Comandante-Geral da Polícia de Segurança Pública

Rec. nº 141/A/94
Proc.:R-1046/94
Data: 1994-09-14
Área: A3

ASSUNTO: SEGURANÇA SOCIAL – APOSENTADOS DA PSP – ASSISTÊNCIA MEDICAMENTOSA – CARTÃO DE BENEFICIÁRIO

Sequência: Acatada

1. O Sr. J. …, guarda aposentado da PSP dirigiu-me uma exposição, invocando ter-lhe sido negada pelos Serviços de Assistência na Doença ao Pessoal da PSP a comparticipação integral no preço dos medicamentos, direito que lhe assiste em virtude da sua qualidade de guarda aposentado.

2. Analisada a questão à luz do direito vigente, foi possível concluir que a situação se traduz, juridicamente, no seguinte:

2.1. Respondendo à necessidade de verter em diploma legislativo o regime de assistência na doença do pessoal da PSP, GNR e Guarda Fiscal – até aí consagrado apenas em normas administrativas – o Decreto-Lei nº 357/77, de 31.8 procurou equiparar tal regime aos esquemas congéneres vigentes nas Forças Armadas, nas instituições de Previdência e para os servidores civis do Estado.

2.2. Delimitando os conceitos de beneficiário da assistência sanitária e das modalidades que esta compreende, tal diploma devolve para regulamento a aprovar por portaria conjunta dos Ministros da Administração Interna e das Finanças a definição das sub-modalidades de assistência e respectiva amplitude, bem como as condições de prestação de assistência medicamentosa e o valor da comparticipação do Estado (art. 2º, nº 2 e art. 3º nº 2).

2.3. A Portaria nº 555/78, de 15.9., que aprovou o Regulamento da Assistência na Doença ao Pessoal da GNR, Guarda Fiscal e PSP, remete, por sua vez, para despacho conjunto dos mencionados Ministros a fixação das tabelas de comparticipação bem como “os pormenores inerentes à prestação das diversas modalidades de assistência” (Capítulo V, ns. 17 e 18).

2.4. A solução então preconizada pelos ministros da Administração Interna e das Finanças para resolver a questão foi a de, no Despacho Normativo nº 83/83, de 9.4., dispôr que as tabelas de comparticipação nas diversas modalidades de assistência serão as aplicáveis aos três ramos das Forças Armadas.

2.5. A tabela de comparticipação de assistência na doença aplicável aos militares a partir do final de 1992, aprovada pelo Despacho 115/MDN/92 (D.R. II Série, de 20.10.92) contém, no ponto 2.1.4., a seguinte disposição: “Os militares reformados e familiares deles dependentes serão comparticipados em 100% nos produtos medicamentosos adquiridos em farmácias militares ou civis”, sendo a comparticipação, nos restantes casos, de 75%.

2.6. Ora, perante tal quadro legal e visando, certamente, a adaptação do regime descrito às condições específicas do pessoal da PSP, proferiu V.Exa, em 8 de Abril de 1993, o Despacho nº 13/93, mediante o qual restringiu a norma referida no número anterior aos aposentados da PSP que tenham atingido o limite legal de idade para o exercício de funções e respectivos familiares e excluiu expressamente os beneficiários cuja aposentação tenha resultado da aplicação de sanção criminal ou disciplinar.

3. A descrição do regime legal aplicável à situação sub-judice impõe a conclusão da invalidade do Despacho ns 13/93, de 8 de Abril.

3.1. Invalidade que resulta, em primeiro lugar, da incompetência do Comandante-Geral da Polícia de Segurança Pública para proferir normas regulamentares sobre aquela matéria: inexiste, na verdade, neste caso, uma “lei de habilitação” que lhe atribua poderes para regulamentar a assistência na doença ao pessoal da PSP, como ficou demonstrado.

4. Invalidade que decorre, em segundo lugar, do desrespeito pelo conteúdo de um regulamento emanado de um orgão hierarquicamente superior.

4.1. Ao estabelecer, para os aposentados da PSP, um regime de comparticipação medicamentosa diverso do estipulado em Despacho Normativo dos Ministros da Administração Interna e das Finanças – sem que aí se atribua competência para tanto – está o despacho em análise a inobservar um dos limites ao poder regulamentar que o Prof. Freitas do Amaral descreve do seguinte modo (in Direito Administrativo, III, 1989, p. 47):
“Constitui também limite ao poder regulamentar a disciplina jurídica constante dos regulamentos editados por orgãos que hierarquicamente se situam num plano superior ao do orgão que editou o regulamento considerado (…)”.

4.2. Em sentido idêntico se pronuncia o Prof. Afonso Queiró (in Lições de Direito Administrativo, I, 1976, p. 439):

“( …) Este princípio encontra-se hoje expresso no art. 242º da Constituição com referência apenas aos regulamentos das autarquias locais mas deve considerar-se extensivo aos regulamentos de todo e qualquer outro tipo de entes públicos”.

5. Não merece acolhimento o entendimento, perfilhado por esse Comando-Geral, de que não há qualquer equiparação entre a assistência medicamentosa do pessoal da PSP e o das Forças Armadas, uma vez que tal paridade apenas existe quanto à assistência sanitária, modalidade diversa daquela.

6. A descrição supra do regime legal aplicável deixa clara, a meu ver, a incorrecção deste entendimento. De todo o modo, e se algumas dúvidas susbistirem, basta ter em conta o teor do nº 8 do Capítulo III da Portaria nº 555/78, de 15.9:
“A assistência sanitária a prestar ao pessoal da Guarda Nacional Republicana, Guarda Fiscal e Polícia de Segurança Pública e seus familiares, acima indicados, abrange as seguintes submodalidades:

a) Assistência médica e cirúrgica, que compreende: (…);
b) Assistência materno-infantil, que inclui: (…)
c) Enfermagem: (…)
d) Assistência medicamentosa.”

Atente-se, ainda, na redacção do art. 1º e 2º do Decreto-Lei nº 357/77, de 31.8.

7. Ainda que se considere justa e necessária a fixação de regras particulares para a assistência medicamentosa do pessoal da PSP e, nomeadamente, no que respeita aos aposentados – consideradas as eventuais especificidades que se registam neste domínio relativamente ao pessoal das Forças Armadas – forçoso é que tais regras constem de diploma com força normativa idêntica ao Despacho Normativo que impôs a equiparação de regimes.

8. Atento o acima exposto, não me é permitida outra conclusão que não seja a da procedência da pretensão do reclamante. Sem dúvida que, em face do regime jurídico aplicável à situação sub-judice, o pessoal aposentado da PSP beneficia do regime de comparticipação nos medicamentos em vigor para os três ramos das Forças Armadas.

9. Assim sendo, tenho por bem

RECOMENDAR

a V.Exa:

a) a revogação do Despacho nº 13/93, de 8 de Abril, dando-se cumprimento ao Despacho Normativo nº 83/83, de 9 de Abril e,

b) consequentemente – e enquanto outras normas de força normativa pelo menos idêntica não forem proferidas – a atribuição ao guarda aposentado J. … e demais aposentados da PSP (ainda que não tenham atingido o limite de idade legal para o exercício de funções) o cartão de beneficiário da assistência na doença com a menção de “aposentado”, que lhes permita usufruir de uma comparticipação integral no preço dos medicamentos.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel