Presidente da Câmara Municipal de Guimarães
Número:36/A/97
Processo:R-1542/95
Data:5.05.1997
Área: A2

Assunto:CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS – TAXAS MUNICIPAIS – COBRANÇAS – REGULAMENTO E TABELA DE TAXAS MUNICIPAIS – ARTIGO 7 – REVOGAÇÃO.

Sequência:Acatada

I-Dos Factos

Por deliberação da Câmara Municipal de Guimarães de 2 de Dezembro de 1994, sancionada pela Assembleia Municipal em sessão do dia 19 do mesmo mês, foi aprovada a alteração ao Regulamento e Tabela de Taxas Municipais. Estabelece o art. 7º daquele Regulamento: “Em todas as cobranças previstas na tabela anexa a este regulamento proceder-se-á, no total, ao arredondamento por excesso para a dezena de escudos”. É contra este procedimento que se insurge o reclamante no processo acima referenciado. Instado V.ª Ex.ª a apresentar os fundamentos que justificariam a deliberação tomada, invocou a maior facilidade nos serviços de tesouraria.

II-Dos Fundamentos

1. Em primeira linha, não posso, desde já, deixar de chamar atenção de V.ª Ex.ª para a expressão utilizada no último período do ofício de esclarecimentos enviado à Provedoria de Justiça (n.º …), que entendo constituir uma falta de consideração e respeito para com o munícipe, a todos os títulos reprovável. Estando a Administração Pública, nos termos do disposto, nomeadamente, nos arts. 4º, 7º e 8º do Código do Procedimento Administrativo, obrigada a pautar a sua actuação segundo os ditames da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos, da colaboração da Administração com os particulares e da participação destes nas decisões que lhe disserem respeito, terá de aceitar que sejam formuladas criticas à sua actuação, analisando-as de forma isenta e procurando delas retirar ensinamentos que contribuam para uma cada vez maior defesa e prossecução dos interesses daqueles que ela visa servir, e que dão causa à sua existência. Tal actuação pressupõe um especial dever de relacionamento cordial com aqueles que se lhe dirigem, devendo, portanto, banir-se a utilização de expressões como aquela.

2. Quanto à norma em apreço, entendo que a mesma é ilegal.
De facto, não se vislumbram motivos, nem sequer de “facilidade dos serviços de tesouraria”, que justifiquem o seu teor. Desde logo, nos casos em que o munícipe apresente para pagamento a quantia exacta que lhe foi solicitada. Mas mesmo quando tal não aconteça, não me parece que a simplificação dos procedimentos administrativos passe pela necessidade do arredondamento para a dezena de escudos superior, conhecendo a profusão de moedas de 1$00, 2$50, e 5$00 que existem no mercado, para além dos meios de pagamento electrónico facilmente ao dispor de qualquer sujeito económico (e.g. porta moedas multibanco/PMB). No entanto, já não me parece censurável a previsão do arredondamento para a unidade de escudos mais próxima ou imediatamente superior, atenta a inexistência de moedas de tostão, à semelhança, aliás, do previsto em alguns diplomas legais, dos quais se salientam o Decreto-Lei n.º 363/80, de 9 de Setembro, o Decreto-Lei n.º 448/82, de 13 de Novembro, e o Despacho Normativo n.º 33/86, in D.R. de 8 de Maio. Nesta conformidade, e na medida em que lhe falta fundamento legítimo, entendo que o procedimento em apreço redunda num acréscimo de receitas para o município por via do enriquecimento sem causa, como se alcança da análise do disposto no art. 473º do Código Civil. Importa, desde já, referir que o instituto do enriquecimento sem causa embora com assento legal no Código Civil é um princípio geral de direito, aplicável, também, no Direito Administrativo (neste sentido AFONSO R. QUEIRÓ, Lições de Direito Administrativo, Vol. I, Coimbra, 1976, edição do autor, pags. 187 e 188)). Na esteira do defendido por Pires de Lima e Antunes Varela (in anotação ao art. 473º do Código Civil, 4ª Ed., Coimbra Ed.), também entendo que a obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa (ou locupletamento à custa alheia) pressupõe a verificação cumulativa de três requisitos:

– por um lado, a obtenção de uma vantagem patrimonial;
– por outro lado, que o enriquecimento contra o qual se reage, careça de causa justificativa (e.g. porque nunca a tenha tido, como é o caso da situação “sub judice”); a este propósito, vide ainda Ac. do STJ de 14 de Janeiro de 1972 (in BMJ, n.º 213, pag. 214 e seg.), no qual se defende que a falta de causa justificativa se traduz na inexistência de uma relação ou de um facto que, à luz dos princípios aceites no sistema, legitime o enriquecimento;
– por último, que haja uma correlação imediata entre a vantagem patrimonial alcançada por um dos sujeitos e o sacrifício económico correspondente suportado pelo outro.

3. Assim sendo, a norma constante do art. 7º do Regulamento e Tabela de Taxas Municipais em apreço é ilegal, porque redundando num enriquecimento sem causa a favor do município prossegue fins proibidos por lei, violando o disposto no n.º 1 do art. 3º do Código do Procedimento Administrativo.

Assim sendo,RECOMENDO:

Que seja revogada a norma constante do art. 7º do Regulamento e Tabela de Taxas Municipais, porquanto, dando a mesma origem a um enriquecimento sem causa, consubstancia uma prática ilegal.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel