Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais
Número: 129/A/95
Processo: R-1787/91
Data: 08.11.1995
Área: A2
ASSUNTO: CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS – CONTRIBUIÇÃO AUTÁRQUICA – COBRANÇA INDEVIDA – JUROS.
Sequência: Não Acatada
Trago junto de Vossa Excelência um assunto que, não obstante a sua simplicidade, se encontra pendente de resolução há já algum tempo e que resumirei de seguida:
Através do ofício nº …, de 2 de Abril de 1993, desta Provedoria, dirigi ao Exmº Senhor Director do então Núcleo dos Impostos sobre o Rendimento, a Recomendação cuja fotocópia anexo (doc. nº 1) e para cujo teor me permito remeter.
Em resposta àquela Recomendação, viria a ser enviado a este órgão do Estado o ofício nº …, de 1 de Julho de 1993, da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, sobre o qual Sua Excelência o Subsecretário de Estado Adjunto da Secretaria de Estado Adjunta e do Orçamento exarou despacho de concordância.
Do teor daquele ofício, assim como da informação que o acompanhou, datada de 26 de Abril de 1993, resulta terem sido dois os motivos pelos quais a Recomendação em causa não foi acatada: por um lado, porque “o Código da Contribuição Autárquica não contém disposição que contemple o pagamento de juros indemnizatórios, em caso de anulação oficiosa” (ofício nº … , de 1 de Julho, supra citado). Por outro lado, porque “como a restituição resultou da anulação oficiosa da liquidação, o pagamento de juros indemnizatórios não é enquadrável no disposto no artigo 24º do Código de Processo Tributário…” (informação da DGCI, de 26 de Abril de 1993).
A referência feita na resposta à minha Recomendação a uma anulação oficiosa da Contribuição Autárquica indevidamente paga contrariava a afirmação do Reclamante que alegara ter exposto o seu caso à administração fiscal – disso fazendo, aliás, prova – dirigindo-se à Direcção Distrital de Finanças do Porto e procurando, aí, apurar os motivos pelos quais havia sido notificado para pagar Contribuição Autárquica referente a 1990, ano em que ainda deveria beneficiar de isenção.
Entendeu-se, pois, conveniente ouvir os serviços locais da administração fiscal, a fim de, com a maior celeridade possível, apurar os exactos termos em que foi ordenada a restituição da Contribuição Autárquica referente ao ano de 1990.
Aos esclarecimentos solicitados foi enviada a resposta constante do ofício nº 9042, de 23 de Outubro último, da 1ª Repartição de Finanças de Matosinhos, que se anexa (doc. nº 2).
Esclarecida a situação fáctica e reapreciada a pretensão do Reclamante – no sentido de lhe serem pagos juros indemnizatórios, dada a imputabilidade aos serviços da administração fiscal do erro que levou ao envio da nota de cobrança de Contribuição Autárquica de 1990 -, não posso deixar de concluir que tal pretensão é totalmente procedente, ao contrário do que sucede com os argumentos invocados para justificar o não acatamento da minha Recomendação de 2 de Abril de 1993.
Quanto ao primeiro dos fundamentos da decisão de não acatamento – inexistência, no Código da Contribuição Autárquica, de disposição que preveja o pagamento de juros indemnizatórios em casos de anulação oficiosa – diga-se, desde logo, que assim não acontece por desnecessário.
Efectivamente, desde a entrada em vigor do Código de Processo Tributário que o direito a juros indemnizatórios foi erigido em garantia dos contribuintes (cfr. artigo 19º, alínea d) e artigo 24º do referido Código). Acresce que, mesmo antes da entrada em vigor daquele diploma, já o Código da Contribuição Autárquica continha, por remissão, a consagração do referido direito a juros, conforme resulta das disposições conjugadas dos artigos 34º do Código da Contribuição Autárquica e 86º do Código do IRS.
Quanto ao segundo dos fundamentos invocados para justificar o não acatamento da referida Recomendação – o facto de o artigo 24º do Código de Processo Tributário não prever o pagamento de juros em casos de anulação oficiosa – dir-se-á que a afirmação, embora correcta em abstracto, não é aplicável ao caso em apreço, sob pena de consubstanciar um “venire contra factum proprium” que, estou certo, a administração fiscal não pretenderá.
Ou seja: dos factos apurados resulta clara qual a sequência dos actos que levaram à restituição da Contribuição Autárquica cuja cobrança foi indevidamente efectuada: após ter recebido a respectiva nota de cobrança, o contribuinte manifestou a sua estranheza pelo facto junto da Direcção Distrital de Finanças do Porto que, através do ofício nº … , de 15 de Maio de 1991, o aconselhou a dirigir-se à 1ª Repartição de Finanças de Matosinhos para esclarecimento da situação tributária do prédio em causa.
Foi junto desta Repartição que o interessado viria a “reclamar verbalmente” – v. doc. nº 2, anexo – na sequência do que veio a ser reapreciada a liquidação efectuada, concluindo-se pela sua incorrecção e consequente anulação.
Assim sendo, como foi, não pode a administração fiscal invocar, agora, para se subtrair à aplicação do artigo 24º do Código de Processo Tributário, uma anulação “oficiosa” que com a verdadeira anulação oficiosa só tem em comum a inexistência de organização prévia de processo de reclamação graciosa.
Ora, tal processo só não foi instaurado porque nem a Direcção Distrital de Finanças do Porto enviou a exposição do Reclamante à Repartição de Finanças para efeitos de conversão em reclamação graciosa e organização do competente processo, nem a Repartição de Finanças, quando o Reclamante aí “reclamou verbalmente” o informou da necessidade ou das vantagens da redução a escrito da sua reclamação.
Legítimo é, pois, concluir que, caso alguma destas duas atitudes correctas houvesse sido tomada pela administração fiscal, estariam reunidos actualmente todos os requisitos exigidos pelo artigo 24º do Código de Processo Tributário para o pagamento de juros ao contribuinte.
Nem se alegue, tão-pouco, inexistência de erro imputável aos serviços com o argumento de que a isenção referente ao ano de 1990 decorreu da alteração introduzida ao artigo 10º, nº 1, alínea b), do Código da Contribuição Autárquica pelo Decreto-Lei nº 211/90, de 27 de Junho (v. doc. nº 2). É que o erro imputável aos serviços cuja existência não pode ser posta em causa consistiu no envio, já durante o ano de 1991, de uma nota de cobrança de Contribuição Autárquica que já há quase um ano se sabia não ser devida por força da citada alteração legislativa.
Pelo exposto,
RECOMENDO
1. Que sejam liquidados e pagos ao Reclamante os juros indemnizatórios que se mostrarem devidos nos termos do artigo 24º do Código de Processo Tributário, provada que está a imputabilidade aos serviços da administração fiscal do erro que esteve na origem do pagamento indevido da Contribuição Autárquica referente ao ano de 1990.
2. Que a inexistência de processo de reclamação graciosa ou de impugnação judicial no âmbito do qual tal imputabilidade do erro aos serviços seja reconhecida não impeça o pagamento dos referidos juros, atendendo a que só as deficientes actuações da Direcção Distrital de Finanças do Porto e da 1ª Repartição de Finanças de Matosinhos motivaram a não instauração de processo de reclamação graciosa, sendo que, porém, é inegável ter sido o Reclamante a desencadear o processo que levou à restituição do montante indevidamente cobrado.
Nos termos do disposto no artigo 38º, nº 2, da Lei nº 9/91, de 9 de Abril, deverá V. Exª comunicar-me o acatamento desta Recomendação ou, porventura, o fundamento detalhado do seu não acatamento, no prazo de sessenta dias.
O PROVEDOR DE JUSTIÇA
JOSÉ MENÉRES PIMENTEL