Processo: R-4688/08 (A1) Entidade visada:
Assunto: Ordenamento do território – servidões administrativas – linhas de distribuição de energia eléctrica – instalação de postes – dano efectivo
1. Foi apresentada ao Provedor de Justiça reclamação contra a EDP ¾ Distribuição de Energia, SA, (EDP), por ter instalado postes eléctricos numa propriedade do reclamante e causado danos em pequenos arbustos.
2. Pretendia o reclamante que os postes fossem removidos e instalados em outro local. A menos que, conforme propusera à EDP, lhe fosse paga uma indemnização pela passagem da linha eléctrica e prestada uma renda, à semelhança da contrapartida prestada aos proprietários dos terrenos onde são colocadas antenas de telecomunicações.
3. Importa observar, antes de mais, que as linhas de energia eléctrica – que prestam um serviço público de interesse geral – não devem ser comparadas com a da rede de telecomunicações móveis, cuja utilidade colectiva não se confunde com o interesse público. Por isso, à EDP é atribuída uma concessão, ao passo que as operadoras de telemóveis dispõem apenas de licença. Quer isto dizer que, em certa medida, a EDP é chamada a desempenhar tarefas públicas.
4. Solicitadas explicações à EDP sobre as questões suscitadas, obtiveram-se informações no sentido de se tratar de uma linha de média tensão, devidamente licenciada, e que respeita todas as condições técnicas e de segurança legalmente estabelecidas, sem que esteja previsto proceder à alteração solicitada pelo reclamante.
5. Mais nos foi transmitido que pela passagem da linha em causa pelos terrenos do reclamante, bem como pela colocação de um apoio, foi apurada uma indemnização no valor de € 206,73.
6. A EDP pode beneficiar da constituição de servidões sobre terrenos privados necessários ao estabelecimento das partes integrantes da rede eléctrica de serviço público, após aprovação dos projectos (artigo 12.º, n.º 3, alínea c), do Decreto-lei n.º 29/2006, de 15 de Fevereiro).
7. Trata-se de uma restrição ao direito de propriedade justificada pela satisfação da utilidade pública (regime distinto dos contratos celebrados, ao abrigo do direito privado, para colocação de antenas em terrenos ou na cobertura dos edifícios), onde não há lugar ao pagamento de uma renda.
8. À concessionária incumbe afastar ou remover os elementos da linha que constituam obstáculo, desde que o proprietário demonstre que no local pretende executar obras de construção ou de ampliação de edifícios existentes, estando tal direito condicionado ao pagamento de uma indemnização, equivalente a metade do custo das modificações a efectuar nas linhas (artigo 44.º do Decreto-lei n.º 43.335, de 19 de Novembro de 1960). Por esta via, é, de algum modo, temperada a restrição imposta ao aproveitamento de imóveis.
9. Isto, sem prejuízo do direito que assiste aos proprietários dos terrenos de serem indemnizados pela concessionária, por redução de rendimento, diminuição da área da propriedade ou quaisquer prejuízos provenientes da construção das linhas (artigo 37.º do Decreto-lei n.º 43.335, de 19 de Novembro de 1960). Importa, em todo o caso, fazer prova de um dano concreto e efectivo. Por outras palavras, não basta ao proprietário invocar o direito de propriedade. Cabe-lhe demonstrar um prejuízo.
10. Quanto ao direito a uma indemnização por um (eventual) risco para a saúde pela passagem de uma linha de média tensão, respeitadas as distâncias legais e regulamentares, o actual estado da ciência não permite estabelecer nem excluir por completo um nexo de causalidade entre as perturbações para a saúde dos moradores e a exposição continuada a campos electromagnéticos. Assim, o direito a uma indemnização por esse facto não é reconhecido.
11. Na falta de acordo entre as partes, o valor da indemnização será fixado por arbitragem, desde que assim requeira um dos interessados, havendo porém recurso para os tribunais (artigos 38.º e 43.º do Decreto-lei n.º 43.335, de 19 de Novembro de 1960).
12. De todo o modo, não pode o Provedor de Justiça tomar posição sobre a localização das linhas eléctricas. A justiça e a legalidade constituem os parâmetros do controlo exercido por este Órgão do Estado que não pode, por conseguinte, pronunciar-se sobre os modos que repute mais convenientes para a prossecução do interesse público, quando tal posição não se funde em razões de ordem jurídica ou em razões técnicas recebidas pela ordem jurídica. A escolha dos locais de atravessamento é uma decisão discricionária que obedece a critérios de ordem técnica e que apenas pode ser reprovada pelo Provedor de Justiça em caso de manifesto erro de apreciação, de desvio de poder ou de violação dos princípios gerais de direito.
13. Em face do que vem exposto, não se encontram motivos para sugerir à EDP outra actuação e prosseguir a instrução do processo.