Presidente do Conselho de Administração do Hospital de Santa Maria

Rec.nº 116A/95
Proc.:R-1091/95
Área: A 2
Data:1995-10-16

Assunto:CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS – PAGAMENTO DE DÍVIDA – JUROS DE MORA.

Sequência:

I – DOS FACTOS

A empresa …., dirigiu, em 27.04.1995, queixa a este órgão do Estado alegando que em 15 de Março de 1994, havia enviado ao Hospital de Santa Maria a factura nº…, no montante de 103.104$00, relativa a um fornecimento que lhe havia sido solicitado através da encomenda nº 3/0163, de 21.02.1994, sem que até à data da apresentação da
queixa tivesse sido efectuada a correspondente liquidação.
Tendo sido V. Exa. instado a justificar a demora no pagamento, informou que o mesmo se tinha efectuado em 19 de Abril de 1995.
Todavia, não se tendo dado o reclamante por satisfeito com o pagamento, em singelo, da quantia em dívida, já que entendia serem-lhe devidos juros, à taxa legal, a contar da data em que se iniciou o incumprimento, e transmitido que foi, tal entendimento à entidade visada, pronunciou-se V. Exa. no sentido de “que não existirá, no caso, obrigação de pagamento de juros
de mora porquanto, tendo o atraso no pagamento de que se trata, como se disse, por causa remota o subfinanciamento crónico dos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde – situação que está fora do alcance dos hospitais solucionar – não pode tal atraso ser imputável ao Hospital de Santa Maria”.

II – DOS FUNDAMENTOS

Dispõem o art. 804°, n° 1 do art. 805° e nos 1 e 2 do art. 806°, todos do Código Civil que:

Art. 804°
1. A simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor.
2. O devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido.

Art. 805°
1. O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.
2. (…)
a) (…)
b) (…)
c) (…)
3. (…)

Art. 806°

1. Na obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora.
2. Os juros devidos são os juros legais, salvo se antes da mora for devido um juro mais elevado ou as partes houverem estipulado um juro moratório diferente do legal.
3. (…)

Como se vê, a mora pressupõe a existência de um simples retardamento na prestação (cujo cumprimento mantém-se, no entanto, possível), por culpa do devedor.

Mas para que haja mora, é ainda necessário que a prestação seja certa – determinada – líquida – por já estar perfeitamente apurado/fixado o seu montante – e exigível (v.g. por já ter sido o devedor interpelado para o cumprimento).

A responsabilidade do devedor pelos danos causados pela mora só fica excluída se este provar que a mesma não lhe é imputável – emergente de causa estranha à sua vontade (caso de força maior), culpa do terceiro ou do próprio credor.

O credor terá assim direito à prestação devida, acrescida da indemnização moratória que, regra geral, coincidirá com o montante de juros, à taxa legal, contados do momento da constituição em mora e até efectivo e integral pagamento.

Reportando-me agora ao caso em apreço, parece-me que a partir do momento em que foi o H.S.M. interpelado para cumprir (através do envio da respectiva factura), ficaram preenchidos todos os requisitos constitutivos da mora, dando-se, então, o seu início – obrigação certa, exigível e líquida, sendo o retardamento da prestação imputável ao devedor.

É que, não se vislumbra que seja “o subfinanciamento crónico dos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde” motivo passível de justificar o facto de ter esse hospital demorado mais de um ano para proceder à liquidação da sua dívida sendo certo que, atenta a sua natureza jurídica e os fins que prossegue, entendo que lhe cabe um dever acrescido de uso de toda a diligência e de todos os recursos ao seu alcance por
forma a cumprir pontualmente as obrigações que assumiu.

III – CONCLUSÕES

São estas motivações, Senhor Presidente do Conselho de Administração do Hospital de Santa Maria, que me aconselham dever recomendar a V. Exa. (ao abrigo do disposto no art. 20°, n° 1 al. a) da Lei n° 9/91, de 9 de Abril), que:

– seja efectuado o pagamento ao reclamante dos juros à taxa legal, calculados sobre a quantia de 103.104$00, e contados desde a data em que foi o Hospital interpelado para o pagamento através da respectiva factura, e até efectivo e integral pagamento.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTELl