Presidente do Conselho de Administração da E.P.U.L.
Número: 5/A/97
Processo: 12/96
Data: 13.01.1997
Àrea: A1

Assunto: URBANISMO – EDIFICAÇÕES URBANAS – SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIOS – EPUL

Sequência: Acatada

I – Exposição de Motivos

1. Por uma das moradoras do prédio correspondente ao n.º 5, da Rua …, na cidade de Lisboa, foi apresentada queixa a este Órgão do Estado no que se refere à impossibilidade de acesso à fachada por parte de viaturas de combate a incêndios.

2. Para efeitos da instrução do processo aberto com base em tal queixa, e no cumprimento do dever de audição prévia das entidades visadas nas queixas que me são apresentadas (art. 34º, da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril), foram solicitados esclarecimentos ao Regimento de Sapadores Bombeiros e à E.P.U.L, Empresa Pública de Urbanização de Lisboa.

3. Informou o Ex.mo. Comandante do Regimento de Sapadores Bombeiros que, em inspecção efectuada ao local, na sequência de reclamação apresentada àquela entidade, havia sido verificado que a fachada do imóvel dista cerca de 18 metros do arruamento, tendo sido construídas junto ao passeio, quando dos arranjos exteriores da edificação, floreiras e rampas para acesso dos carros de deficientes, o que em caso de sinistro não permite a aproximação de viaturas de socorro (auto-escadas).

4. Tendo sido esta informação transmitida à Empresa Pública de Urbanização de Lisboa através do ofício n.º … /G.E.T., de … 1994, nele se inculcava, já em tal data, que fosse estudada a possibilidade de aproximação das citadas viaturas à fachada, de acordo com o preceituado no art. 46º, do Decreto-Lei n.º 64/90, de 21 de Fevereiro.

5. Questionado sobre o procedimento adoptado na sequência do teor do ofício supra citado, nada esclareceu V.ª Ex.ª, pelo que cumpre concluir que não foi estudada qualquer solução para o problema.

6. Informou ainda V.ª Ex.ª que o projecto da obra licenciada em 1987, contemplava a solução arquitectónica que veio a ser objecto da reclamação apresentada na Provedoria de Justiça.

7. À data do licenciamento da obra reclamada encontravam-se em vigor as disposições contidas no Título V, Capítulo III, do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 32.382, de 7 de Agosto de 1951, relativas à segurança das edificações contra incêndios.

8. Entre estas, impunha o disposto no art. 142º, § único, que todas as edificações sem acesso directo pela via pública ou dela afastadas fossem servidas por arruamentos de largura não inferior a três metros, destinados a viaturas.

9. Por seu turno, no art. 143º daquele diploma estabelecia-se a necessidade de todas as saídas das edificações se conservarem permanentemente desimpedidas em toda a sua largura e extensão, sendo interdito qualquer aproveitamento ou pejamento, mesmo temporário, das saídas, susceptíveis de afectar a segurança permanente da edificação ou dificultar a evacuação e a aproximação de viaturas de socorro em caso de incêndio.

10. Assim, não respeitando o projecto da obra as prescrições regulamentares citadas, deveria a Câmara Municipal de Lisboa ter indeferido o pedido de licenciamento com fundamento no disposto no art. 15º, n.º 1, alínea d), do Decreto-Lei n.º 166/70, de 15 de Abril, disposição que estabelecia como fundamento de indeferimento dos pedidos de licenciamento ou de aprovação de projectos o desrespeito por quaisquer normas legais ou regulamentares relativas à construção.

11. Não o fez, e não obstante o vício de violação de lei imputável ao acto de licenciamento, encontra-se este sanado pelo decurso do prazo para efeitos da interposição de recurso contencioso de anulação (art. 28º, do Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de Julho).

12. Sendo o acto de licenciamento inatacável no plano da legalidade, certo é que o desrespeito das disposições contidas nos arts. 142º, § único e 143º, do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, conduziu à criação de uma situação de perigo para todos os moradores do edifício e de prédios contíguos.

13. Com efeito, a impossibilidade de acesso das viaturas de socorro, designadamente, de auto-escadas, dificulta, se não mesmo, impede os trabalhos de combate ao fogo e salvamento dos moradores em caso de sinistro.

14. O princípio da prossecução do interesse público impõe que seja encontrada uma solução que permita a aproximação das viaturas à fachada do edifício. Esta medida, não deixará, também, de corresponder aos legítimos interesses de todos quantos ali habitam, pelo que não é desproporcional aos benefícios que dela resultam a necessária retirada das floreiras existentes, no todo ou em parte, dos cerca de 18 metros que distam da fachada ao arruamento.

15. Solução diferente impõe, contudo, a existência das rampas para acesso dos carros de deficientes. A solução técnica a ponderar deverá contemplar a possibilidade de acesso destes equipamentos, o que, de resto, vai ao encontro das actuais preocupações de política legislativa em matéria de supressão das barreiras físicas à mobilidade das pessoas com deficiência.

16. A solução técnica a implantar deverá permitir satisfazer as condições previstas no art. 46º, do Regulamento de Segurança Contra Incêndio em Edifícios de Habitação, constante do Decreto-Lei n.º 64/90, de 21 de Fevereiro, no que respeita aos requisitos técnicos dos edifícios em matéria de condições de acesso e intervenção dos bombeiros.

17. E de tal forma se revela importante o cumprimento dos requisitos de segurança no que concerne à prevenção dos riscos de incêndio em edifícios de habitação que o art. 10º, do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38.382, de 7 de Agosto de 1951, permite às câmaras Municipais, determinar, em qualquer altura, precedendo vistoria, a execução das obras necessárias para corrigir más condições contra o risco de incêndio.

18. Não obstante a possibilidade de poder vir a Câmara Municipal de Lisboa a ordenar a execução das obras necessárias à satisfação das citadas exigências legais, mostra-se justo imputar a necessidade de ser corrigida a actual situação de irregularidade à Empresa Pública de Urbanização de Lisboa.

19. Atenta a natureza pública da empresa a cujo Conselho de Administração V.ª Ex.ª preside, bem como o facto de estar a actividade técnica e de gestão privada da Administração Pública sujeita aos princípios gerais da actividade administrativa (arts. 3º a 12º do Código do Procedimento Administrativo) é essa a solução que entendo resultar da ponderação dos interesses em conflito.

20. Com efeito, não me parece conforme ao princípio da justiça administrativa exigir aos particulares adquirentes das fracções que integram o edifício correspondente ao n.º 5, da … , que suportem o custo da execução de obras que se mostram necessárias para corrigir uma situação de irregularidade a que a actuação dessa empresa deu causa.

Nem tão pouco pode suportar entendimento contrário, a circunstância de o acto onde radica a licença de construção ter visto sanada pelo decurso do tempo a invalidade que a violação do citado preceito do RGEU importava.

Revela-se, neste ponto, o alcance de quanto se dispõe no art. 4º do RGEU, apontando que o licenciamento das construções não consome a garantia de conformidade com as regras que lhe são aplicadas.

21. Dispõe-se neste preceito que a concessão de licença de construção e o exercício da fiscalização municipal no decurso da obra não isentam o dono da obra da responsabilidade pela condução dos trabalhos em estrita concordância com as prescrições regulamentares e com a observância de outros preceitos gerais ou especiais a que a edificação pela sua localização ou natureza haja de subordinar-se.

22. O cumprimento das pertinentes disposições legais e regulamentares destinadas a salvaguardar o interesse público urbanístico na salubridade e segurança das construções urbanas não é nem pode ser anulado pelas relações jurídico-privadas que venham a estabelecer-se com os adquirentes das fracções.

23. Do teor da disposição citada resulta que a inobservância das prescrições técnico-funcionais relativas à construção constituirá o dono da obra responsável, nos termos do disposto no art. 483º do Código Civil, pelos danos que se apresentem como efeito de tal infracção, sendo certo que a prescrição extintiva da obrigação de indemnização só se consuma quando decorrem cinco anos desde o efectivo conhecimento do dano (art. 1219º do Código Civil).

Em face de quanto fica exposto,

RECOMENDO

O estudo de uma solução que, satisfazendo as condições para acesso dos bombeiros fixadas no art. 46º do Regulamento de Segurança Contra Incêndios em Edifícios de Habitação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64/90, de 21 de Fevereiro, venha a permitir a aproximação das viaturas de socorro à fachada do edifício correspondente ao n.º 5, da Rua…, em Lisboa, devendo as obras necessárias para tal fim ser custeadas pela Empresa Pública de Urbanização de Lisboa.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL