Código Deontológico; Ordem dos Médicos.
Em exposição apresentada ao Provedor de Justiça, observando-se ser o disposto no art.º 47.º, n.º 3, do Código Deontológico da Ordem dos Médicos (CDOM) mais restritivo do que dispõe actualmente o Código Penal (CP), no seu art.º 142.º, ao excluir a punibilidade, em certas circunstâncias, de factos que recairiam sob a alçada do disposto no respectivo art.º 140.º, conclui-se pedindo que fosse dirigida recomendação ou parecer à Ordem dos Médicos, no sentido da superação da divergência apontada.
Como centro da pretensão, e do fundamento que se lhe quis dar, cite-se o n.º 25 da exposição em causa, ao defender que o “art.º 47.º do CD[OM] deve (…) acompanhar a legislação em vigor, qualquer que seja ela, não podendo em circunstância alguma restringi-la ou boicotá-la, anulando-lhe o alcance que o Estado de Direito pretendeu dar-lhe.”
Não se concordando, nem com as premissas, nem com as conclusões, tudo se deverá a um equívoco quanto à necessária distinção entre normas deontológicas e normas jurídicas, e ao papel indubitavelmente diverso que tem a lei penal (ainda que numa vertente excludente da ilicitude) e o acervo deontológico elaborado no decurso de gerações por determinada classe profissional.
Na verdade, não cabe ao Provedor de Justiça, nem a terceiro, forçar a classe médica a adoptar esta ou aquela regra de conduta deontológica. No respeito, claro está, de grandes princípios, esses sim estruturantes do Estado de Direito democrático, como o da igualdade ou, também, o da legalidade, mas apenas no plano das condutas impostas, foi o próprio Estado que, em aplicação de faculdade hoje expressamente consagrada na Constituição (art.º 267.º, n.º 4), entendeu constituir uma associação pública na qual obrigatoriamente tivessem assento todos aqueles que em Portugal se dedicam à actividade médica, cabendo-lhes a eles, nos órgãos estatutariamente estabelecidos, deliberar sobre a sua própria deontologia.
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