RECOMENDAÇÃO N.º 15/A/2001
(Artigo 20º, nº 1, alínea a), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril)


Entidade visada: Director-Geral dos Impostos
Nossa Ref.ª – Proc.º: R-5184/98 e apensos
Data: 2001/10/04
Área: A2


Assunto: IRS. Suspensão de reembolsos na pendência de acções de fiscalização. Pagamento de juros aos contribuintes.


 


I – Objecto das queixas


Encontram-se pendentes na Provedoria de Justiça vários processos abertos com base em queixas de cidadãos que alegam morosidade na definição da sua situação tributária em sede de IRS relativamente a anos em que as suas declarações de rendimentos foram objecto de acções de fiscalização, situação agravada pelo facto de os respectivos reembolsos, quando finalmente são processados, após correcção de alguns dos elementos por si inscritos nas respectivas declarações de rendimentos, não serem acompanhados dos juros indemnizatórios previstos no artigo 16º, n.º 2, do Decreto-Lei nº 42/91, de 22 de Janeiro, 96º do Código do IRS (CIRS) e 43º, nº 3, alínea a), da Lei Geral Tributária (LGT).


Ao longo da instrução destes processos, foram solicitados esclarecimentos detalhados junto das Direcções de Finanças das áreas de residência dos Reclamantes e junto da Direcção de Serviços do IRS (DSIRS), com o objectivo de, respectivamente, acompanhar a evolução de cada caso concreto e conhecer a posição da Direcção-Geral dos Impostos (DGCI) sobre a questão.


As diligências assim realizadas permitiram confirmar que, nos casos em que foram efectuadas correcções aos elementos declarados pelos contribuintes, com as subsequentes liquidações das declarações rectificativas e emissão de reembolsos, o respectivo pagamento não foi acompanhado do pagamento dos juros indemnizatórios a que se referem as disposições legais supra mencionadas.


Note-se, ainda, para finalizar este breve enquadramento da questão, que o não pagamento de juros se verifica, quer nos casos em que os elementos inicialmente declarados pelos sujeitos passivos são alterados nos termos previstos no artigo 65º, nº 4, do Código do IRS (revisto pelo Decreto-Lei nº 198/2001, de 3 de Julho), quer naqueles casos em que, sendo os contribuintes notificados de que é intenção da DGCI proceder a tal alteração, lhes é dada a possibilidade de, antes do início do processo de alterações, apresentarem declaração de substituição que produza o mesmo efeito, isto é, da qual constem as correcções que a DGCI entende deverem ser feitas, sendo esta declaração de substituição utilizada como documento de correcção para a realização da liquidação do imposto nos termos que a DGCI considera exactos.


Questão também objecto de queixas frequentes é a alegada ausência de informação aos contribuintes quanto às consequências da entrega de tais declarações de substituição – nomeadamente das coimas a pagar – questão à qual farei referência mais adiante.


II – Fundamentos da tese até agora perfilhada pela Direcção-Geral dos Impostos


A decisão de não pagamento de juros nos casos acima descritos é fundamentada, pela DSIRS, do seguinte modo: atendendo a que as alterações e correcções efectuadas se revelam necessárias por força de erros praticados pelos contribuintes no preenchimento das respectivas declarações, o facto de os reembolsos serem emitidos para além da data limite prevista no nº 1 do artigo 16º do Decreto-Lei nº 42/91, de 22 de Janeiro, não é imputável à administração tributária mas antes aos próprios contribuintes. Assim sendo, e ainda segundo a DSIRS, não está preenchido o requisito constante da 1ª parte, do nº 2, do mesmo artigo 16º (que o motivo do atraso seja imputável aos serviços), pelo que não há lugar, nestes casos, ao pagamento de juros.


Questionada a DSIRS sobre a possibilidade de a ordem das operações ser alterada, isto é, liquidando-se em primeiro lugar o imposto com base nas declarações apresentadas pelos contribuintes e só depois procedendo às correcções necessárias, efectuando-se subsequentemente uma liquidação correctiva da primeira e notificando os sujeitos passivos para repor, sendo caso disso, imposto recebido em excesso, esclareceu aquela Direcção de Serviços que “caso as correcções se operem após a liquidação da declaração apresentada pelos sujeitos passivos, são devidos juros compensatórios sobre os montantes pagos a mais e desde o recebimento do reembolso indevido até à data do suprimento ou correcção da falta.”


Quanto a esta última afirmação não se levantam quaisquer dúvidas: se se constatar que determinado sujeito passivo recebeu reembolso superior ao devido, e que tal sucedeu por facto a si imputável, a reposição do excesso indevidamente recebido deve ser acompanhada do pagamento de juros ao Estado, nos termos previstos nos artigos 91º, nº 2, do Código do IRS, revisto pelo Decreto-Lei nº 198/2001, de 3 de Julho, e 35º, nºs 2, 5, 7 e 10, da LGT.


Já quanto à interpretação e aplicação da norma constante do artigo 16º, nº 2, do Decreto-Lei nº 42/91, de 22 de Janeiro, não posso concordar com o entendimento da DSIRS, pelos motivos que procurarei sumariar seguidamente.


III – A interpretação da expressão “motivos imputáveis aos serviços” enquanto requisito para o pagamento de juros ao contribuinte pelo incumprimento do prazo de reembolso.


Não está aqui em causa, de modo algum, o direito que assiste à administração tributária de, através da DGCI, fiscalizar o conteúdo das declarações periódicas de IRS preenchidas pelos sujeitos passivos. Muito pelo contrário: uma fiscalização rigorosa e eficaz contribui para desincentivar e combater a fraude e evasão fiscais e desse modo alcançar uma maior e melhor justiça fiscal.


O que não pode aceitar-se é que a DGCI, no exercício deste seu direito, ignore direitos dos contribuintes igualmente importantes na realização dessa mesma justiça fiscal.


O artigo 16º, nº 2, do Decreto-Lei nº 42/91, de 22 de Janeiro, atribui aos contribuintes o direito ao recebimento de juros sobre o montante de reembolso de IRS que se venha a apurar, sempre que “por motivos imputáveis aos serviços” o prazo legal de restituição desses reembolsos não seja cumprido.


Se os serviços da administração tributária entendem não proceder a determinado reembolso sem primeiro se certificarem da regularidade das declarações que serviriam de base à liquidação e subsequente processamento desse reembolso, optando antes por desencadear uma fiscalização e, sendo caso disso, um processo de alteração dos elementos declarados pelo sujeito passivo, para só depois pagar o reembolso considerado devido, não pode senão concluir-se que tal decisão da administração tributária é um acto voluntário, uma opção cujas consequências não poderá deixar de assumir.


Com efeito, nada obriga a administração a proceder à fiscalização e alteração de elementos antes de proceder à liquidação e reembolso do imposto apurado com base nos factos declarados pelo sujeitos passivos.


Muito pelo contrário: enquanto que para reembolsar os sujeitos passivos do IRS pago em excesso a administração tributária dispõe de um prazo relativamente curto (três meses, contados a partir do termo do prazo previsto no artigo 97º, nº 1, do CIRS), o prazo de que dispõe para efectuar eventuais liquidações adicionais que venham a revelar-se necessárias é bastante mais alargado: esse direito à liquidação apenas caduca se a mesma não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos contados a partir do termo do ano a que se reporta o imposto ou no prazo de três anos se a liquidação resultar necessária por força de erros evidenciados nas declarações ou por motivo de aplicação dos indicadores objectivos da actividade previstos na lei – cfr. artigos 92º, nº 1, do CIRS e 45º da LGT. Acresce que estes prazos podem vir a revelar-se na realidade mais alargados, caso haja lugar à suspensão do prazo de caducidade da liquidação nos termos previstos no artigo 46º da LGT.


Tendo a administração possibilidade de reembolsar os sujeitos passivos dentro do prazo limite consagrado no artigo 16º, nº 1, do Decreto-Lei nº 42/91, de 22 de Janeiro (dispensando-se assim do pagamento de juros) e optando por não o fazer mas, antes, por fiscalizar e alterar elementos de suporte da liquidação, difícil será concluir que o atraso no reembolso não é imputável aos serviços: é-lhes imputável porque resulta de uma sua actuação consciente e voluntária, não forçada por qualquer necessidade de previamente fiscalizar e alterar elementos declarados, já que essas alterações sempre poderiam ser efectuadas depois de processados os reembolsos, ficando os sujeitos passivos nesse caso obrigados ao pagamento de juros compensatórios relativamente ao montante eventualmente reembolsado em excesso.


Reconheço as vantagens de a correcção de erros de preenchimento das declarações ocorrer em momento anterior à liquidação, desde logo em termos de celeridade e economia de recursos humanos e materiais: será preferível efectuar uma liquidação que desde logo se aproxime o mais possível da real situação tributária do sujeito passivo, do que começar por efectuar uma liquidação que se suspeita, à partida, que terá de ser revista, com eventual necessidade de liquidações adicionais, notificações para reposição de imposto reembolsado em excesso, acrescido de juros, etc.


Porém, a opção por este controlo dos elementos declarados previamente à emissão e pagamento dos reembolsos, não pode deixar de ter como suporte uma boa organização e, se necessário, um reforço do meios à disposição dos serviços encarregues de tal controlo, de modo a que o mesmo não venha a revelar-se contraproducente, quer protelando indefinidamente o pagamento dos reembolsos devidos, quer prejudicando os contribuintes fiscalizados com o não pagamento de juros quando tais reembolsos são assim protelados.


Quanto ao argumento da DSIRS, de que a alteração dos elementos declarados decorre de incorrecções no preenchimento das declarações entregues pelos contribuintes, devendo por isso o atraso no reembolso ser imputado a estes e não à administração tributária, não pode, de todo, aceitar-se: o incorrecto preenchimento das declarações fiscais pode consubstanciar, em casos extremos, a prática do crime de fraude fiscal ou, nos casos mais frequentes, a prática da contra-ordenação fiscal actualmente prevista no artigo 119º do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho.


É nestes termos que os contribuintes podem ser penalizados pelo incorrecto preenchimento das suas declarações, e apenas no âmbito do correspondente processo penal tributário ou processo de contra-ordenação tributária, consoante o caso.


Partir de uma discordância entre o contribuinte e a DGCI quanto ao modo de preenchimento das declarações para concluir, sem mais, que o erro é do contribuinte, penalizando-o automaticamente por esse “erro” com o não recebimento de juros por atraso no reembolso, traduz, no fundo, uma sanção acessória de um crime ou contra-ordenação cuja prática não está sequer provada, a que acresce o facto de tal sanção acessória não estar legalmente prevista.


Não posso, pois, deixar de concluir que, sempre que o incumprimento do prazo de reembolso previsto no artigo 16º, nº 1, do Decreto-Lei nº 42/91, de 22 de Janeiro, seja devido à realização de fiscalizações desencadeadas pela DGCI para confirmação ou alteração dos elementos declarados pelos sujeitos passivos, aquele incumprimento é devido a “motivos imputáveis aos serviços”, sendo consequentemente gerador da obrigação de pagamento dos juros a que se refere o nº 2 da mesma disposição legal.


IV – Contagem do período relativamente ao qual são devidos juros indemnizatórios. Especificidades.


Considerando-se que o carácter voluntário da decisão da DGCI de proceder à fiscalização previamente ao pagamento do reembolso é determinante para que se lhe impute a responsabilidade pelo eventual atraso com que o reembolso venha a ser emitido, é forçoso retirar deste entendimento todas as demais consequências, nomeadamente admitindo-se que, nos casos em que o referido processo de inspecção ou fiscalização fique dependente da colaboração do sujeito passivo fiscalizado, o prazo de contagem de juros indemnizatórios se suspenda, recomeçando a correr apenas quando sejam apresentados os elementos/documentos solicitados ou quando, por qualquer outra forma, o contribuinte diligencie no sentido de permitir à administração dar seguimento ao processo (quanto mais não seja declarando expressamente perante os serviços que não dispõe dos elementos solicitados, ficando aqueles de posse de tal informação e podendo dar ao processo o rumo que, face a esta informação, julguem conveniente).


Com efeito, nesta fase do processo de fiscalização ou controlo prévio do conteúdo das declarações, a administração deixa de ser responsável pela morosidade que possa verificar-se, uma vez que o impulso processual depende, então, do contribuinte fiscalizado. Parece pois razoável que, enquanto se aguarda a colaboração do contribuinte, se suspenda a contagem do período relativamente ao qual são devidos juros pelo atraso no reembolso. A contagem desse período seria retomada no próprio dia em que o interessado entregasse os documentos ou prestasse os esclarecimentos solicitados, já que então o impulso processual passa de novo a caber à administração. (1)


É nesse sentido – e com fundamentação que subscrevo inteiramente – que aponta o Parecer n.º 69, de 18.10.2000, da autoria do Dr. Lima Guerreiro, jurista da DSJT, cujas conclusões foram sancionadas por despacho do Exmº Subdirector-Geral dos Impostos, datado de 26.10.2000, que então remeteu o assunto à DSIRS.


Certo é que tal entendimento não foi ainda adoptado pela DGCI. Ora, mesmo considerando que o estudo teórico da questão possa apresentar alguma complexidade e reconhecendo, ainda, a eventual existência de algumas dificuldades práticas de concretização da solução encontrada, não posso deixar de concluir que o tempo já decorrido desde que a DGCI teve conhecimento deste problema e deu início ao seu estudo é por demais excessivo.


Antes de concluir sumariando a posição que entendo dever ser assumida e elencando as medidas que me parecem mais urgentes para que este assunto possa, finalmente, encerrar-se, revela-se ainda necessário apontar uma última dificuldade que, embora de natureza acessória relativamente à questão principal, urge resolver simultaneamente com a mesma, sob pena de ficar comprometida a concretização da aguardada resolução definitiva da questão dos atrasos nos reembolsos de IRS e do consequente pagamento de juros aos contribuintes. Refiro-me à forma pela qual são efectuadas, habitualmente, as alterações ou correcções às declarações fiscalizadas, não raro concretizadas através da apresentação, pelos contribuintes, a conselho dos serviços, de declarações de substituição.


V – A entrega de declarações de substituição, pelos sujeitos passivos, nos casos em que a fiscalização revela divergências de entendimento entre a administração tributária e o contribuinte.


Nas queixas aqui apresentadas acerca da questão dos atrasos nos reembolsos e respectivo pagamento de juros tem sido frequente que, paralelamente, alguns Reclamantes refiram ter sido notificados, num primeiro momento, da detecção de irregularidades no preenchimento da sua declaração, dando-se-lhes a possibilidade de, se o desejassem, entregar declaração de substituição preenchida em termos que a administração tributária consideraria correctos, assim se acelerando a regularização dos erros que a administração entendia terem sido cometidos.


Relativamente ao processo de alteração dos elementos declarados, actualmente previsto no artigo 65º, n.º 4, do Código do IRS, a entrega de declaração de substituição (possibilidade prevista no artigo 59º, nº 3, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e que já constava do artigo 76º, nº 3, do revogado Código de Processo Tributário) apresenta evidentes vantagens, desde logo por garantir maior informalidade e celeridade na correcção de tais erros, dado corresponder à elaboração, pelos contribuintes, de um documento de correcção apto a ser introduzida no sistema informático.


No entanto, algumas das consequências da entrega de uma declaração de substituição não são do conhecimento dos contribuintes, cabendo aos serviços que lhes dão a conhecer esta possibilidade de actuação o dever de, simultaneamente, os elucidar quanto a tais consequências, de modo a que os interessados optem livremente e com pleno conhecimento de causa pela entrega da declaração de substituição ou, alternativamente, por aguardar o fim do processo que a administração entenda levar a cabo para efeitos de alteração das suas declarações iniciais.


Uma das consequências da entrega de declarações de substituição que os contribuintes geralmente vêm a conhecer apenas vários meses depois de já terem optado por esta via de mais rapidamente desbloquear os reembolsos suspensos, é a dos efeitos contra-ordenacionais de tal actuação.


De facto, embora o artigo 59º, nº 3, alínea b), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, disponha expressamente que a entrega de declaração de substituição não prejudica a responsabilidade contra-ordenacional que ao caso couber, as queixas apresentadas na Provedoria de Justiça revelam grande desconhecimento desta realidade pelos contribuintes o que, se não os isenta do dever de pagamento das coimas aplicáveis, não pode deixar de justificar uma especial atenção da administração no sentido de uma maior divulgação dos exactos termos em que a entrega de declarações de substituição se encontra prevista.


Acrescente-se, aliás, que uma participação mais activa dos serviços da administração tributária na elucidação dos cidadãos quanto ao alcance dos seus direitos e deveres para com o fisco revela-se, neste caso, particularmente justificada e exigível, quer porque sempre o seria face ao dever de colaboração mútua que, regra geral, deve pautar as relações entre a administração e os cidadãos, quer porque, no caso vertente, a entrega de declarações de substituição consubstancia uma forma de simplificar a alteração dos elementos declarados pelos sujeitos passivos, sendo manifestas as vantagens que os serviços da administração tributária retiram deste procedimento, dispensados que ficam de fundamentar a alteração que se propõem fazer, de notificar tal intenção aos sujeitos passivos, de apreciar o que estes eventualmente tenham a dizer sobre o assunto em sede de audição prévia, de finalmente, sendo caso disso, tomar e fundamentar a decisão final de alteração de elementos e de, então, elaborar o correspondente documento de correcção.


Parece-me pois de toda a justiça que os cidadãos a quem é dado conhecimento desta via simplificada de resolução de um diferendo com a DGCI quanto ao modo de preenchimento das suas declarações de IRS, sejam simultaneamente esclarecidos de todas as consequências (vantagens e desvantagens) desta sua actuação.


Para o conseguir, bastará que às notificações a enviar aos contribuintes informando-os da existência de discrepâncias entre o que foi por eles declarado e o que a DGCI considera que deveria ter sido declarado, sejam adicionadas informações um pouco mais detalhadas sobre as consequências da entrega das declarações de substituição, nomeadamente quanto à mencionada questão da responsabilidade contra-ordenacional.


Importa também assegurar que todos os serviços periféricos da DGCI assumam, a este respeito, comportamentos uniformes, sob pena de contribuintes em idêntica situação serem tratados de forma diferente, sem qualquer justificação: das queixas aqui apresentadas resulta que apenas em alguns casos se optou por dar aos sujeitos passivos a possibilidade de entregar declarações de substituição, sendo que em outros casos foi de imediato dado início ao processo de alterações previsto no artigo 65º, n.º 4, do CIRS.


Quanto à questão do direito a juros por atraso na emissão dos reembolsos dos contribuintes que se dispõem a entregar declarações de substituição preenchidas de acordo com as instruções ou conselhos recebidos junto dos serviços, e uma vez que esta sua actuação consubstancia uma forma de colaboração com a administração da qual esta retira, como se disse, evidentes vantagens, é de toda a justiça que estes contribuintes não se vejam privados do pagamento dos juros que sempre deveriam receber se, em lugar de apresentar declaração de substituição, aguardassem que a administração tributária procedesse à alteração de elementos nos termos previstos no artigo 65º, n.º 4, do CIRS.


VI – Conclusões


Concluo, pois, pela necessidade de alterar aquela que tem vindo a ser a linha de orientação da DGCI nesta matéria, mormente no que toca ao pagamento de juros por atraso na concretização dos reembolsos de IRS que, findas as fiscalizações e efectuadas as correcções consideradas necessárias, se conclua serem devidos, pelo que recomendo: 







1. Que, nos casos em que o incumprimento do prazo legal de restituição oficiosa do imposto, previsto nos artigos 16º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 42/91, de 22 de Janeiro, e 96º, n.º 1, do Código do IRS, seja motivado pela realização de diligências prévias de fiscalização e controle das declarações de rendimentos apresentadas pelos sujeitos passivos, o reembolso que venha a ser apurado a final seja sempre acompanhado do pagamento dos juros indemnizatórios previstos nos artigos 16º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 42/91, de 22 de Janeiro, 96º do Código do IRS (CIRS) e 43º, n.º 3, alínea a), da Lei Geral Tributária (LGT).


Deverão, pois, ser pagos os referidos juros indemnizatórios em qualquer uma das seguintes situações: 







1. Reembolsos emitidos após o prazo legal de restituição oficiosa do imposto quando as diligências de fiscalização e controle das declarações de rendimentos não dão origem a qualquer alteração dos elementos declarados pelos sujeitos passivos;


2. Reembolsos emitidos após o prazo legal de restituição oficiosa do imposto quando as diligências de fiscalização e controle das declarações de rendimentos dão origem a alterações dos elementos inicialmente declarados pelos sujeitos passivos e estas alterações são oficiosamente efectuadas pela DGCI, conforme previsto no artigo 65º, n.º 4, do Código do IRS (revisto pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho);


3. Reembolsos emitidos após o prazo legal de restituição oficiosa do imposto quando as diligências de fiscalização e controle das declarações de rendimentos dão origem a alterações dos elementos inicialmente declarados pelos sujeitos passivos e estas alterações são concretizadas através da apresentação, pelos sujeitos passivos, de declaração de substituição contendo as correcções que a DGCI entende deverem ser feitas, sendo esta declaração de substituição utilizada como documento de correcção para a realização da liquidação do imposto nos termos que a DGCI considera exactos.


2. Que, nos casos em que o processo de inspecção ou fiscalização prévia das declarações fique dependente da colaboração do sujeito passivo fiscalizado, o prazo de contagem de juros indemnizatórios se suspenda com a notificação ao sujeito passivo para que, em determinado prazo, apresente os elementos ou preste os esclarecimentos considerados necessários, recomeçando a correr logo que o mesmo dê cumprimento a tal pedido de colaboração ou, se não o fizer, logo que termine o prazo que lhe foi dado para o efeito.


3. Que, no decurso do processo de fiscalização prévia das suas declarações de rendimentos, os contribuintes sejam expressamente informados, através de comunicação escrita:







 1. Das principais consequências da entrega de declarações de substituição destinadas a concretizar alterações que a DGCI considere pertinentes, nomeadamente do facto de a entrega dessas declarações de substituição não prejudicar a responsabilidade contra-ordenacional que ao caso couber (cfr. artigo 59º, n.º 3, alínea b), do CPPT);


2. Do facto de a contagem do período relativamente ao qual serão pagos juros por incumprimento do prazo legal de reembolso se suspender desde a data em que o contribuinte fiscalizado é notificado para, em determinado prazo, apresentar elementos ou prestar esclarecimentos, até ao momento em que dê cumprimento a tal pedido de colaboração ou em que termine o prazo que lhe foi dado para o fazer.


4. Que o entendimento sumariado nos pontos supra quanto ao direito ao recebimento de juros indemnizatórios por incumprimento do prazo de restituição oficiosa do IRS seja aplicado a todas as situações futuras e desde já a todos os processos actualmente pendentes de apreciação e de decisão e, ainda, a todos os casos passados e já terminados, desde que este últimos sejam do conhecimento da DGCI, e desde que esta possa vir a identificar como incluídos no âmbito da nova interpretação das normas legais objecto da presente Recomendação.



Nos termos do disposto no artigo 38º, n.º 2, da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, deverá V. Exª comunicar-me o acatamento desta Recomendação ou, porventura, o fundamento detalhado do seu não acatamento, no prazo de sessenta dias.


Com os melhores cumprimentos,


O Provedor de Justiça,
H. Nascimento Rodrigues


 


 


 


Nota de rodapé:


(1) É evidente que só faz sentido falar-se em suspensão do prazo de contagem de juros quando se vier a concluir, no final do processo de fiscalização, que há lugar a alterações ou correcções das declarações entregues pelos sujeitos passivos, pois de outro modo o prazo de reembolso e o período de pagamento de juros correrão ininterruptamente: como acima se disse, é entendimento pacífico e já claramente assumido pela DGCI, que no caso de a acção de fiscalização não revelar quaisquer irregularidades a corrigir, sempre haverá direito ao pagamento de juros pelo atraso no reembolso. Neste caso não se justifica qualquer suspensão do respectivo prazo, uma vez que todo o atraso é total e exclusivamente imputável à administração que optou por suspender um reembolso que, afinal, se vem a constatar que estava em condições ideais de ter sido emitido e pago em tempo.
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