Presidente dos Serviços Municipalizados de Leiria

Rec. nº 59A/94
Proc.:R.827/93
Data:1994-03-21
Área: A 4

ASSUNTO:FUNÇÃO PÚBLICA – CARREIRAS – MOBILIDADE – CONCURSO – ESCALÃO REMUNERATÓRIO – APLICAÇÃO DO art.º 18º DO D.L. nº 353-A/89, DE 16.10.

Sequência:

1. Como é do conhecimento de V. Exª o técnico adjunto de 2ª classe do quadro desses Serviços Municipalizados, … , apresentou-me uma queixa na qual reclama do escalão em que foi integrado ao ingressar naquela categoria, pois que se se tivesse mantido na categoria anterior, estaria hoje posicionado em escalão a que corresponde um índice mais elevado do que aquele em que se encontra.

2. Dos autos resulta a seguinte factologia:

a) De Agosto de 1976 a 14/1/91 possuíu a categoria de técnico auxiliar de 2ª classe;

b) Em 1/10/89, por aplicação do N.S.R. (Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de outubro) foi colocado no escalão 2, índice 170 da categoria de técnico auxiliar de 2ª classe;

c) Na decorrência do primeiro descongelamento determinado pelo Decreto-Lei nº 393/90, de 11 de Dezembro, foi posicionado no escalão 3, índice 180, em 1/7/90;

d) Na sequência do segundo descongelamento Decreto-Lei nº 204/91, de 7 de Junho, foi em 1/1/91, posicionado ao escalão 4, índice 190;

e) Em 14 de Janeiro de 1991, precedendo concurso de ingresso, ingressou na carreira de técnico adjunto, nível 4, na categoria de técnico adjunto de 2ª classe, tendo sido integrado no escalão 1, índice 175;

f) Pelo Decreto-Lei nº 420/91, de 29 de outubro, ao escalão 1 da categoria de técnico adjunto passou a corresponder o índice 190.
Também por força deste mesmo diploma foram revalorizados os escalões da categoria de técnico auxiliar de 2ª classe, passando ao escalão 4 a corresponder o índice 215 e ao escalão 5 (último) o índice 225;

g) Se se tivesse mantido na categoria de técnico auxiliar estaria actualmente (a partir de Outubro de 1992) no 5º escalão, índice 225, por aplicação do Decreto-Lei nº 61/92, de 15 de Abril.

2.1. Em síntese, ingressou numa categoria de nível superior e aufere vencimento substancialmente inferior aquele a que teria direito se se mantivesse na categoria anterior, considerada legalmente de nível inferior (cfr. Decreto-Lei nº 248/85, de 15 de Julho) e para a qual são também exigidas habilitações profissionais inferiores.

3. Ainda que se trate de categoria superior, a situação do reclamante não constitui um caso de promoção do ponto de vista técnico jurídico – esta é a mudança de categoria dentro da mesma carreira. Cfr. artigo 27º do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho – pelo que não pode beneficiar do disposto no artigo 3º do Decreto-Lei nº 204/91 e no artigo 3º, nº 1 do Decreto-Lei nº 61/92.

4. O seu caso constitui uma mudança de carreira, ou seja o abandono de uma carreira seguida de ingresso numa outra pela categoria de base.

4.1. Nos termos do artigo 26º, nº 2 do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho “o ingresso em cada carreira fez-se em regra no primeiro escalão da categoria de base, na sequência de concurso ou de aproveitamento em estãgio probatõrio”.

4.2.Estabelece, pois, este preceito o princípio geral de que qualquer que seja o escalão em que o funcionário se encontra integrado ao ingressar numa outra carreira será sempre colocado no escalão 1 da categoria de base dessa carreira.

A utilização da expressão “em regra” permite deduzir a existência de excepções aquele princípio geral.

4.3. Uma dessa excepções está prevista no artigo 18º do Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 420/91, de 29 de Outubro, referente à mobilidade entre carreiras.

4.4. Da confrontação da redacção inicial do artigo 18º do Decreto-Lei nº 353-A/89 com a redacção que lhe foi atribuída pelo Decreto-Lei nº 420/91, concluiu-se que a mobilidade entre carreiras mediante concurso de ingresso sã passou a estar minimamente regulado após o aditamento do nº 4 pelo último dos diplomas, citados.
Até à entrada em vigor vigorar a regra geral do artigo 26º do Decreto-Lei nº 184/89.

5. Vejamos, pois, se o nº 4 do artigo 18º permite ultrapassar ou pelo menos minimizar a situação de injustiça relativa em que se encontra o reclamante.

6. Esta norma suscita porém diversos problemas, designadamente:

6.1. O de saber se o mesmo nível de habilitações se reporta só às habilitações literárias ou a estas e às profissionais.
Não distinguindo o legislador entre habilitações literárias e outros não é legítimo nem lícito ao interpre fazer aquela distinção.

Assim sendo,as habilitações referidas naquele normativo abracem quer as académicas quer as profissionais.

6.2. Outra questão é a de saber se a expressão “mesmo nível de habilitações” funciona como limite mínimo e máximo, ou seja, uma igualdade de habilitações pura e simples ou se comporta uma outra. Isto é no sentido de que sejam exigidas no mínimo as mesmas habilitações o que permite abarcar pela norma em causa os casos de mudança de carreira para a qual fossem impostas habilitações superiores.

6.2.1. Se o elemento literal favorece uma interpretação meramente declarativa, ou seja, as mesmas habilitações significam iguais habilitações (nem inferiores nem superiores), a “ratio legio” impõe uma interpretação extensiva (correctiva) no sentido atrás exposto.

6.2.2. Efectivamente, com esta disposição pretendeu o legislador evitar que em consequência da mudança de carreira através de concurso de ingresso e por aplicação da regra geral do nº 2 do artigo 26º do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, o funcionário fosse prejudicado, passando a auferir vencimento inferior aquele que já vinha percebendo na categoria de origem.

Este mesmo objectivo está evidenciado no preâmbulo do Decreto-Lei nº 420/91, de 29 de Outubro, em cujos termos, com as alterações introduzidas visou-se corrigir “algumas distorções de ordem pontual, que importa, por isso, alterar conduzindo-as às soluções mais adequadas e justas caso a caso”.

6.2.3. Este desiderato só será alcançado se se fizer do nº 4 do artigo 18º do Decreto-Lei nº 353-A/89, a interpretação extensiva atrás referida. Isto é carreiras para as quais esteja legalmente estabelecido no mínimo o mesmo nível de habilitações.

6.2.4. A favor desta interpretação milita ainda oargumento da maioria de razão.

6.3. A última questão suscitada pelo nº 4 do artigo em referência, reporta-se à sua produção de efeitos. Ou seja, saber se poderão ao abrigo daquele dispositivo ser corrigidas, com efeitos à data da sua entrada em vigor – 1/11/91 – as situações de injustiça e distorção salarial constituídas anteriormente.

6.3.1. Constitui princípio geral do Direito o de que a lei só dispõe para o futuro (cfr. Artigo 12º do Código Civil).

6.3.2. Porém, de acordo com o nº 2, segundo a parte, do mesmo artigo quando a lei “dispuser sobre o conteúdo de certas relações jurídicas abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor”.

A norma em causa encaixa-se naquela 2ª parte do nº 2 do artigo 12º do Código Civil, sendo de aplicar às situações de mobilidade mediante concurso subsistentes à data da sua entrada em vigor, corrigindo-as de acordo com as regras do nº 2 do mesmo artigo 18º a partir da data da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 420/91.

7. Aplicando o atrás exposto ao caso do reclamante poderá a sua situação ser corrigida, com efeitos a partir de 1/11/91. Isto é por aplicação daquela norma o ora reclamante será posicionado no escalão 4, índice 225 da categoria de técnico adjunto de 2ª classe.

8. Face a tudo o que antecede e ao abrigo da alínea a) do artigo 20º da Lei nº 9/91, de 9 de Abril, RECOMENDO a V. Exª a correcção da situação remuneratõria do Sr. …. nos termos referidos no antecedente ponto 7.

0 PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL