RECOMENDAÇÃO N.º 5/A/2008
[artigo 20.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril]


(Extensão da Região Autónoma dos Açores)


Entidade visada: Director Regional do Orçamento e Tesouro
Proc.º: R-1771/08 (Aç)
Data: 03.07.2008


Assunto: Recursos Humanos. Compensação por caducidade de contrato de trabalho a termo resolutivo incerto.




I – INTRODUÇÃO


1. No interesse da Senhora Dr.ª A foi aberto um processo neste órgão do Estado visando a apreciação dos termos em que à mesma foi calculada a atribuição de uma compensação por caducidade de um contrato de trabalho a termo resolutivo incerto, na sequência das funções que desempenhou no Serviço de Desenvolvimento Agrário da Terceira, de 12 de Julho a 17 de Dezembro de 2005.



1.1. Enquanto a reclamante entende que o cálculo da importância devida supõe a utilização da norma do artigo 264.º, do Código do Trabalho (CT), que fixa as regras de cálculo da retribuição horária, a Direcção Regional do Orçamento e Tesouro, solicitada a pronunciar-se sobre o assunto, determinou que o dito cálculo fosse efectuado sem atender a tal normativo, porquanto resultaria da leitura dos artigos 389.º e 388.º do mesmo Código, que não há “por parte do legislador qualquer remissão, nem alusão ou associação expressa, para efeitos do cálculo do valor da compensação por caducidade, para a fórmula constante do artigo 264.º do Código do Trabalho”, sendo que “o n.º 2 do artigo 388.º explicita claramente a forma como se procede ao apuramento da referida compensação”.



II – EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS



2. Nos termos do artigo 6.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, que aprova o dito código, “(A)o trabalhador de pessoa colectiva pública que não seja funcionário ou agente da Administração Pública aplica-se o disposto no Código do Trabalho, nos termos previstos em legislação especial, sem prejuízo dos princípios gerais em matéria de emprego público.”



2.1. A Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho, que aprova o regime jurídico do contrato individual de trabalho na Administração Pública, depois de remeter para a aplicação do CT, prevê, no artigo 9.º, as situações em que as pessoas colectivas públicas podem celebrar contratos a termos resolutivo.



3. Aplica-se, pois, o disposto no CT à situação em apreço (v., sobre a aplicação das regras do Código do Trabalho à atribuição de compensação por caducidade do contrato a termo resolutivo na Administração Pública, o Parecer n.º 79/2004, da Procuradoria Geral da República, DR, II, de 15 de Maio de 2007).



4. Determina o artigo 389.º do CT, sob a epígrafe “Caducidade do contrato a termo incerto”:




“1 – O contrato caduca quando, prevendo-se a ocorrência do termo incerto, o empregador comunique ao trabalhador a cessação do mesmo, com a antecedência mínima de 7, 30 ou 60 dias, conforme o contrato tenha durado até seis meses, de seis meses até dois anos ou por período superior.


2 – (…)


3 – (…)


4 – A cessação do contrato confere ao trabalhador o direito a uma compensação calculada nos termos do n.º 2 do artigo anterior.”


4.1. O mencionado n.º 2 do artigo 388.º (relativo à caducidade do contrato a termo certo) prevê que




“A caducidade do contrato a termo certo que decorra de declaração do empregador confere ao trabalhador o direito a uma compensação correspondente a três ou dois dias de retribuição base e diuturnidades por cada mês de duração do vínculo, consoante o contrato tenha durado por um período que, respectivamente, não exceda ou seja superior a seis meses.”


5. Como se disse, a Administração Regional Autónoma fundou a sua decisão na falta de menção expressa ao artigo 264.º (“cálculo do valor da retribuição horária”) no enunciado do artigo 388.º, ambos do CT, tendo acrescentado, que, ao invés, o artigo paralelo da anterior legislação, isto é, o artigo 46.º do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, remetia expressamente para a fórmula do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 64-A/87, de 9 de Fevereiro (prevista igualmente no artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 874/76, de 28 de Dezembro), acrescentando que o n.º 3 do artigo 388.º refere tão somente que “(P)ara efeitos da compensação prevista no número anterior a duração do contrato que corresponda a fracção de mês é calculada proporcionalmente.”



Mas, não colhe a argumentação aduzida.



6. Não se afigura, desde logo, que se possa atribuir especial significado à falta de menção expressa ao artigo 264.º, ao invés do que sucedia no artigo paralelo do anterior regime. É que um dos ojectivos fundamentais do CT é o da sistematização do direito laboral, disponibilizando um “quadro claro e coerente de soluções legais, como forma de se garantir o cumprimento da sua função e a sua efectividade” (v. Abrantes, José João, “O Código do Trabalho e a Constituição”. Questões Laborais, ano X, n.º 22, Coimbra: Coimbra Editora, 2003).



Reunidos por isso num mesmo código os diferentes aspectos da relação laboral, desnecessário se tornaria a permanente remissão interna.



7. Nem o facto do artigo 258.º do CT (Trabalho suplementar) — como, aliás, os artigos 208.º (Retribuição mínima garantida) e 293.º (Redução do período normal de trabalho) da Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, que regulamenta o Código do Trabalho —, remeterem expressamente para o dito artigo 264.º invalida o que se disse, pois do que manifestamente se trata nesses normativos é de prever especialidades em relação ao regime regra.



8. Porque é efectivamente um regime regra que o artigo 264.º estabelece ao determinar que










Para os efeitos do presente diploma, o valor da retribuição horária é calculado segundo a seguinte fórmula:

(Rm 12) (52 n)


em que Rm é o valor da retribuição mensal e no período normal de trabalho semanal.



Do que resulta, à evidência, que para todas as situações em que seja necessária a determinação da retribuição horária deverá ser utilizada a referida fórmula.



8.1. Nem a menção do n.º 3 do artigo 388.º ao cálculo proporcional no caso de duração do contrato que corresponda a fracção de mês permite outra conclusão, já que do que aqui se trata é sublinhar que “a proporcionalidade, a que se refere o n.º 3, pressupõe que a fracção de mês seja calculada no seu valor e não equiparando-a a um mês (para efeitos de compensação, o trabalhador cujo contrato durou cinco meses não pode ser equiparado àquele que teve um contrato durante quatro meses e uma semana)” (v. Martinez, Pedro Romano et allii, Código do Trabalho Anotado. 4.ª edição. Coimbra: Almedina; 2006).



9. Acresce que seria incompreensível que a fórmula fixada no artigo 264.º fosse determinante para o cálculo da retribuição horária nos casos em que está em causa apurar as remuneração devidas ao trabalhador, mas já não devesse ser usada quando se trate de uma indemnização (compensação) derivada de responsabilidade por intervenções lícitas devida pelo empregador (v. AA. cit., pp. 640).



10. Por fim, sublinho que o entendimento exposto é sufragado pela Autoridade para as Condições do Trabalho, nas fichas interpretativas do Código do Trabalho e Regulamentação (acesso a documento PDF »»»), referindo expressamente que ” a fórmula para o cálculo de qualquer das importâncias retributivas previstas no CT é a que surge no artigo 264.º, a qual é de aplicar em todas as circunstâncias em que se torne necessário encontrar o valor da retribuição horária ou quando o valor da retribuição é referenciado a dias úteis.” 



III – RECOMENDAÇÕES


Pelas razões que deixei expostas e no exercício do poder que me é conferido pelo disposto no artigo 20.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, RECOMENDO a V. Ex.ª que:







A. Instrua os serviços na sua dependência no sentido de o cálculo da compensação por caducidade do contrato resolutivo a termo, a que se referem os artigos 388.º e 389.º do Código do Trabalho, passar a ser efectuado tendo em consideração o cálculo do valor da retribuição horária previsto no artigo 264.º do mesmo Código;



B. Em consequência, determine o pagamento à Senhora Dr.ª A da verba que ainda lhe for devida como compensação por caducidade do contrato resolutivo a termo incerto, mediante cálculo efectuado nos termos mencionados na conclusão antecedente.


Permito-me lembrar a V. Ex.ª a circunstância da formulação da presente Recomendação não dispensar, nos termos do disposto no artigo 38.º, n.ºs 2 e 3, da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, a comunicação a este órgão do Estado da posição que vier a ser assumida em face das respectivas conclusões.


O Provedor de Justiça,
H. Nascimento Rodrigues