ANOTAÇÃO
Proc.º: R-3320/02 (Aç)
Assunto: Ambiente. Ruído.
Objecto: Condições de funcionamento do Parque Eólico da Lomba dos Frades, ilha do Faial. Actuação da empresa concessionária
Decisão: A instrução do processo permitiu concluir que foram devidamente considerados quer os interesses atinentes à qualidade de vida dos cidadãos cujas residências se situam na proximidade do parque eólico, quer os benefícios económicos e ambientais que as instalações propiciadoras de uma energia renovável e não poluente garantem a toda a comunidade.
Síntese:
A 14 de Outubro de 2002, a Comissão de Moradores da Rua do Chão Frio fez chegar ao Provedor de Justiça uma queixa relativa ao incómodo provocado pelas condições de funcionamento de vários aerogeradores instalados pela EEG — Empresa de Electricidade e Gás, do Grupo EDA, S.A., Electricidade dos Açores, na zona da Lomba dos Frades, isto é na proximidade das respectivas residências.
Na sequência da instrução do processo oportunamente aberto neste órgão do Estado, a mesma empresa transmitiu, por último, a este órgão do Estado a informação de que a Direcção Regional do Comércio, Indústria e Energia emitiu licença de exploração do Parque Eólico do Faial.
As especiais restrições de que é acompanhada tal decisão bem como as circunstâncias que envolveram a formação da mesma, conduzem a que o Provedor de Justiça entenda cumpridos os objectivos visados com a intervenção deste órgão do Estado.
II
Para melhor enquadrar tal decisão, é de seguida efectuada uma caracterização dos principais pontos de referência da controvérsia desencadeada pela queixa da Comissão.
1. O Parque Eólico da Lomba dos Frades é constituído por seis aerogeradores, de 300 KVA por unidade, e destina-se a complementar o abastecimento da rede pública de energia da ilha do Faial.
Situa-se nas proximidades da Rua do Chão Frio, comunidade constituída por três dezenas de moradias, potencialmente afectando um universo de quarenta pessoas.
2. Protestou a Comissão contra o ruído produzido pelo mencionado equipamento, por afectar negativamente e de modo significativo o bem-estar e a qualidade de vida da comunidade, com especial referência primeiro aos dias de vento forte e, depois, aos dias chuvosos, nos quais é produzida grande incomodidade. Acrescendo ainda a possibilidade de desvalorização de todas as propriedades da zona.
3. Iniciada a instrução do processo, foi possível apurar que:
(a) Para a instalação do mencionado parque foram consideradas duas alternativas: Cabeço Gordo e Lomba dos Frades. Em 1996 a Direcção Regional do Ambiente apontou como localização preferencial a que veio a ser escolhida. (b) O departamento da Administração regional com competência em matéria de ambiente emitiu pareceres prévios favoráveis em Abril de 1997 e Julho de 2000. (c) Pelas suas dimensões não se torna necessária a realização de um estudo de impacto ambiental (v. n.º 3 do anexo II do Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio). (d) A 18 de Setembro de 2002, a Direcção Regional de Comércio, Indústria e Energia havia emitido licença de estabelecimento de uma instalação eléctrica de serviço público consistente na montagem de seis aerogeradores de 300 KVA cada. |
4. Já em 2003, e face às queixas apresentadas, o problema foi tratado em reunião com o Senhor Presidente do Conselho de Administração da EDA. Na mesma foram prestadas as seguintes informações:
1) A EDA reconheceu a procedência (parcial) da reclamação, na medida em que era produzido ruído; 2) Ainda assim, a proveniência do ruído não fora determinada (equipamento ou outra), pelo que não seria possível partir de imediato para a estipulação de condicionantes à laboração do estabelecimento; 3) No caso de ser apurada responsabilidade do fornecedor do equipamento seria ele a resolver a questão, já que pelas suas especificações técnicas o equipamento em causa não deverá produzir ruído; 4) Aguardava-se relatório solicitado ao LNEC sobre a incomodidade sonora provocada pela laboração do Parque Eólico; 5) Cautelarmente, a laboração fora suspensa durante a noite, entre as 19h00min e as 22h00min. |
5. Sem embargo, a Comissão manifestou desconfiança em relação às medições que entretanto haviam sido efectuadas, por terem sido realizadas em condições atmosféricas não demonstrativas dos ruídos que motivaram a queixa.
6. A 28 de Fevereiro de 2003 o parque eólico foi objecto de licença de funcionamento provisória para a realização de testes, tendo a EDA comunicado que confrontara o fornecedor do equipamento com a necessidade de alterar as características dos equipamentos fornecidos.
7. Nesse contexto, o acompanhamento da situação pelo Provedor de Justiça visou garantir que seriam tomadas as medidas adequadas a que:
(a) O equipamento não produzisse ruídos a níveis irregulares e/ou contínuos; 7.1 Tal entendimento justificou que este órgão do Estado sublinhasse à empresa a conveniência de serem estabelecidos mecanismos de participação dos interessados, através da divulgação mensal, designadamente através da Junta de Freguesia dos resultados dos estudos em curso, garantindo também a audição dos representantes dos interessados. |
8. Em Julho de 2003, foi concedida à EDA uma licença de exploração provisória, pelo período de um ano, entre as 07h00min e as 22h00min, uma vez que o estudo elaborado pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil, permitira a conclusão de que o parque eólico cumpria, durante o período diurno, os limites impostos pelo Regulamento Geral do Ruído, sem prejuízo da imposição de nova monitorização de ruído. Essa licença veio a ser prorrogada até final de 2004.
8.1. Em sequência (Outubro de 2003) a empresa realizou acções de substituição de equipamentos com vista à eliminação dos ruídos tonais, a substituição integral das pás dos aerogeradores por outras de perfil optimizado à não emissão de ruído. |
9. Sem embargo, no mesmo mês em que estes desenvolvimentos eram conhecidos, a Comissão dava conta de diversas violações da restrição horária fixada. Mais tarde, já em Fevereiro de 2004, e reconhecendo embora a realização das modificações a que a empresa se havia comprometido, veiculava também que os motivos de queixa se mantinham, embora com características diferentes.
10. Foi na sequência das referidas alterações de equipamento que a empresa foi autorizada a realizar uma acção de monitorização, por um período de 45 dias, com horário de funcionamento alargado (24 horas diárias) para caracterização da componente nocturna.
10.1 No “programa de medidas” elaborado pela empresa responsável pela realização técnica dessa monitorização — oportunamente levado ao conhecimento da Comissão — constata-se a preocupação de realização dos testes pelo período de tempo e nas condições climatéricas aptas a abranger o espectro de situações alegadamente responsáveis pelos níveis de ruído mais incomodativos, distinguindo no ruído ambiente o que pode ser imputável ao funcionamento do parque eólico. |
Sublinhe-se que tal programa de procedimentos mereceu o parecer prévio favorável do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC).
11. As conclusões do estudo foram as seguintes:
“1 — No período diurno, o regime acústico de funcionamento do Parque Eólico enquadra-se cabalmente nas disposições regulamentares sobre a matéria, independentemente da consideração ou não, da existência de componente tonal associada ao funcionamento do parque. 2 — No período nocturno, se não surgirem condições que dêem origem à aplicação penalizante do factor correctivo K1, devido ao surgimento de tonalidades com origem no funcionamento do parque, o regime acústico de funcionamento do parque também se enquadra nas disposições regulamentares sobre a matéria em apreciação. Dado que em certos regimes de funcionamento, se observa a existência de uma componente tonal associada ao funcionamento do Parque, será indicado proceder à sua minimização para [garantir o] enquadramento regulamentar.” |
12. Este estudo foi, também ele, objecto de parecer favorável do LNEC, o que determinou que a licença de funcionamento viesse a estipular uma restrição ao horário de laboração do parque eólico durante o período nocturno, limitando-o a quatro horas (das 22h00min às 02h00min).
III
Face ao que fica descrito, o Provedor de Justiça concluíu que foi seguido o procedimento adequado à garantia da consideração dos diversos interesses em presença, não havendo, pois, ilegalidade na actuação da EEG, Empresa de Electricidade e Gás, L.da, do Grupo EDA, nem na concessão da licença de funcionamento do Parque Eólica da Ilha do Faial.
Os estudos técnicos levados a cabo por empresa especializada e avalizados por um instituto público independente e de prestígio reconhecido pelas partes; as alterações efectuadas pela EEG, L.da, nos equipamentos inicialmente instalados e ainda as diligências efectuadas pela mesma tendo em vista o esclarecimento dos reclamantes, conforme sugerido por este órgão do Estado, são de molde a concluir que foram devidamente considerados quer os interesses atinentes à qualidade de vida dos cidadãos cujas residências se situam na proximidade do parque eólico, quer os benefícios económicos e ambientais que as instalações propiciadoras de uma energia renovável e não poluente garantem a toda a comunidade.
Não pode deixar de ser sublinhado o compromisso da empresa de que continuará a procurar suprimir a emissão de ruídos com componente tonal pelo equipamento em causa, em qualquer circunstância, a fim de que seja possibilitado o funcionamento em todo o período regulamentar.
Tal compromisso é tanto mais de sublinhar quanto é certo que o parecer do LNEC aponta no sentido de uma eventual rigidez das regras aplicáveis aos procedimentos de licenciamento destes equipamentos face às vantagens económicas e especificamente ambientais que deles resultam.
De tudo o que decorreu a decisão do Provedor de Justiça de ter por desnecessária a realização de diligências adicionais no presente processo.