Gestor do Programa Pessoa
R-751/96
N.º 65/A/99
1999.07.29
Área :A2
Assunto: TRABALHO- SECTOR PRIVADO – FUNDO SOCIAL EUROPEU – FORMAÇÃO – APOIOS COMUNITÁRIOS – SUPRESSÃO INDEVIDA – REVOGAÇÃO DO DESPACHO – PAGAMENTO DE APOIOS.
1. Recebi uma reclamação da empresa…, contestando uma situação que, instruído o respectivo processo, suscita a minha intervenção junto de V. Exª..
Dos factos
2. Em 29/11/91, a reclamante apresentou uma candidatura a apoios do Fundo Social Europeu, para efeitos de promoção de formação profissional.
3. Em 13/4/92, é exarado despacho de homologação da referida candidatura no Programa Operacional nº 01 (formulários B – 1,2,3,4 e B -5,6). A reclamante é notificada do mencionado despacho em 16/5/92. Era aí expressamente comunicado que, havendo dívidas à Segurança Social, “os pagamentos relativos à comparticipação pública nacional ficariam sujeitos a uma retenção até 25%, como tal prevista no artº 17º do DL nº 103/80, na redacção que lhe foi dada pelo artº 1º, do DL nº 52/88”.
4. Os cursos tiveram início em 15/7/92 e, em 31/8/92, a reclamante remeteu, nos termos legais, declaração do Centro Regional de Segurança Social, datada de Junho, certificando a existência de dívidas à Segurança Social. Através de ofício nº …, o Centro Regional de Segurança Social, informava, porém, que as dívidas teriam tido início em Dezembro de 1991 – no mês seguinte à candidatura, portanto.
5. Em 4/1/93, a reclamante é notificada, no âmbito do dever de audição prévia, da impossibilidade de beneficiar de apoios no âmbito dos fundos comunitários, nos termos do artº 15º, alínea e), do Decreto-Lei nº 411/91. Em 28/9/93, o Exmº Delegado Regional do Norte do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) exara despacho de supressão do apoio concedido.
6. Entretanto, em 25/2/93, fora exarado despacho por parte de Sua Excelência o Secretário de Estado da Segurança Social autorizando a regularização da situação contributiva da reclamante, havendo, por outro lado, transitado em julgado em 27/3/93 a sentença homologatória do processo de recuperação da empresa.
7. Em 28/6/94, a reclamante recorre do despacho do Exmº Delegado da Região Norte do IEFP, datado de 28/9/93, para Sua Excelência o Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional, requerendo a sua revogação oficiosa. Recebeu, então, da Comissão Executiva do IEFP, datada de 17/8/94, confirmação daquele despacho.
8. Com data de 3/2/95, e na sequência da exposição feita pela reclamante, surge despacho de Sua Excelência o Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional, o qual revoga o despacho do Exmº Delegado da Região Norte do IEFP.
9. Apesar de, por várias vezes, ter insistido no cumprimento deste despacho, só em 14/5/99 a reclamante é notificada do projecto de decisão do Exmº Delegado da Região Norte do IEFP de 20/3/99, que, aliás em termos parcamente fundamentados pelo parecer do Director de Serviços em que é exarado, propõe, de novo, a não atribuição dos apoios inicialmente concedidos à reclamante.
10. Permita-me V. Exª que considere esta situação inaceitável, não só por razões estritamente formais, que se prendem com os procedimentos administrativos que tiveram lugar, mas igualmente por razões de aplicação do direito material ao caso concreto.
Do Direito Aplicável
11. Dos factos supra descritos resulta inequívoco que, à data da candidatura, a reclamante não tinha dívidas para com a Segurança Social. Reunia, consequentemente, as condições exigidas pelo artº 7º do Despacho Normativo nº 68/91, de 25/3, para efeitos de aceder aos apoios a que se candidatava.
12. Efectivamente, dispunha aquela norma que a entidade que pretendesse um financiamento deveria reunir, à data da apresentação da candidatura, o requisito de não ser devedora, ou estar a cumprir um plano de regularização de dívidas, nomeadamente, à Segurança Social.
13. Uma vez entregue a candidatura sem que a entidade promotora tivesse qualquer dívida para com a Segurança Social, como é o caso, o legislador apenas se preocupava com a situação contributiva da entidade promotora perante a Segurança Social no momento seguinte, a saber, o do pagamento. E esse pagamento (sob a forma de primeiro adiantamento) havia de situar-se no momento do início dos cursos, uma vez que, nos termos do artº 14º do Despacho Normativo nº 61/88, na redacção que lhe foi conferida pelo Despacho Normativo nº 194/91, de 5/9, era este facto que conferia o direito ao recebimento do primeiro adiantamento.
14. Ora, se é certo que, à data do início dos cursos, a reclamante não tinha ainda a situação contributiva regularizada, certo é, também, não existir, nesta data, qualquer disposição normativa que determinasse a impossibilidade de os promotores, na circunstância de terem nesse momento dívidas à Segurança Social, receberem os apoios e que, de algum modo, justificasse a supressão dos apoios com que a reclamante veio a ser confrontada.
15. Se não, vejamos. Determinava, à data, o artº 3º do Despacho Normativo nº 257/91, de 11/11:
“1. Para efeitos de pagamento relativo à contribuição pública nacional, deve a entidade remeter, à entidade gestora, certidão sobre a sua situação contributiva perante a segurança social.”
e ainda:
“2. Quando a entidade gestora verifique, nos termos do número anterior, que a entidade promotora não tem a situação contributiva regularizada perante a Segurança Social, deverá comunicar tal facto ao DAFSE, para cumprimento do disposto no artº 17º, do DL nº 103/80, de 9 de Maio, na redacção dada pelo artº 1º do DL nº 52/88, de 19 de Fevereiro”.
16. E dispunha a nova redacção do artº 17º do Decreto-Lei nº 103/80 que, em qualquer pagamento superior a 300 000$00, os serviços deveriam reter até 25% da quantia a entregar.
17. Não haveria já aí qualquer dúvida de que, mesmo no caso de a entidade promotora ter dívidas à Segurança Social no momento do pagamento, não deveria ter lugar a supressão dos apoios e que, ao invés, os pagamentos deveriam ser efectuados apenas com retenção do valor correspondente a 25% da quantia a entregar.
18. E isto é assim mesmo que – dado que o momento a que nos devemos ater é o momento do pagamento – se considere como aplicável o Decreto-Lei nº 411/91, de 7/10, e não aquele de que, à data da aprovação da candidatura, foi dada nota à reclamante.
19. É que, também neste caso, é inequívoco que o regime legal de atribuição dos apoios em função da existência ou não de dívidas à Segurança Social não vai, de modo algum, no sentido da supressão dos apoios.
20. É verdade que a alínea e) do artº 15º do Decreto-Lei nº 411/91 determina não poderem beneficiar de apoio dos fundos comunitários as empresas que não tenham a sua situação contributiva regularizada perante a Segurança Social.
21. Mas esta disposição não pode deixar de corresponder àquela que, antes da entrada em vigor deste diploma – e até porque este surgiu para efeitos de uniformização do regime jurídico das dívidas à Segurança Social (vide preâmbulo) -, não permitia a existência de dívidas à Segurança Social se reportadas ao momento da candidatura.
22. E tanto assim é que o legislador não se abstém de regular, no seu artº 11º, o momento em que deve ter lugar o pagamento em caso de existência de dívidas à Segurança Social. E não o faria (ou teria o cuidado de excluir expressamente essa hipótese) se não considerasse a possibilidade de existência de entidades que, tendo visto a sua candidatura aprovada, por não terem dívidas à Segurança Social à data da sua apresentação ou terem já nesse momento a sua situação contributiva regularizada, se viam, no momento do pagamento, em situação de irregularidade contributiva perante a Segurança Social.
23. E o pagamento em caso de existência de dívidas à Segurança Social regula-o o legislador, também neste quadro normativo, como no anterior, não no sentido de qualquer supressão de apoios, mas tão-somente no sentido de esse pagamento ser efectuado com a mesma retenção de 25%, ainda que, agora, do total concedido.
24. Aliás, a supressão dos apoios como a que veio a ter lugar é de todo contrária, não só ao espírito do regime legal então em vigor, como até mesmo do regime correspondente ao Quadro Comunitário de Apoio seguinte (Decreto-Lei nº 115/94, de 6/7), no qual o legislador pretendeu, nitidamente, ser bastante mais penalizante para os promotores que não tivessem, pelo menos, a sua situação contributiva regularizada.
25. É que, mesmo neste novo quadro legislativo, em que o legislador prevê a possibilidade de não serem efectuados quaisquer pagamentos enquanto o promotor não demonstre ter a sua situação contributiva regularizada, se admite, por um lado, a possibilidade de terem lugar os pagamentos a partir do momento em que for demonstrado já ter havido regularização e, por outro, que o apoio só seja suprimido quando se verifique que a situação devedora da entidade poria em causa a realização da formação.
26. Há, consequentemente, da parte do legislador um cuidado com as expectativas dos formandos e da formação empreendida pela entidade promotora, que, se expressa em diplomas posteriores, não deixa de resultar inequívoca do regime jurídico aplicável à reclamante.
27. Tudo visto, retira-se do regime aplicável à situação em apreço (e quer nos reportemos à legislação aplicável no momento da candidatura, quer à aplicável à data do que deveria ser o primeiro adiantamento) que existem dois momentos relevantes no que respeita à regularização da situação contributiva:
– o momento da apresentação da candidatura, sendo que quem não reúne os requisitos de situação contributiva regularizada a essa data não pode ver homologada a candidatura;
– o momento do pagamento, em que, tendo já sido aprovadas as candidaturas com demonstração de situação contributiva regularizada, poderia ser, apenas, retido 25% do montante a pagar, na circunstância de entretanto terem passado a existir dívidas à Segurança Social.
28. Assim, sendo certo que o quadro legal existente à data impunha o pagamento, apenas com retenção de 25% do total concedido, e que, por outro lado, a reclamante veio a regularizar a situação contributiva – entendido isto nos termos e para os efeitos do Decreto-Lei nº 411/91, de 17/10, uma vez que, não só fora exarado despacho de autorização de regularização da dívida que a reclamante veio a cumprir, como ainda houve sentença homologatória do processo de recuperação de empresas, em 27/5/93 -, concluo, como certamente V. Exª concordará, que não existia à data da supressão dos apoios base legal para essa supressão.
29. Mais se conclui que, neste momento, e com a sua situação contributiva perante a Segurança Social absolutamente regularizada, a reclamante reúne todas as condições para que lhe sejam pagos os apoios inicialmente devidos.
Procedimentos Administrativos
30. Não obstante o incontornável quadro legal descrito, a reclamante veio a ser confrontada com o que não posso deixar de considerar uma inaceitável situação de denegação de atribuição dos apoios que lhe haviam sido concedidos à data da homologação da candidatura.
31. O despacho de supressão do apoio comunitário exarado pelo Exmº Delegado da Região Norte do IEFP era, pelas razões expostas, um despacho contra legem, uma vez que não existia, à data em que deveria ter lugar o pagamento, qualquer disposição legal que justificasse a supressão dos apoios inicialmente concedidos.
32. Tal despacho ilegal veio a ser objecto de revogação oficiosa, por despacho datado de 3/2/95, exarado por Sua Excelência o Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional.
33. No entanto, e por razões que não são compreensíveis, não foi dado cumprimento a este despacho. E isto apesar de, como muito bem refere o Parecer de 25/10/96, que recebeu despacho homologatório da então Ministra para a Qualificação e o Emprego, de 2/7/97, aquele despacho, quer fosse válido (como entendo que seria, uma vez que a sua parte dispositiva era bem clara no sentido da revogação do despacho de supressão dos apoios) ou inválido, ter claramente como objectivo a revogação do anterior despacho, com as consequências daí decorrentes, e se haver convalidado na ordem jurídica pelo decurso do tempo.
34. Na sequência daquele mesmo despacho surgiu, com data de 24/2/99, um despacho do Exmº Delegado da Região Norte do IEFP, exarado sobre um parecer emanado da Direcção de Serviços daquela Delegação, que, ao invés do que seria de esperar perante as vicissitudes sofridas pelo processo, não releva de um mais aprofundado estudo do direito aplicável, levando a que seja proposta a supressão daquele apoios apenas “tendo em conta as razões que levaram à supressão do apoio financeiro concedido à empresa….
35. Permitirá, assim, V. Exª que, pelas razões de direito que me abstenho de repetir porque já de sobremaneira explicitadas, entenda não dever recair despacho homologatório sobre esta proposta de decisão do Exmº Delegado Regional do Norte do IEFP, uma vez que o mesmo seria ilegal, nos termos referidos, tal como o era, aliás, já o despacho de 28/9/93, que conduziu à supressão dos apoios à empresa ora reclamante.
36. E tanto mais ilegal quanto é certo que a reclamante tem a sua situação contributiva regularizada desde 25/2/93, havendo mesmo sentença homologatória do processo de recuperação de empresas.
Assim, nos termos do artº 20º, nº 1, alínea a), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril,
RECOMENDO
Que sejam pagos à reclamante os apoios que, no âmbito do Programa Operacional nº …, cofinanciado pelo Fundo Social Europeu, lhe foram concedidos em 13/4/92 por despacho de Sua Excelência o Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional, não devendo ser, consequentemente, homologada pelo Gestor do Programa Pessoa a proposta de decisão da Delegação Regional do Norte do IEFP, datada de 24/2/99, no sentido da supressão dos mesmos apoios, em virtude de tal proposta de decisão não ser conforme ao regime legal aplicável ao caso, nomeadamente às disposições conjugadas dos artºs 11º e 15º do Decreto-Lei nº 411/91, de 17/10.
O PROVEDOR DE JUSTIÇA
José Menéres Pimentel