ANOTAÇÃO
Entidade visada: Câmara Municipal de Sintra
Proc.º: R-3665/04
Área: A1
Assunto: Urbanismo – utilização das edificações – título constitutivo da propriedade horizontal – licença de utilização – alteração – legitimidade.
Objecto: Reclamava-se da Câmara Municipal de Sintra por admitir e deferir requerimento de licença para alterar o uso de uma fracção autónoma sem ter obtido a anuência dos demais condóminos e em infracção ao título constitutivo de propriedade horizontal.
Decisão: Conclui-se pela necessidade da apresentação, como prova da legitimidade do requerente para prover à alteração pretendida, do título constitutivo alterado onde figure a alteração ou, pelo menos, de prova da autorização de todos os condóminos, de acordo com o disposto nos art. 1418º, n.º 2, alínea a), e art. 1419º, n.º 1 e n.º 2 do Código Civil.
Síntese:
I. Entendia a Câmara Municipal de Sintra não ser exigível a anuência dos demais condóminos, de prédio constituído em propriedade horizontal, na verificação da legitimidade do requerente de licença de alteração da utilização de uma fracção autónoma, mesmo nos casos em que este pretendia afectar à actividade industrial uma fracção destinada, pelo título constitutivo da propriedade horizontal, a armazém/loja (fim coincidente com a primitiva licença municipal de utilização). Isto porquanto se entendia que a autorização de condomínio representava uma determinação exclusivamente de cariz jurídico-privado, à qual a câmara municipal deveria ser alheia.
II. Opôs o Provedor de Justiça que não pode a câmara municipal abster-se, sem mais, de conferir a legitimidade de uma nova utilização para uma fracção autónoma, como não pode abster-se de conferir a legitimidade por invocação de um título possessório como condição para apreciar o pedido de licenciamento de uma qualquer operação urbanística.
III. A prova de legitimidade para requerer a alteração pretendida será a exibição do título constitutivo alterado e onde figura a nova destinação ou, pelo menos, a prova da autorização de todos os condóminos, de acordo com o disposto nos artigos 1418º, n.º2, alínea a) e 1419º, n.º1 e n.º2 do Código Civil).
IV. Isto porque a considerar-se dispensada a apresentação de tal prova de legitimidade estar-se-ia a favorecer a possibilidade da fraude à lei (neste caso do artigo 1422º, n.º 2, alínea c) do Código Civil) por parte do condómino/requerente que lograria, por meio da intervenção municipal, destinar a um uso diverso do fim previsto no título constitutivo da propriedade horizontal a fracção que lhe pertence, mesmo contra a vontade opositora dos restantes condóminos.
V. Acresce, que uma vez que a licença municipal prevalece e é condição de validade do título constitutivo, o requerente alcançaria a nulidade parcial do título – no que lhe conviesse – ultrapassando a maioria dos condóminos opositores, se for esse o caso. Isto, porque, de acordo com o artigo 1418.º, n.º3, do Código Civil, é a validade do título que cede perante a licença municipal de utilização.
VI. Compactuar-se-ia, do mesmo passo, com o defraudar das legítimas expectativas dos demais condóminos, quanto à utilização das várias fracções que integram o edifício (compreende-se não ser indiferente a utilização para armazém/loja da utilização para a actividade industrial).
VII. Viria o Presidente da Câmara Municipal de Sintra, por despacho de 29.10.2006, a acolher este entendimento, determinando que passasse a ser exigida como prova da legitimidade do requerente/condómino para prover à alteração da utilização da fracção que lhe pertence, ou à promoção de obras que impliquem modificações nas partes comuns, exibição da necessária autorização do condomínio com as maiorias qualificadas que, de acordo com o pretendido, sejam exigidas pelas normas civilísticas disciplinadoras das relações de condomínio – art. 1419º, nº 1, art. 1422º, nºs 3 e 4 do Código Civil.
VIII. Em face desta alteração de conduta foi determinado o arquivamento ao abrigo da previsão contida no art. 31º, alínea c), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril.