Acatada

1. O Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, no uso de uma autorização legislativa concedida pela Lei n.º 114/88, de 30 de Dezembro, tipificou as formas de vinculação de pessoal à Administração Pública, e também outras figuras através das quais é permitida a realização de trabalho, subordinado ou não, sem estabelecimento de um vínculo de natureza pública entre quem realiza o trabalho e as entidades públicas às quais é prestado. O art.º 6.º define como um acto unilateral da Administração visando o preenchimento de um lugar de quadro e o exercício profissionalizado de funções próprias do serviço público que revistam carácter de permanência. O art.º 26.º consagra o princípio geral da obrigatoriedade de concurso para ingresso na função pública e o n.º 1 do art.º 40.º determina que “as medidas que em execução do presente diploma vierem a ser tomadas em matéria de relação jurídica de emprego público não prejudicam a situação que os funcionários e agentes já detêm”. Este diploma não prevê o tratamento desenvolvido noutro diploma legal da matéria da nomeação.

2. Também o contrato administrativo de provimento constitui uma modalidade de constituição de uma relação jurídica de emprego com a Administração Pública. Esta tipificação consta do art.º 8.º do Decreto-Lei n.º 184/89, artigo que prevê o desenvolvimento da disciplina desta modalidade de contrato, a qual veio a ser aprovada pelo Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro. Enquanto da análise conjugada destes dois diplomas decorre que a nomeação é ou será a modalidade-regra ou tendencialmente dominante de vinculação de pessoal à Administração Pública, ao contrato administrativo de provimento é reservado o limitado espaço taxativamente estabelecido pelo art.º 15.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 427/89, sempre em situação de não integração em quadro e de exercício provisório de funções próprias do serviço público.

3. O mesmo Decreto-Lei n.º 427/89 particulariza as diferentes circunstâncias em que há lugar a uma nomeação e atribui-lhes diferentes designações. Temos assim no art.º 6.º a nomeação por tempo indeterminado (que pode revestir as formas de provisória e definitiva) e a nomeação em comissão de serviço ordinária (art.º 7.º) ou extraordinária (art.º 24.º). Temos também que a nomeação definitiva dá ao nomeado a qualidade de funcionário e que as causas de extinção do vínculo por ela gerado estão previstas nos art.ºs 23.º e 24.º. Refira-se ainda que a comissão de serviço é a modalidade da nomeação adoptada no ingresso de um funcionário em carreira diferente, quer no regime geral do período probatório ( art.º 7.º, n.º 1, c), quer no regime especial de estágio ( art.º 24.º, n.º 1). E considero ainda dever recordar que o pessoal que ingresse na Administração Pública vinculando-se a um serviço em regime de instalação, celebra com este um contrato administrativo de provimento (art.º 15, n.º 2 a)); mas se já tiver a qualidade de funcionário quando entra ao serviço de um departamento que se encontra naquele mesmo regime, é preservado o seu vinculo anterior e o desempenho de funções no novo posto realiza-se em comissão extraordinária de serviço (art.º 24.º, n.º 2).

4. Apenas em relação aos funcionários que pretendam ingressar nas carreiras docente, de investigação ou nos internatos médicos não está expressamente prevista na lei, através de um provimento em comissão de serviço ordinária ou extraordinária, a salvaguarda do vinculo anterior que o n.º 1 do art.º 40.º do Decreto-Lei n.º 184/89 garantiu. A interpretação veiculada pela Direcção-Geral da Administração Pública vai no sentido de que o ingresso naquelas carreiras só pode fazer-se, nos termos dos seus estatutos, em contrato administrativo de provimento. Assim, um funcionário de uma qualquer carreira que, por exemplo, na qualidade de trabalhador-estudante, adquiriu habilitações literárias ou profissionais que lhe permitem ingressar nas carreiras citadas, é convidado a provar que solicitou e obteve exoneração do lugar de origem antes de poder celebrar o contrato administrativo de provimento , nos termos do citado art.º 15.º, n.º 2, b). Alega aquela Direcção-Geral que o direito a uma nomeação em lugar do quadro naquelas carreiras só se readquire após o decurso de um longo período, de duração variável em função de cada uma daquelas carreiras, e que não seria razoável manter o lugar de origem em aberto e sem possibilidade de ser provido efectivamente durante esse período a fim de assegurar um eventual regresso do seu (anterior) titular.

5. Como parece decorrer da leitura do que atrás se descreve, para além de negar as garantias dadas num diploma legal de enquadramento, é claramente discriminatória a solução legal encontrada para o período que, de algum modo corresponde a um estágio, nas três carreiras referidas. Tal disparidade de tratamentos viola os princípios constitucionais da igualdade e da justiça. Por outro lado, as razões invocadas pela Direcção-Geral da Administração Pública para sustentar tal solução não são insuperáveis. Basta analisar o regime criado para os titulares de lugares de quadro que são investidos em cargos dirigentes, em regime de comissão de serviço ( art.º 7.º, n.º 1, a), e que – mesmo antes de cessarem essa comissão de serviço – podem solicitar a criação, no quadro do serviço de origem, de um lugar em categoria superior à que detinham, com libertação da vaga que tinham ocupado, e com a certeza de que o lugar criado só por eles poderá vir a ser preenchido, extinguindo-se com a sua eventual vacatura. Esta previsão, inicialmente esboçada pelo Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, veio a ser aperfeiçoada com as alterações que naquele foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro.

6. Pelo exposto,RECOMENDO:

que seja aprovada uma medida legislativa que garanta aos funcionários que concorrerem e forem admitidos aos internatos médicos e ao ingresso nas carreiras docente e de investigação a salvaguarda de um lugar no quadro do serviço de origem até que, nos termos da legislação em vigor, venham a ser nomeados, a título definitivo, em novo lugar de quadro numa das carreiras citadas.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel