RECOMENDAÇÃO N.º 4/A/08
[artigo 20.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril]
Entidade visada: Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz
Proc.º: R-5243/06
Data: 21-04-2008
Área: A1 (Mad)
Assunto: Direito ambiental: incomodidade sonora provocada por estabelecimento de restauração e bebidas.
I – Exposição de Motivos
1. Foi solicitada a intervenção da Provedoria de Justiça junto da Câmara Municipal de Santa Cruz, em virtude da alegada ausência de adopção de providências destinadas a conter o ruído imputado à exploração do estabelecimento comercial “XX”, sito em A, da qual se dizia resultar incomodidade para os moradores vizinhos, em especial, durante o período nocturno, devido ao ruído da música ambiente e ao funcionamento de esplanada exterior.
2. Aduziam os impetrantes as lesões provocadas pelo funcionamento do estabelecimento em apreço, não licenciado, para a tranquilidade pública.
3. Por parte do município de Santa Cruz foi esclarecido que se encontrava pendente processo de licenciamento registado sob o n.º 882/05, promovido pela Sociedade Metropolitana de Desenvolvimento, S.A.
4. Referia ainda a edilidade, em ofício datado de 17 de Novembro de 2006, que “Caso não sejam sanados os vícios formais inerentes ao respectivo processo serão adaptadas as medidas tendentes à cessação da utilização das instalações em apreço, conforme disposto no Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro…”.
5. Instada a edilidade a esclarecer sobre os mecanismos de reintegração da legalidade ponderados para o caso em apreço, nos termos do preconizado pelo então em vigor Decreto-Lei n.º 292/2000, de 14 de Novembro, com as alterações que se lhe seguiram, sobreveio a informação (ofício de 19 de Dezembro de 2006) de que teria sido “…deliberado fixar o seguinte horário de funcionamento do estabelecimento comercial XX: Domingo a Quinta, até às 22H00; Sexta, Sábado e vésperas de Feriado até às 24H00. Impondo igualmente a proibição do funcionamento de karaoke e música na esplanada.“.
6. Por informação constante de ofício datado de 4 de Abril de 2007, informava a Câmara Municipal de Santa Cruz que o processo de licenciamento relativo ao estabelecimento em apreço ainda decorria, tendo sido “solicitada a licença de utilização pelo requerimento n.º 1662 de 13.03.2007, a qual foi negada em virtude da requerente não ter dado cumprimento ao ofício da Secretaria Regional da Protecção Civil“.
7. No âmbito da formulação de ulteriores reclamações por parte dos impetrantes, aduzindo a reiteração da situação de incomodidade sonora no local em epígrafe, foi novamente questionada a Câmara Municipal de Santa Cruz (ofício de 18 de Abril de 2007), no sentido de apurar da realização de diligências inspectivas ao estabelecimento comercial, tendentes a aferir da conformidade dos índices sonoros provocados pela laboração normal daquele mesmo estabelecimento, com os níveis permitidos pelo Regulamento Geral do Ruído.
8. Questionava-se ainda a eventual organização de processos de natureza contra-ordenacional com base no incumprimento dos níveis acústicos preconizados pelo legislador, neste domínio.
9. Esclareceu o município (ofício de 4 de Junho de 2007), na pessoa do Senhor Vereador com o Pelouro das Obras Particulares, que a Câmara Municipal não dispunha dos meios técnicos para realização de ensaios acústicos desta natureza, razão pela qual seria solicitada a colaboração da Direcção Regional do Ambiente para efectivação da diligência em apreço.
10. Subsequentemente, veio a edilidade prestar a informação (ofício de 26 de Setembro de 2007) de que, muito embora, fosse facultado o equipamento técnico adequado para realização dos ensaios acústicos, por parte daquela Direcção Regional, não dispunha a autarquia “de um técnico com formação para utilização do equipamento necessário para realização das medições“, pelo que havia sido determinado recurso aos serviços de entidade externa devidamente credenciada para realização de medições acústicas e avaliação de impacte sonoro da actividade reclamada.
11. Não obstante o acompanhamento de todo o circunstacialismo factual respeitante a esta matéria, e a efectivação de contactos informais conduzidos pelo meu Assessor na Extensão da Provedoria de Justiça da Região Autónoma da Madeira, não chegaram a ser conhecidos quaisquer resultados inerentes a uma eventual medição acústica no terreno.
12. De resto, e por ofício datado de 5 de Março de 2008, informava V. Exa., Senhor Presidente, que “Não foi realizada fiscalização ao local em epígrafe para apuramento dos índices sonoros provocados pela laboração do estabelecimento, como não foi feito em nenhum outro local com estabelecimentos semelhantes. Nem se vê razão para que o estabelecimento em epígrafe tenha tratamento especial, pela simples razão de que se trata de uma actividade normal, não especialmente ruidosa ou a merecer licença especial de ruído, que não foi solicitada nem emitida.“.
13. Por parte da Câmara Municipal, foi esclarecido mostrar-se a actividade compatível com a área habitacional, obedecendo o processo de licenciamento à tramitação definida nos diplomas legais aplicáveis.
14. Contudo, e no âmbito de diversos contactos e reuniões mantidas com o executivo camarário, apurou-se que a requerente não apresentara qualquer projecto de insonorização do local destinado ao estabelecimento, em dissonância de resto, com parecer preconizado pela Unidade Operativa de Saúde Pública de Santa Cruz, de 30 de Janeiro de 2007, aí se estabelecendo muito claramente que “A entidade exploradora do estabelecimento deverá adoptar todas as medidas necessárias para minimizar ou eliminar qualquer ruído perturbador resultante do equipamento e das actividades desenvolvidas no estabelecimento, para que este não perturbe ou de qualquer modo afecte a comodidade e tranquilidade de vida das habitações vizinhas“.
15. Não foram igualmente conhecidas, por parte dessa autarquia, quaisquer acções de fiscalização para determinação do cumprimento dos requisitos legalmente fixados ao exercício de actividades ruidosas no âmbito do processo de licenciamento da utilização.
16. Paralelamente, e ainda e no âmbito de reunião mantida com o executivo camarário, foi confirmada a prorrogação do horário de funcionamento do estabelecimento comercial reclamado, o qual passou a vigorar, a partir de Julho de 2007, “…até à uma hora da madrugada, de segundas às quintas-feiras, e até às duas horas, às Sextas, Sábados, Domingos e feriados, por períodos de três meses, e mediante condicionamento de não realização de actividades de karaoke na esplanada exterior, ou actividades susceptíveis de provocar ruído elevado” (1).
17. Por fim, e inquirida a edilidade quanto à ponderação de medidas destinadas a conter a incomodidade sonora existente, nomeadamente, através da redução de horário de funcionamento, esclareceu V. Exa. que “Não se entende a sugestão [formulada], uma vez que, em reunião pública do executivo camarário, de 25 de Julho de 2007, realizada na cidade do Caniço, várias dezenas de participantes expressamente solicitaram a adopção do horário aprovado por deliberação unânime. O horário aprovado está dentro do estabelecido por lei, para estabelecimentos do género. Em que lei habilitante nos podemos fundamentar para alterar o período de funcionamento? Que provas de incomodidade existem? Em reunião que o Presidente da Câmara teve com a Administração do Condomínio foi referenciado que na última reunião desse condomínio tinha havido deliberação sobre o ruído do bar. Foi solicitada cópia da acta, como forma de motivar uma reapreciação do caso. O que nos foi remetido foi apenas uma solicitação para fazer cumprir a lei do ruído. Isso é o que fazemos“.
II – Apreciação
Apreciado o teor dos esclarecimentos prestados e cumprido, assim, o dever de prévia audição da entidade visada, nos termos do disposto pelo art. 34º da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril (Estatuto do Provedor de Justiça), pondero o seguinte:
1. Compete às câmaras municipais o licenciamento da instalação de estabelecimentos de restauração e de bebidas e da respectiva exploração ao abrigo do estipulado pelo Decreto-Lei n.º 234/2007, de 19 de Junho, que veio introduzir algumas alterações ao respectivo regime jurídico, até então regulamentado pelo Decreto Lei n.º 168/97, de 4 de Julho, com as alterações posteriores.
2. Não obstante o pedido de licenciamento da utilização reclamada ter sido apresentado na vigência do anterior diploma, o art. 23º do Decreto-Lei n.º 234/2007, de 19 de Junho, estabelece a aplicação do novo regime aos processos de licenciamento de estabelecimentos de restauração ou de bebidas pendentes à data de entrada em vigor do enquadramento jurídico consubstanciado no presente Decreto-lei.
3. Enquanto entidades licenciadoras, incumbe, actualmente, às câmaras municipais superintender pela “instalação” ou “modificação” dos estabelecimentos comerciais em apreço, mantendo a respectiva coordenação técnica sobre os estabelecimentos de restauração e de bebidas, sem embargo da intervenção de entidades exteriores ao município nesta matéria.
4. Cabe, pois, aos municípios, verificar o cumprimento da generalidade dos requisitos técnicos idóneos ao uso projectado nesses estabelecimentos, sem o que não poderão deferir o licenciamento da sua utilização, devendo apreciar, igualmente, reclamações formuladas pelos moradores que se oponham à abertura ou funcionamento de estabelecimentos com fundamento na ausência de requisitos idóneos à respectiva laboração.
5. Ora na vigência do Decreto-Lei n.º 292/2000, de 14 de Novembro, e tal como o faz agora nos termos do Decreto-Lei n.º 9/2007, de 17 de Janeiro, o legislador atribuía poderes de fiscalização do cumprimento do regime fixado no Regulamento Geral do Ruído às entidades com superintendência técnica no âmbito das respectivas atribuições, poderes esses que compreendem a realização de vistorias e ensaios considerados pertinentes pela entidade fiscalizadora.
6. Em face do exposto, não suscitará dúvidas fundadas a aplicação de mecanismos de controlo preventivo instaurados pelo Regulamento Geral do Ruído então em vigor, através do ónus de apresentação de elementos relativos à conformidade com as exigências regulamentares sobre poluição sonora, no âmbito dos procedimentos de licenciamento de obras de construção civil e de utilização (cfr. o art.º 5, n.ºs 3, 4 e 10 do anexo aprovado pelo Decreto-Lei n.º 292/2000, de 24 de Novembro).
7. Ainda no âmbito do Decreto-Lei n.º 292/2000, de 24 de Novembro, então em vigor, cominava o legislador com a nulidade os actos de licenciamento de actividades ruidosas praticados na vigência do regime em apreço, quando não precedidos da certificação do cumprimento do enquadramento jurídico sobre poluição sonora (cfr. art. 5º, n.º 12 do mencionado diploma).
8. Com a entrada em vigor do novo Regulamento sobre o Ruído (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 9/2007, de 17 de Janeiro), o legislador continuou a sujeitar o cumprimento dos valores limite fixados no respectivo articulado, no âmbito de procedimento de avaliação de impacte ambiental, caso exista, ou em conformidade com procedimentos previstos no Regime jurídico de Urbanização e Edificação (Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, com as alterações que lhe sucederam), e nos termos do preconizado pela Portaria n.º 1110/01, de 19 de Setembro.
9. Nos termos do n.º 5 do artigo 12º daquele diploma, “A utilização ou alteração da utilização de edifícios e suas fracções está sujeita à verificação do cumprimento do projecto acústico a efectuar pela câmara municipal, no âmbito do respectivo procedimento de licença ou autorização de utilização, podendo a câmara, para o efeito, exigir a realização de ensaios acústicos”.
10. Não obstante o pedido de licenciamento da utilização reclamada ter sido apresentado na vigência do anterior Regulamento Geral sobre o Ruído, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 292/2000, de 24 de Novembro, por não se encontrar concluído o processo de licenciamento, à data em que o novo regime preconizado pelo Decreto-Lei n.º 9/2007, de 17 de Janeiro iniciou a respectiva vigência, cumprirá à Câmara Municipal ponderar a aplicação do novo regime e, em especial, das normas que estatuem o controlo prévio das operações urbanísticas, e a necessidade de o licenciamento ser precedido da certificação da conformidade da actividade com os requisitos acústicos, por meio de realização de ensaios de inspecção ou vistoria.
11. Por outras palavras, e em conformidade com legislação comunitária transposta para o ordenamento jurídico português (Directiva n.º 2002/49/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Junho), o legislador veio atribuir ainda mais responsabilidades às entidades licenciadoras, à luz do princípio da prevenção do dano ambiental (2), no âmbito do dever de acautelamento de inconvenientes acústicos em momento anterior ao do licenciamento.
12. De facto, e na falta de apresentação, pelo requerente, de prova da adequação das condições de insonorização, deveria a Câmara Municipal de Santa Cruz providenciar por verificar a conformidade com os requisitos legalmente impostos à prática de actividades ruidosas, com recurso, se necessário, ao apoio técnico de entidades de reconhecida competência (cfr. art. 34º do Regulamento Geral do Ruído).
13. Tal iniciativa foi confiada à entidade licenciadora da actividade, independentemente do exercício do direito de queixa. De outro modo, não ficará minimamente assegurada a finalidade do controlo que às autarquias cumpre efectuar sobre a actividade projectada, no que toca à avaliação dos riscos que o seu exercício importa para a regular prossecução do interesse público e para os direitos de terceiros.
14. Isto, porque a apreciação camarária, na medida em que prescinde da avaliação do impacte sonoro da actividade, relega a prevenção dos riscos para a manutenção da tranquilidade pública e para o sossego e repouso dos moradores vizinhos.
15. Paralelamente, refere V. Exa. que “o horário aprovado está dentro do estabelecido por lei para estabelecimentos do género”.
16. Observo que o Decreto-Lei n.º 48/96, de 15 de Maio, alterado pelo Decreto-Lei n.º 126/96, de 10 de Agosto, e adaptado à Região Autónoma da Madeira pelo Decreto Legislativo Regional n.º 6/99/M, de 2 de Março, que regulamenta o horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais, e que estipula, genericamente, a possibilidade de alguns estabelecimentos de bebidas e restauração poderem permanecer abertos até às duas horas da madrugada, durante os dias da semana (art. 1º, n.º 2), deverá ser interpretada de acordo e em cumprimento com as condicionantes impostas pelo Regulamento Geral do Ruído, no âmbito da instalação e exercício de actividades ruidosas permanentes em zonas mistas, nas envolventes das zonas sensíveis ou mistas ou na proximidade dos receptores sensíveis isolados (art. 13º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 9/2007, de 17 de Janeiro), e em decorrência do dever de fiscalização prévio confiado às entidades licenciadoras das actividades em apreço.
17. Também neste pressuposto, e face ao disposto no Regulamento Geral sobre o Ruído, afigura-se irrelevante saber do entendimento dos moradores sobre o alargamento do respectivo período de funcionamento uma vez que aquele diploma prevalecerá sobre qualquer entendimento ou decisão municipal no que respeita ao exercício de actividades ruidosas, inclusivamente, de natureza regulamentar, atendendo à sua natureza normativa especial.
18. Por isso, não se compreenderá igualmente a interrogação do Senhor Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz, ao questionar a norma habilitante, legitimadora de eventual redução ao horário de funcionamento.
19. Convirá V. Exa. que a mesma fundamentação legal que habilita as autarquias a alargar o período de funcionamento de determinado estabelecimento comercial, sirva, em idêntica medida, para efectivação de decisão administrativa em sentido oposto.
20. Importa, por fim, sublinhar, que o direito ao ambiente, à integridade física e à protecção da saúde se afiguram como direitos fundamentais, incumbindo aos municípios colaborar com o Estado na promoção da qualidade ambiental das populações (cfr. arts. 25º, 64º e 66º da Constituição da República Portuguesa).
21. Por força do seu regime constitucional (v. arts. 17º e 18º do diploma fundamental), as autarquias locais estão vinculadas a um dever de supressão da causa geradora de ruídos incómodos ou intoleráveis, susceptíveis de colocar em risco os direitos acima mencionados.
22. O mesmo dispositivo constitucional, permite ainda compreender que os órgãos jurisdicionais determinem o encerramento definitivo de estabelecimentos desta natureza ou o a redução de horários, aquando da violação de tais direitos (3).
23. Contudo, essa é uma premissa de actuação que incumbe, desde logo, às Câmaras Municipais, no âmbito das competências próprias definidas pelo legislador e respeitado o procedimento administrativo.
24. O papel que, actualmente, está consagrado aos Municípios no incremento de actividades de cariz económico afigura-se indesmentível, sendo que a assunção desse papel, levou, entre outros aspectos, a que o legislador optasse por reforçar, progressivamente, a competência das autarquias no âmbito do licenciamento das actividades de restauração e bebidas e da fixação dos respectivos horários de funcionamento.
25. A protecção de interesses económicos com eventual relevo na dinamização de actividades comerciais e turísticas locais, em detrimento dos direitos dos cidadãos da mesma localidade ao sossego e ao repouso não pode, pois sobrelevar, no âmbito da apreciação camarária de processos de licenciamento desta natureza, ademais quando a sua localização impende em zonas de cariz residencial.
26. Os custos para a qualidade de vida dos moradores, bem como os encargos patrimoniais daí decorrentes para o município – designadamente, em sede de eventual responsabilidade extra-contratual por prejuízos decorrentes de um acto de gestão pública, não devem, por isso, deixar de ser tidos em conta quando se equaciona a viabilidade das medidas de prevenção ou redução do ruído.
III – Conclusões
1. Compete às autarquias locais, no quadro das suas atribuições e das competências dos respectivos órgãos, promover as medidas de carácter administrativo e técnico adequadas à prevenção e controlo da poluição sonora, nos limites da lei e no respeito do interesse público e dos direitos dos cidadãos.
2. Tal incumbência, no limite das respectivas competências próprias, e respeitado o procedimento administrativo, pertence às autarquias, em decorrência, de resto, da efectivação ao princípio da prevenção, e independentemente da procedência ou improcedência das reclamações particulares eventualmente formuladas neste particular.
3. Ponderadas as explicações fornecidas pela autarquia e tendo em consideração o circunstancialismo material inerente à exposição formulada por moradores aí residentes, aduzindo o seu protesto à laboração do estabelecimento comercial reclamado nos moldes preconizados, em virtude de alegados prejuízos resultantes do ruído produzido, a Provedoria de Justiça concluiu que a edilidade não teria acautelado devidamente o direito ao ambiente e qualidade de vida dos seus munícipes.
4. As diligências instrutórias efectivadas por este órgão do Estado ao longo do presente processo, permitiram constatar a existência de défice do controlo do cumprimento e certificação da conformidade da actividade em apreço com os requisitos acústicos preconizados pelo Regulamento Geral sobre o Ruído.
De acordo com as motivações expostas, e exercendo o poder que me é conferido pelo art. 20º, n.º 1, alínea a) da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, RECOMENDO a V. Exa que:
1. Em conformidade com a Lei Fundamental e regime ordinário atrás invocados, sejam desenvolvidos os mecanismos tendentes à fixação de horário de funcionamento adequado às exigências decorrentes do enquadramento habitacional onde se insere o estabelecimento em apreço; 2. Não seja deferido o licenciamento da utilização do estabelecimento comercial reclamado sem precedentemente ser ponderado, de modo objectivo, o impacte sonoro da exploração do estabelecimento em apreço, localizado em área habitacional e com antecedentes de incomodidade, solicitando a realização dos pertinentes ensaios de medição acústica a entidade devidamente acreditada no domínio do ruído; 3. No caso de ser constatada a existência de uma situação de violação do Regulamento Geral do Ruído, seja notificada a empresa promotora da exploração, no sentido de proceder à apresentação de projecto de insonorização do local destinado ao estabelecimento, e que no decurso dos prazos a conceder para audiência de interessados, em conformidade com o preconizado pelos arts. 100º e seguintes do Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 6/96, de 31 de Janeiro, seja instada a executar as pertinentes obras de isolamento em prazo fixado por V. Exa., tendo em conta a natureza dos trabalhos a efectivar, sob pena de ordem de encerramento do estabelecimento; 4. Ainda nessa eventualidade, seja ordenada a instauração de procedimento contra-ordenacional, nos termos do disposto pelos artigos 26º e seguintes do Decreto-Lei n.º 9/2007, de 17 de Janeiro; 5. Sem prejuízo, o município de Santa Cruz pondere, através dos seus órgãos próprios, a aquisição de sonómetro e a formação de pessoal, sem o que não poderá com autonomia prosseguir o regular desempenho das atribuições do Poder Local em matéria de protecção contra o ruído.
Solicito a V. Exa., em cumprimento do dever consagrado no artigo 38º, n.º 2, do Estatuto do Provedor de Justiça (Lei n.º 9/91, de 9 de Abril), que se digne mandar informar-me sobre a sequência que este assunto venha a merecer.
O Provedor de Justiça
H. Nascimento Rodrigues
(1) Conforme disposto na Acta n.º 16/07, relativa à reunião ordinária da Câmara Municipal de Santa Cruz, realizada em 25 de Julho de 2007.
(2) Sobre o princípio em questão, cfr. GOMES CANOTILHO, J.J./VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4ª Edição revista e actualizada, Coimbra, 2007.
(3) Cfr., neste âmbito o Acórdão do STJ, de 18 de Fevereiro de 2003, in Bases Jurídico-Documentais do Ministério da Justiça – Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça, disponível em http://www.dgsi.pt.