RECOMENDAÇÃO N.º 3/B/2003
(Artigo 20º, nº 1, alínea b), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril)


Entidade visada: Presidente da Assembleia da República
Nossa Ref.ª – Proc.º: R-937/02 (A6)
Data: 2003/04/23
Assunto: Voto antecipado. Funcionários e agentes da administração pública que se desloquem em serviço ao estrangeiro em período que compreenda o dia da realização da eleição ou do referendo.



1.
O objecto do presente ofício motivou já a formulação de uma Recomendação junto da Assembleia da República, pelo meu antecessor (cfr. Recomendação 9/B/99, publicada no Relatório Anual à Assembleia da República, respeitante a 1999, II volume, pg. 41).


Assim, há quatro anos atrás, propunha este Órgão do Estado a esse Órgão de Soberania a alteração dos diplomas que regulavam as eleições do Presidente da República, para a Assembleia da República e Autarquias Locais, e a realização de referendos, por forma a neles se incluir a possibilidade do voto antecipado por parte dos funcionários e agentes da administração pública que se desloquem em serviço ao estrangeiro, em período que compreenda o dia da realização de uma eleição ou referendo.


Por outro lado, tendo em vista a uniformização da solução legislativa em apreço, recomendou-se, na mesma ocasião, a alteração dos diplomas que regulavam as eleições para as Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira, por forma a neles se incorporar, não só a mesma possibilidade do voto antecipado por parte dos funcionários e agentes da administração pública colocados nas circunstâncias referidas, mas também a possibilidade do voto antecipado por parte dos eleitores que, por motivo de doença, se encontrem, nas datas das eleições ou referendos, internados ou presumivelmente internados em estabelecimento hospitalar e impossibilitados de se deslocarem à assembleia de voto, e dos que se encontrem, nas datas em referência, em cumprimento de medida privativa de liberdade, nos moldes que a previsão das duas situações já então revestia nos diplomas relativos às eleições do Presidente da República, Assembleia da República, Autarquias Locais, Parlamento Europeu, e na própria lei orgânica do referendo.


2. Foi possível ver acatada a recomendação relativa ao alargamento aos diplomas reguladores das eleições para as Assembleias Legislativas Regionais da solução já então vigente na restante legislação eleitoral, quanto aos eleitores internados por doença ou presos – a legislação relativa aos Açores consagrou, ainda, o voto antecipado para os estudantes ou pessoas matriculadas em cursos de formação profissional, inscritos em estabelecimento de ensino situado fora da ilha onde se encontram recenseados. Tais alterações vieram a ser concretizadas através da Lei Orgânica n.º 2/2000, de 14 de Julho, no que toca ao diploma que regula as eleições para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores, e pela Lei Orgânica n.º 2/2001, de 25 de Agosto, quanto à legislação relativa às eleições para a Assembleia Legislativa da Madeira.


Ficou, no entanto, de fora a sugestão de que o voto antecipado fosse estendido, em todas as referidas leis, aos funcionários e agentes da administração pública que se desloquem em serviço ao estrangeiro em período que compreenda o dia da realização das eleições ou referendos.


Recordo a Vossa Excelência que a possibilidade do voto antecipado foi recentemente – através da Lei Orgânica n.º 2/2001, de 25 de Agosto – facultada aos “membros que representem oficialmente selecções nacionais, organizadas por federações desportivas dotadas de estatuto de utilidade pública desportiva, e se encontrem deslocados no estrangeiro, em competições desportivas, no dia da realização da eleição”.


Já em data anterior, a Lei Orgânica n.º 3/2000, de 24 de Agosto, havia estendido o mecanismo do voto antecipado para a eleição do Presidente da República às pessoas colocadas nas situações a que se reporta o art.º 2.º, alíneas a) a d), do Decreto-Lei n.º 319-A/76, na sua redacção actual.


3. Desde a data da formulação, por este Órgão do Estado, da Recomendação nos termos explicitados, continuam a chegar-me reclamações de cidadãos que se insurgem contra a impossibilidade do exercício do direito de voto na situação aí descrita, em termos que não podem deixar de se acompanhar.


Citando as palavras do meu antecessor na Recomendação mencionada, “a situação de um cidadão que se encontra obrigado, pelo próprio Estado, a cumprir missão oficial fora do país em período que englobe a data da realização de qualquer eleição ou referendo, e que, em virtude desse facto, se encontre impedido de exercer, no sufrágio em causa, o seu direito de voto, consagrado na Constituição como um direito fundamental e considerado como um dever cívico, ofende, antes de mais, o direito subjectivo do cidadão em causa, e também os princípios enformadores da ordem jurídico-constitucional do Estado democrático”.


De resto, o exercício do eventual direito de voto antecipado nos termos aqui propostos, poderia aproveitar integralmente o modo já previsto para a respectiva efectivação pelas pessoas actualmente incluídas na previsão dos art.ºs 70º-B do Decreto-Lei n.º 319-A/76, de 03 de Maio, 79º-B da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio, 66º-B do Decreto-Lei n.º 701-B/76, de 29 de Setembro, 1º da Lei n.º 14/87, de 29 de Abril, em conjugação com o 79º-B da Lei n.º 14/79, 79.º-B do Decreto-Lei n.º 267/80, de 08 de Agosto, 76.º-B do Decreto-Lei n.º 318-E/76, de 30 de Abril, 129º da Lei n.º 15-A/98, de 03 de Abril, e agora 119.º da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, que aprova o regime jurídico do referendo local.


A matéria em causa é da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República (art.º 164º, alíneas a), b), j) e l), da Constituição da República Portuguesa), revestindo a forma de lei orgânica, nos termos do art.º 166º, n.º 2, da Lei Fundamental, carecendo, assim, da aprovação definida no art.º 168.º, n.º 5.


4. Assim sendo, na medida em que me parece de mais elementar justiça, e ao abrigo do disposto no art.º 20.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 9/91, de 09 de Abril, recomendo à Assembleia da República, na pessoa de Vossa Excelência, que promova a alteração ao:









a) Artigo 70.º-A (e concomitante âmbito do art.º 70.º-B) da Lei Eleitoral do Presidente da República, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 319-A/76, de 03 de Maio, na sua redacção actual;


b) Artigo 79.º-A (e concomitante âmbito do artigo 79.º-B) da Lei Eleitoral para a Assembleia da República, aprovada pela Lei n.º 14/79, de 16 de Maio, na sua redacção actual;


c) Artigo 66.º-A (e concomitante âmbito do artigo 66.º-B) do regime eleitoral para a eleição dos órgãos das autarquias locais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 701-B/76, de 29 de Setembro, na sua redacção actual;


d) Artigo 79.º-A (e concomitante âmbito do artigo 79.º-B) da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 267/80, de 08 de Agosto, na sua redacção actual;


e) Artigo 76.º-A (e concomitante âmbito do artigo 76º.-B), do Decreto-Lei n.º 318-E/76, de 30 de Abril, na sua redacção actual, que regula as eleições para a Assembleia Legislativa Regional da Madeira;


f) Artigo 128.º, n.º 1, (e concomitante âmbito do artigo 129.º) da Lei n.º 15-A/98, de 03 de Abril, que regulamenta a realização dos referendos nacionais;


g) Artigo 118.º, n.º 1, (e concomitante âmbito do artigo 119.º) da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, que aprova o regime jurídico do referendo local,  


 por forma a neles se incluir a possibilidade do voto antecipado por parte dos funcionários e agentes da administração pública que se desloquem em serviço ao estrangeiro em período que compreenda o dia da realização das eleições ou referendos.


Na expectativa de que o teor do que acima fica recomendado mereça desta vez o acolhimento que me parece tão desejável, agradeço a Vossa Excelência que diligencie por forma a dar conhecimento do mesmo aos diversos Grupos Parlamentares.



O Provedor de Justiça,
H. Nascimento Rodrigues