Presidente do Conselho de Administração dos
C.T.T. – Correios de Portugal, S.A
Processo:R-1116/95
Número: 62/A/96
Data:18.07.1996
Área: A2
Assunto:CONSUMIDORES – CTT – IDOSO – DIFICULDADES DE LOCOMOÇÃO – DISTRIBUIÇÃO DOMICILIÁRIA – CAIXA E CORREIO INDIVIDUAL.
Sequência:Acatada
1. Foi apresentada junto deste órgão do Estado uma reclamação do Sr…, com endereço postal na Caixa… de Salamande, 4990 Friastelas, contestando o facto de ter deixado de ser distribuída correspondência no seu domicílio.
2. O reclamante é de idade avançada, bem como sua esposa, e ambos sofrem de graves dificuldades de locomoção.
3. Durante três anos foi distribuída correspondência no domicílio do reclamante, até que os C.T.T. – Correios de Portugal, S.A. decidiram instalar Caixas de Correio Individual (CCI), o que obriga o reclamante a percorrer diariamente (mesmo não recebendo muita correspondência, terá diariamente de se certificar da sua existência) uma distância francamente penosa, dada a referida dificuldade de locomoção do reclamante e de sua esposa.
4. Não foi o reclamante consultado quanto à possibilidade de lhe ser retirada a distribuição domiciliária de correspondência – ou de qualquer modo coligidos elementos que permitissem concluir contra ou a favor dessa hipótese -, por forma a ser devidamente ponderado pelos C.T.T. se a solução de instalação de CCI seria, e em que extensão, prejudicial ao reclamante.
5. Tendo sido exposto o caso, por estes serviços, aos C.T.T. – Correios de Portugal, S.A., surgiu a resposta através do ofício n.º …, afirmando-se, e em síntese, que a situação se justifica por se verificar que, na freguesia em apreço, o fraco volume de correspondência movimentado não torna economicamente viável a distribuição porta a porta, optando-se pela instalação de Caixas de Correio Individual (CCI).
6. É certo que, nos termos do art.º 21.º, n.º 2, do Regulamento do Serviço Público dos Correios, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/88, de 18 de Maio – a que os C.T.T. continuam obrigados nos termos da alínea a) do n.º 1 do art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 87/92, de 14 de Maio -, podem ser estabelecidas pela empresa operadora modalidades de distribuição distintas das previstas no mencionado regulamento.
7. Mas é verdade também que aquela disposição deverá ser entendida em termos hábeis, no sentido de aos C.T.T. ser permitido estabelecer outras modalidades de distribuição para além das que existem (justificadas até eventualmente por motivos de racionalidade económica, perfeitamente atendíveis dentro das novas perspectivas de entendimento de serviço público), mas nunca no sentido de ser permitida a substituição pura e simples de uma modalidade já instalada por outra, sem ser ponderada casuisticamente a situação de quem é afectado pela decisão.
8. Outro entendimento desta disposição levaria ao desvirtuamento do serviço público dos correios, o que o Regulamento em apreço claramente exclui.
9. Isto é tanto mais verdade quanto é certo que a distribuição e entrega de correspondência se encontra no âmbito do serviço público dos C.T.T. explorado em regime de exclusividade – nos termos do n.º 1 do art.º 3.º do referido Regulamento -, pelo que “há a proibição do mesmo tipo de actividade aos particulares” (vide Marcello Caetano – “Manual de Direito Administrativo”, II Volume, Almedina, 10ª edição, pág. 1075), razão pela qual o reclamante não poderá nunca recorrer aos serviços de uma outra entidade.
10. Desta forma, resulta inequívoco que o disposto no n.º 2 do art.º 3.º do Regulamento do Serviço Público dos Correios deverá ser entendido em termos tais que da sua aplicação não resulte, para a pessoa afectada, um recuo injusto numa situação previamente criada em seu benefício. Isto é, nunca poderá resultar da interpretação daquele artigo que, pelo menos sem terem ponderado a situação concreta do reclamante, possam os C.T.T. substituir a modalidade de distribuição domiciliária por outra.
11. Aliás, vai nesse sentido o entendimento geral da doutrina no que respeita aos serviços públicos. Refere, nomeadamente, Marcello Caetano ser o serviço público um “tipo de serviço administrativo cujo objecto consiste em facultar, por modo regular e contínuo a quantos deles careçam, os meios idóneos para a satisfação de uma necessidade colectiva e individualmente sentida” (in “Manual de Direito Administrativo”, I Volume, Almedina, 10ª edição, pág. 240), acrescentando, mais à frente, que mesmo quando “confiado a uma entidade particular, é destinado ao público, tem a sua razão de ser nas necessidades, nas comodidades, nos interesses da colectividade a que se destina e não pode, por isso, ser desvirtuado por espírito de especulação financeira ou de competição económica” ( idem, Vol. II, pág. 1074).
12. Por outro lado, sendo certo ter essa empresa comunicado que a instalação de CCI’s na localidade em causa “não impede, no entanto, que as correspondências registadas ou especiais continuem a ser efectuadas no domicílio” – pelo que uma eventual distribuição domiciliária ao reclamante nunca será demasiado onerosa -, e tendo em conta as dificuldades de locomoção, aliás medicamente atestadas (conforme cópia que se junta), do reclamante e esposa, considero que sempre deveriam os C.T.T. ponderar a possibilidade de o reclamante poder voltar a receber a correspondência no seu domicílio, como acontecia até há algum tempo atrás.
Termos em que RECOMENDO:
Que, no estrito respeito pelo espírito do Regulamento do Serviço Público dos Correios, a que os C.T.T. – Correios de Portugal, S.A. se encontram vinculados por força do Decreto-Lei n.º 87/92, de 14 de Maio, seja restabelecida na morada do reclamante a distribuição postal domiciliária.
O PROVEDOR DE JUSTIÇA
José Menéres Pimentel