Processo: R-963/08


Assessora: Manuela Barreto


 


 


Assunto: Ambiente – ruído – estabelecimento de comércio a retalho de carne (talho).


 


Objecto: Reclamava-se a adopção de medidas de polícia administrativa contra o funcionamento incómodo de talho sito em prédio residencial. A incomodidade era imputada, a título principal, ao equipamento de refrigeração existente no estabelecimento e ao ruído próprio que advinha das operações de carga e descarga.


 


Decisão: No decurso da instrução do processo foram adoptadas providências aptas a debelar o ruído perturbador, motivo pelo qual foi determinado o arquivamento do processo.


 


Síntese:


 


 


1.      Foi solicitada a intervenção do Provedor de Justiça junto da Câmara Municipal de Faro com vista à adopção de medidas de polícia administrativa contra o funcionamento incómodo do talho instalado em prédio residencial, em Faro, com prejuízo para os moradores circunvizinhos.


 


2.      Contestava-se, em especial, o ruído emitido pelo equipamento de refrigeração existente no estabelecimento e ainda o ruído próprio que advinha das operações de carga e descarga, por afectar intoleravelmente o direito ao descanso dos moradores.


 


3.      Verificou-se ter sido realizada medição acústica aos níveis de ruído produzidos pelos equipamentos de refrigeração, cujos resultados concluíram pelo incumprimento dos limites sonoros legalmente fixados pelo que interpelámos o mencionado órgão autárquico a respeito das providências adoptadas com vista a fazer cessar a incomodidade ruidosa reclamada.


 


4.      Inquirimos, do mesmo passo, a C.M. de Faro sobre se o estabelecimento disporia de licença de utilização e se teria sido apresentado certificado de conformidade acústica no âmbito do processo de licenciamento, e ainda sobre o horário autorizado para a realização das operações de cargas e descargas.


 


5.      Do resultado das averiguações, conclui-se que, na sequência das medições acústicas antes referidas, foram adoptadas providências com vista a minimizar o ruído perturbador, uma vez removida a principal fonte geradora de ruído, qual seja o compressor de frio que alimentava uma ilha de congelados existentes no centro do estabelecimento. Por outro lado, o compressor de frio que alimentava as vitrines foi deslocado para o interior do estabelecimento e isolado em compartimento, eliminando-se, deste modo, a propagação do ruído aéreo e estrutural imputado ao seu funcionamento.


 


6.      Acresce, ainda, que as operações de carga e descarga foram objecto de avaliação acústica, cujos resultados permitiram concluir pela observância dos níveis de ruído legalmente fixados.


 


7.      Após certificação acústica e verificação de que o funcionamento do estabelecimento cumpria a legislação do ruído, foi emitido alvará de licença de utilização, condicionado à observância de medidas preventivas, como sejam: a. colocar apoios anti-vibráteis nas mesas de corte e desmanche de peças de carne, de modo a evitar a propagação do ruído produzido por estas operações; b. condicionar a instalação de novos equipamentos ruidosos no estabelecimento ou a alteração dos existentes, da prévia verificação acústica do cumprimento do Regulamento Geral do Ruído, com vista a salvaguardar o sossego e tranquilidade nas habitações vizinhas c. adoptar, durante as operações de carga e descarga, as medidas necessárias para minimização do ruído proveniente desta operação.


 


8.      Impostas condições ao exercício da actividade, não foram recebidas, da parte dos moradores, mais reclamações contra o ruído imputado ao funcionamento do estabelecimento.


 


9.      Verificando-se, em face do exposto, que a C. M. de Faro providenciou pela adopção de medidas de contenção do ruído, foi determinado o arquivamento do processo, nos termos do disposto no artigo 31º, alínea c), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril (Estatuto do Provedor de Justiça).


 


10.  Foi, todavia, feita advertência ao órgão municipal visado para a possibilidade de vir a ser retomada a nossa intervenção, caso o equipamento de refrigeração do estabelecimento em apreço venha a ser deslocalizado, produzindo níveis intoleráveis de ruído para os moradores vizinhos, e os serviços camarários não adoptem providências aptas à reintegração da lei, à prossecução do interesse público e à protecção de direitos reflexamente protegidos de terceiros.


 


11.  Informou-se, por outro lado, o queixoso, que a protecção dos direitos que reputava lesados pelas emissões ruidosas, não dependeria inexoravelmente da intervenção das autoridades administrativas, a qual seria sempre pautada por razões de interesse público. Apenas na medida em que o interesse público coincidisse com o interesse directo e pessoal dos particulares, seriam estes protegidos com a intervenção das entidades públicas.


 


12.  Deste modo, considerando-se ofendido nos seus direitos, assistir-lhe-ia, individual ou coligadamente com qualquer outro vizinho, a faculdade de se opor directamente à conduta lesiva, intentando, junto do tribunal cível competente, acção judicial contra o proprietário do estabelecimento, seja por violação dos direitos de personalidade (artigos 70.º e segs. do Código Civil), seja por violação do disposto no artigo 1346º do Código Civil (emissão de ruídos, produção de fumos e factos semelhantes), pedindo o ressarcimento pelos danos que se prove serem causados pela preterição destes direitos.


 


13.  Por este meio, poderia ser obtida sentença condenatória do proprietário do estabelecimento em causa, ora no pagamento de indemnização por prejuízos que possam ter sido causados, ora na cessação ou redução da actividade, de modo a conformar-se com horário ou níveis de ruído que o tribunal entenda fixar. Embora a lei estipule valores de ruído como máximos não quer dizer que, em concreto, o tribunal não venha a considerar lesados os direitos de V.Ex.a. por emissões ruidosas com valores inferiores.