Presidente da Câmara Municipal do Porto

Proc.:R-608/92
R ec. nº 85/A/95
Data:1995-09-04
Área: A2

ASSUNTO:URBANISMO E OBRAS – PRÉDIOS URBANOS – PROPRIEDADE DAS AUTARQUIAS LOCAIS – OBRIGAÇÃO DE EXECUCAÇÃO DE OBRAS – REPARAÇÃO DE FOGOS – REALOJAMENTO EM BAIRRO SOCIAL.

1. A Senhora ….solicitou a minha intervenção no sentido de fazer valer os seus direitos junto dessa Exma. Câmara, numa relação
de inquilina-senhoria, para a efectivação de obras de reparação do fogo em que habita.

2. A reclamante residia com sua mãe … numa casa arrendada a …, sita na Rua …., dessa cidade do Porto.

3. Mediante escritura lavrada em 1 de Julho de 1969, a Câmara Municipal do Porto adquiriu a referida casa, com o objectivo de vir a proceder à sua demolição, a fim de permitir o prolongamento, para norte, da Rua Sá da Bandeira – o que, até hoje, e já lá vão vinte e cinco anos, ainda não foi feito.
Com esta aquisição a Câmara assumiu, para todos os efeitos legais, a posição contratual de senhoria.

4. Por aquela data, foi obtida da respectiva inquilina (mãe da ora reclamante, como se disse), uma declaração segundo a qual a mesma “.. disse estar de acordo com a rescisão do contrato de arrendamento desde que a Câmara a realoje com o seu agregado familiar num dos Bairros Municipais”.

5. Desta declaração pretendeu essa Exma. Câmara extrair uma nova posição jurídica, segundo a qual a declarante passou da situação de arrendatária, para mera ocupante do fogo, mediante o pagamento de uma taxa, com o que a relação de arrendamento de direito privado (arrendamento civil), terá sido substituida por uma “situação” de natureza administrativa, de que seria indicativo, não já o pagamento de uma renda, mas sim da taxa mencionada (Informação n° 48/92-P, de 5 de Novembro de 1992).

6. Todavia, esta posição é inaceitável, visto que a declaração referida no n° 3 é bem clara e explícita, ao dizer que a rescisão do contrato de arrendamento é aceite “desde que”, ou seja, se e quando a Câmara realojar a Declarante e seu agregado familiar num dos Bairros Sociais – o que até hoje não foi feito.
Na verdade, aquela expressão “desde que..” é claramente condicional.

7. Aliás, é de notar, que a ocupação precária de um fogo, mediante o pagamento de uma taxa ( Decreto-Lei n° 34.486, de 6 de Abril de 1945), não tem aqui aplicação, pelo que se disse acima, pelo facto de só ser aplicável aos fogos referidos no art. 1° do diploma em apreço e, ainda, porque esse diploma foi expressamente revogado (Decreto-Lei n° 310/88, de 5 de Setembro – art. 22° ), sendo certo que tal revogação se entendia existir desde a publicação do Decreto-Lei n° 419/77, de 4 de Outubro (Vd. Preâmbulo, n° 2, e art. 17°, n° 2), com o propósito expresso de dar “estabilidade.. à relação habitacional..de conformidade com a nova realidade
socio-económica..”.

8. Após o falecimento da inquilina originária, a ora reclamante, que já vivia com ela e fazia parte do seu agregado familiar, continuou a habitar a casa em questão, com conhecimento e aceitação dessa Exma. Câmara, tendo a respectiva renda sido alterada para a
importância de esc. 3.006$00.

9. É neste contexto que a reclamante, a partir de Fevereiro de 1991, tem vindo a solicitar, mediante requerimentos dirigidos a V.Exa., que sejam tomadas as providências necessárias para acorrer à situação de degradação em que se encontra a sua casa: o sanitário está quase inoperacional na cozinha chove tanto como na rua são muitos os rebocos das paredes caídos onde havia soalho, há agora buracos a janela que dá para a rua está podre e não funciona a porta da rua pouco melhor está que a janela.

10. Em vistoria realizada pelos serviços camarários foi confirmada esta situação (of. camarário, n° 356/92-P, de 21.Abril.92), afirmando-se que o respectivo orçamento de obras era elevado. Todavia, a Câmara não se dispôs a fazer as obras necessárias por estar para breve a transferência da reclamante para bairro social camarário, em fase de conclusão, conforme despacho de 3 de Abril de 1992, do Exmo. Vereador do Pelouro da Habitação.

11. Infelizmente não se procedeu ao realojamento da reclamante, apesar da conclusão de vários bairros sociais que, entretanto, foram ocupados por outros interessados, como não foram tão pouco feitas as obras de reparação cuja necessidade se veio dizer agora (of. camarário n° 118/94, de 13 de Outubro passado), não ser justificada, com o argumento, obviamente inaceitável, de
a habitação contígua à da reclamante “se encontrar em relativo bom estado..”.

12. Devemos concluir, assim, que essa Exma. Câmara é parte num contrato de arrendamento com a reclamante devendo, como senhoria, cumprir as obrigações que lhe advêm da lei, nomeadamente quanto a obras de conservação, e não é dispiciendo fazer notar que ainda na vigência do Decreto-Lei 34.486 (referido no n° 7), correriam sobre a mesma Câmara os encargos de
conservação do fogo em causa, como se determinava no art. 4° daquele diploma.

13. Em face do exposto, tenho por bem dirigir a V.Exa. a seguinte RECOMENDAÇÃO, ao abrigo do disposto no art. 20, n° 1, alínea a), da Lei n° 9/91, de 9 de Abril:
“Que sejam providenciadas, com urgência, as obras de conservação no fogo sito no n° 153, da Rua das Carvalheiras, cidade do Porto, propriedade dessa Exma. Câmara, e em que é inquilina a Senhora…., conforme as obrigações que resultam da relação contratual de arrendamente, nomeadamente o disposto no Decreto Lei n° 321-B/90, de 15 de Outubro, “maxime” no seu art. 11°.”, ou que, em alternativa, instale a reclamante em bairro social.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel