Ministro Adjunto do Primeiro Ministro
Número: 5/B/97
Processo: 1480/93
Data: 26.02.1997
Àrea: A4

Assunto: FUNÇÃO PÚBLICA – PESSOAL CIVIL DA FORÇA AÉREA – PESSOAL EVENTUAL – INTEGRAÇÃO NO QUADRO – CONTAGEM DO TEMPO DE SERVIÇO

Sequência: Não Acatada

No âmbito de um processo instaurado neste Órgão de Estado, foi suscitada na queixa que lhe serviu de base, a seguinte questão:

a) Uma auxiliar de serviços do quadro geral do pessoal civil da Força Aérea foi admitida, em … de 1977, como funcionária eventual, a tempo inteiro;

b) Em … de 1980 entrou para o Quadro dos Fundos Privativos da Unidade e em … de 1984 foi integrada no Quadro Geral de Pessoal Civil da Força Aérea;

c) Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 353-A/89 de 16 de Outubro foi integrada no Novo Sistema Retributivo no Escalão 3, ao qual corresponde o índice 130, em … de 1989, com base no vencimento que tinha naquela data. (art.º. 30º do citado diploma);

d) Em … de 1991 ascendeu ao Escalão 4, índice 140, ao abrigo da alínea a) do n.º.2 do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 204/91, de 7 de Junho, e só em 1 de Janeiro de 1995 pôde progredir ao 5º escalão, de harmonia com o disposto no artigo 19º do mencionado Decreto-Lei n.º 353-A/89 de 16 de Outubro;

e) No entanto, outros trabalhadores civis da Força Aérea que, prestando serviço desde a mesma data da queixosa, e nalguns casos, com início em data posterior, através de formas de vinculação precária, não regulares (trabalhadoras eventuais, a tempo inteiro), vieram a ser abrangidos pelo regime dos art.ºs 37º-38º-39º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro. Celebraram com a Administração contrato administrativo de provimento, vindo mais tarde a ser providas em lugares do quadro do pessoal civil da Força Aérea;

f) Às mencionadas trabalhadoras, foi-lhes contado todo o tempo de serviço prestado em situação irregular, como se prestado no quadro, pela via excepcional de regularização prevista no artigo 38º n.º 9 do citado Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, com a consequente repercussão escalonar e remuneratória, pois se acham integradas no Escalão 5, índice 150, desde 1 de Janeiro de 1991;

2. A situação atrás descrita está longe de constituir caso isolado, antes reflecte, claramente, uma generalizada diversidade de tratamento jurídico, porventura não querida pelo legislador do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, baseada na diversidade das formas de vinculação para com a Administração: dum lado, situações jurídico-profissionais regulares e adequadas à lei; do outro, formas de vinculação precária, de raiz irregular, que se institucionalizaram como verdadeiras relações de trabalho subordinado cfr. considerações preambulares do citado Diploma);

3. Diversidade de tratamento jurídico que a nova redacção conferida ao artigo 38º do mencionado diploma pelo Decreto-Lei n.º. 407/91, de 17 de Outubro, veio ainda acentuar, ao determinar no n.º 10, aditado à primitiva versão do preceito, a aplicação do mesmo regime ao pessoal fora do quadro, também em situações irregulares, que anteriormente fora integrado nos termos do disposto no artigo 16º do Decreto-Lei n.º. 100-A/87 de Março.

4. E, deste modo, foi aplicado o mesmo regime excepcional de contagem de tempo de serviço a todo o pessoal em situação irregular, objecto de dois processos extraordinários de regularização.

5. E, como vem sendo anunciado pelo Governo novo processo de regularização, certamente na peugada do Decreto-Lei n.º 81-A/96, de 21 de Julho, receio que idêntico regime venha a ser aplicado, visando pôr termo à utilização pela Administração de formas de vinculação precária para satisfação das necessidades permanentes de serviço;

6. Diversamente, porém, ao pessoal que durante o mesmo período exerceu funções além do quadro, em situação regular e precária, mas que veio a ser integrado nos quadros, em perfeita adequação à lei, (mediante concurso externo de ingresso), o tempo de serviço prestado antes do ingresso não é contado.

7. Da discrepância de regimes aplicáveis resulta manifesto benefício para o pessoal que se manteve em situação irregular até à entrada em vigor dos Dec-Leis 100-A/87 e 427/89, logo uma situação de injustiça relativa, que transparece, com mais clareza, se tivermos em conta que nas situações irregulares, sanadas ao abrigo do disposto nos artigos 37º, 38º e 39º do Decreto-Lei n.º 427/89 de 7 de Dezembro, o tempo de serviço prestado releva para todos os efeitos legais, designadamente antiguidade na categoria, na carreira e na função pública.

8. Segundo entendo, mostra-se mais conforme à tradição legal e aos princípios orientadores das carreiras da função pública (Decreto-Lei n.º 248/85 de 15 de Julho), que o tempo de serviço prestado em situação irregular em eventuais futuros processos regularizadores, releve apenas na antiguidade na função pública, e não na categoria ou na carreira, desde que se não verifique solução de continuidade entre a situação irregular e o ingresso mediante concurso.

9. Com efeito, de acordo com a legislação em vigor, para efeitos de progressão na categoria releva, salvo disposição legal em contrário, o tempo de serviço prestado após o ingresso na carreira (cfr. artigo 12º, do citado Decreto-Lei n.º 427/89 de 7 de Dezembro);

10. E, só excepcionalmente, pode ser considerado para os aludidos efeitos, o tempo de serviço prestado em situações diferentes, sendo para tal necessário norma legal que permita essa contagem, que se desaconselha no caso, a fim de evitar maiores desigualdades, sempre geradoras de injustiças relativas, e o prejuízo, também não negligenciável, das regras e exigências próprias das carreiras da função pública.

11. Devo ainda sublinhar, a propósito, que a Administração Pública -, quer na sua actividade administrativa, quer legislativa -, deve sempre pautar-se pelo respeito para com os direitos e interesses legalmente protegidos dos administrados, e bem assim observar, no exercício das suas funções, os princípios da igualdade, da imparcialidade, proporcionalidade e justiça (art.º 266º da Constituição).

12. E, nesta perspectiva, tais princípios constitucionais e ainda o da tutela da confiança, postulam a igualdade de tratamento dos interesses dos cidadãos, através de um critério uniforme de prossecução do interesse público, e bem assim, a confiança da comunidade, na tutela jurídica, na ordem jurídica positiva. (cfr. neste sentido Prof. Gomes Canotilho, e Dr. Vital Moreira, “Constituição Anotada” II vol. págs. 419 e 420).

13. A aplicação dos apontados princípios constitucionais, ao caso em apreço, deixa claramente implicada a necessidade de reparação da injustiça relativa verificada, mediante a emanação de providência normativa adequada, reportada ao início da vigência do Decreto-Lei n.º 427/89 de 7 de Dezembro, ao abrigo do disposto no artigo 128º (n.º 2, alínea a)) do Código de Procedimento Administrativo, dada a verificação dos pressupostos aí tidos em conta, para a aplicação retroactiva.

14. Em face do antecedentemente exposto,

RECOMENDO

A Vossa Excelência:

a) A emanação de providência normativa, dispondo no sentido de ser contado todo o tempo de serviço prestado na Administração Pública, aos trabalhadores que, embora não abrangidos pelo regime do Decreto-Lei n.º 427/89 de 7 de Dezembro, tenham prestado serviço antes do início da vigência deste diploma em situação regular e adequada à lei então aplicável.

b) Que à medida legislativa recomendada seja atribuída eficácia retroactiva, reportada à data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 427/89 de 7 de Dezembro, já que esta solução apenas beneficia os destinatários da norma proposta – alínea a) precedente, sem prejuízo para terceiros.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL