Presidente do Conselho de Administração da Caixa Geral de Aposentações
Proc.:R-1527/94
Rec. n§ 87/A/95
Data:1995-09-05
Área: A 3
Assunto: SEGURANÇA SOCIAL – PENSÃO DE APOSENTAÇÃO – CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO – MEIO DE PROVA – APRESENTAÇÃO DE CERTIDÃO EMITIDA POR SERVIÇOS OFICIAIS ESTRANGEIROS – LEGALIZA��O DE DOCUMENTOS AUT�NTICOS ESTRANGEIROS.
Sequência: Não acatada
1.Como é do conhecimento de V.Exa., a Senhora … dirigiu-me uma exposição, reclamando ter-lhe sido recusada, como meio de prova do tempo de serviço prestado na ex-administração ultramarina, uma certidão emitida por serviços oficiais angolanos, devidamente legalizada pelos serviços consulares portugueses naquele território.
2.Para além da referida, foram-me dirigidas reclamações de teor idêntico relativas aos processos de aposentação do Senhor A e do Senhor B.
Tem em comum a não consideração, pela Caixa, de certidões oficiais estrangeiras, legalizadas pelos serviços consulares.
3.Aos pedidos de esclarecimento formulados pela Provedoria de Justiça, respondeu o Director-Coordenador da Caixa Geral de Aposentações que, em face do conhecimento da falsidade quer de certidões emitidas em nome de um serviço oficial angolano quer de alguns actos de legalização, foi deliberado por esse Conselho “não considerar suficientes as certidões emitidas pelos países de expressão oficial portuguesa”, salvo se requeridas e obtidas através das representações diplomáticas portuguesas naqueles países.
Tal deliberação não me parece, porém, respeitar o regime legal vigente em matéria de prova.
4.Nos termos do art. 363º do Código Civil – que, nesta matéria, se assume como direito comum – consideram-se documentos autênticos os exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência.
Por seu turno, o art. 365º do mesmo Código estabelece que a legalização dos documentos autênticos estrangeiros pode ser exigida quando houver fundadas dúvidas acerca da sua autenticidade.
A legalização deverá obedecer às normas do art. 540º do Código de Processo Civil, que exige que a assinatura do funcionário público esteja reconhecida por agente diplomático ou consular português no Estado em questão e que a assinatura deste agente esteja autenticada com o selo branco consular respectivo.
A aplicação conjugada das normas citadas impõe a conclusão de que as certidões emitidas pelos serviços públicos dos ex-territórios ultramarinos que obedeçam aos requisitos de legalização enunciados valerão, pois, como documentos autênticos.
5.Ora, os documentos autênticos gozam, nos termos do art. 371º de força probatória plena quanto aos factos que se referem como sendo praticados pela autoridade ou oficial público respectivo bem como no que respeita aos factos atestados com base nas percepções da entidade documentadora (será o caso das certidões de tempo de serviço emitidas na sequência de exames ou consulta aos documentos existentes em determinado serviço público).
6.Tal força probatória apenas poderá ser ilidida com base na sua falsidade. Também a presunção de autenticidade de que gozam estes documentos poderá ser ilidida mediante prova em contrário.
7.Recusar-se como meio de prova um documento autêntico devidamente legalizado sem se provar a sua falsidade ou falta de autenticidade é esvaziar de conteúdo as precauções que a lei consagra nesta matéria.
8. Não se censura, obviamente, que a Caixa Geral de Aposentações tome as precauções necessárias de modo a evitar a atribuição de pensões de aposentação em casos que não preencham os requisitos legais. Tal cautela não poderá, porém, ser levada tão longe que desvirtue o regime legal da prova e, dessa forma, impeça o legítimo exercício de direitos particulares.
9. Tanto mais que, constituindo os serviços consulares serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, não será impossível à Caixa Geral de Aposentações concluir acerca da autenticidade das assinaturas dos agentes consulares ou dos selos respectivos. Esse e, aliás, o fundamento da própria exigência de legalização dos documentos estrangeiros.
8.Por essa razão, o prejuízo que é imposto aos particulares pela referida decisão dessa Caixa revela-se claramente desproporcionado relativamente aos objectivos a prosseguir, sendo certo que estes poderão ser alcançadas por outra via e sem o sacrifício desajustado dos direitos dos particulares.
10.Não se argumente que tal deliberação encontra a sua justificação legal nos poderes atribuídos à Caixa pelo Decreto-Lei nº 315/88, de 8.9.. Em tal diploma, confere-se à Caixa a competência para apreciar a prova quanto às condições e tempo de serviço prestado pelos interessados na sua contagem para efeitos de aposentação. Para além disso, indicam-se exemplificativamente os “elementos” a apresentar pelos interessados.
Se é verdade que o diploma em questão constitui regime específico relativamente aos artigos 87º e 88º do Estatuto da Aposentação, já dele não é possível inferir qualquer norma que constitua um desvio relativamente ao regime legal da prova constante do Código Civil e Código de Processo Civil e que, desse modo, legitime deliberações administrativas que o desrespeitem.
Em face do exposto, tenho por bem formular a presente RECOMENDAÇÃO no sentido de ser revogada a deliberação desse Conselho supra referida em 3. e, consequentemente, nos processos de atribuição de pensão com base no tempo de serviço prestado na ex-administração ultramarina, serem levadas em conta os documentos autênticos estrangeiros devidamente legalizados, sem prejuízo de, nos casos concretos, se provar a falsidade do documento ou que a legalização não é autêntica.
O PROVEDOR DE JUSTIÇA
JOSE MENERES PIMENTEL