Estatuto do Provedor de Justiça
2013-02-19
Estatuto do Provedor de Justiça
Lei n.º 9/91, de 9 de abril
(Alterada pela Lei n.º 30/96, de 14 de agosto, Lei n.º 52-A/2005, de 10 de outubro e Lei n.º 17/2013, de 18 de fevereiro)
CAPÍTULO I
Princípios gerais
Artigo 1.º
Funções
1 – O Provedor de Justiça é, nos termos da Constituição, um órgão do Estado eleito pela Assembleia da República, que tem por função principal a defesa e promoção dos direitos, liberdades, garantias e interesses legítimos dos cidadãos, assegurando, através de meios informais, a justiça e a legalidade do exercício dos poderes públicos.
2 – O Provedor de Justiça pode exercer também funções de instituição nacional independente de monitorização da aplicação de tratados e convenções internacionais em matéria de direitos humanos, quando para o efeito for designado.
3 – O Provedor de Justiça assegura a cooperação com instituições congéneres e com as organizações da União Europeia e internacionais no âmbito da defesa e promoção dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
4 – O Provedor de Justiça goza de total independência no exercício das suas funções.
Artigo 2.º
Âmbito de atuação
1 – As ações do Provedor de Justiça exercem-se, nomeadamente, no âmbito da atividade dos serviços da administração pública central, regional e local, das Forças Armadas, dos institutos públicos, das empresas públicas ou de capitais maioritariamente públicos ou concessionárias de serviços públicos ou de exploração de bens do domínio público, das entidades administrativas independentes, das associações públicas, designadamente das ordens profissionais, das entidades privadas que exercem poderes públicos ou que prestem serviços de interesse geral.
2 – O âmbito de atuação do Provedor de Justiça pode ainda incidir em relações entre particulares que impliquem uma especial relação de domínio, no âmbito da proteção de direitos, liberdades e garantias.
Artigo 3.º
Direito de queixa
Os cidadãos, pessoas singulares ou coletivas, podem apresentar queixas por ações ou omissões dos poderes públicos ao Provedor de Justiça, que as aprecia sem poder decisório, dirigindo aos órgãos competentes as recomendações necessárias para prevenir e reparar injustiças.
Artigo 4.º
Autonomia
1 – A atividade do Provedor de Justiça pode ser exercida por iniciativa própria, na defesa e promoção dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, e interesses legítimos destes, designadamente os mais vulneráveis em razão da idade, da raça ou da etnia, do género ou da deficiência.
2 – A atividade do Provedor de Justiça é independente dos meios graciosos e contenciosos previstos na Constituição e nas leis.
CAPÍTULO II
Estatuto
Artigo 5.º
Designação
1 – O Provedor de Justiça é designado pela Assembleia da República por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções.
2 – A designação recai em cidadão que preencha os requisitos de elegibilidade para a Assembleia da República e goze de comprovada reputação de integridade e independência.
3 – O Provedor de Justiça toma posse perante o Presidente da Assembleia da República.
Artigo 6.º
Duração do mandato
1 – O Provedor de Justiça é eleito por quatro anos, podendo ser reeleito apenas uma vez, por igual período.
2 – Após o termo do período por que foi designado, o Provedor de Justiça mantém- se em exercício de funções até à posse do seu sucessor.
3 – A designação do Provedor deve efetuar-se nos 30 dias anteriores ao termo do quadriénio.
4 – Quando a Assembleia da República se encontrar dissolvida, ou não estiver em sessão, a eleição tem lugar dentro dos 15 dias a partir da primeira reunião da Assembleia eleita ou a partir do início de nova sessão, sem prejuízo de convocação extraordinária para o efeito.
Artigo 7.º
Independência e inamovibilidade
O Provedor de Justiça é independente e inamovível, não podendo as suas funções cessar antes do termo do período por que foi designado, salvo nos casos previstos na presente lei.
Artigo 8.º
Imunidades
1 – O Provedor de Justiça não responde civil ou criminalmente pelas recomendações, reparos ou opiniões que emita ou pelos atos que pratique no exercício das suas funções.
2 – O Provedor de Justiça não pode ser detido ou preso sem autorização da Assembleia da República, salvo por crime punível com a pena de prisão superior a 3 anos e em flagrante delito.
3 – Movido procedimento criminal contra o Provedor de Justiça, e acusado definitivamente, a Assembleia da República delibera se o Provedor de Justiça deve ou não ser suspenso para efeito de seguimento do processo, salvo no caso de crime punível com a pena referida no número anterior.
4 – Na hipótese prevista no n.º 2 do presente artigo, a prisão implica a suspensão do exercício das funções do Provedor de Justiça pelo período em que aquela se mantiver.
Artigo 9.º
Honras, direitos e garantias
O Provedor de Justiça tem os direitos, honras, precedência, categoria, remunerações e regalias idênticas às de ministro, incluindo as constantes da Lei n.º 4/85, de 9 de abril, designadamente nos n.os 1 e 2 do seu artigo 12.º.
Artigo 10.º
Gabinete do Provedor de Justiça
1 – É criado um gabinete do Provedor de Justiça, que presta apoio direto e pessoal ao Provedor de Justiça.
2 – O Provedor de Justiça tem um gabinete composto por um lugar de chefe de gabinete, por três lugares de adjuntos e por quatro lugares de secretariado.
3 – Os membros do gabinete são livremente nomeados e exonerados pelo Provedor de Justiça.
4 – São aplicáveis aos membros do gabinete o regime de provimento e de remuneração, bem como as normas relativas a garantias e deveres, dos membros dos gabinetes ministeriais.
Artigo 11.º
Incompatibilidades
1 – O Provedor de Justiça está sujeito às incompatibilidades dos magistrados judiciais em exercício.
2 – O Provedor de Justiça não pode exercer quaisquer funções em órgãos de partidos ou associações políticas, nem desenvolver atividades partidárias de caráter público.
Artigo 12.º
Dever de sigilo
1 – O Provedor de Justiça é obrigado a guardar sigilo relativamente aos factos de que tome conhecimento no exercício das suas funções, se tal sigilo se impuser em virtude da natureza dos mesmos factos.
2 – (Revogado.)
Artigo 13.º
Garantias de trabalho
1 – O Provedor de Justiça não pode ser prejudicado na estabilidade do seu emprego, na sua carreira e no regime de segurança social de que beneficie.
2 – O tempo de serviço prestado como Provedor de Justiça conta, para todos os efeitos, como prestado nas funções de origem, bem como para aposentação e reforma, mesmo que no momento da designação não exercesse funções que lhe conferissem tal direito.
3 – O Provedor de Justiça beneficia do regime de segurança social.
Artigo 14.º
Identificação e livre-trânsito
1 – O Provedor de Justiça tem direito a cartão especial de identificação emitido pelos serviços competentes da Assembleia da República.
2 – O cartão de identificação é simultaneamente de livre-trânsito e acesso a todos os locais de funcionamento da administração central, regional, local e institucional, serviços civis e militares e demais entidades sujeitas ao controlo do Provedor de Justiça.
Artigo 15.º
Vagatura do cargo
1 – As funções de Provedor de Justiça só cessam antes do termo do quadriénio nos seguintes casos:
a) Morte ou impossibilidade física permanente;
b) Perda dos requisitos de elegibilidade para a Assembleia da República;
c) Incompatibilidade superveniente;
d) Renúncia.
2 – Os motivos de cessação de funções são verificados pela Assembleia da República nos termos do seu Regimento.
3 – No caso de vagatura do cargo, a designação do Provedor de Justiça deve ter lugar dentro dos 30 dias imediatos, observando-se o disposto no n.º 4 do artigo 6.º.
4 – O Provedor de Justiça não está sujeito às disposições legais em vigor sobre a aposentação e reforma por limite de idade.
Artigo 16.º
Provedores-adjuntos
1 – O Provedor de Justiça pode nomear e exonerar a todo o tempo dois provedores- adjuntos, de entre indivíduos habilitados com o curso superior adequado e comprovada reputação de integridade e independência.
2 – O Provedor de Justiça pode delegar num dos provedores-adjuntos as atribuições relativas aos direitos da criança, para que este as exerça de forma especializada.
3 – O Provedor de Justiça pode delegar nos provedores-adjuntos os poderes referidos nos artigos 21.º, 27.º, 28.º, 30.º a 34.º e 42.º, e designar aquele que deve assegurar o funcionamento dos serviços no caso de cessação ou interrupção do respetivo mandato.
4 – Aplicam-se aos provedores-adjuntos as disposições dos artigos 11.º, 12.º, 13.º e 14.º.
Artigo 17.º
Coadjuvação nas funções
1 – O Provedor de Justiça é coadjuvado no exercício das suas funções por coordenadores e assessores.
2 – A organização das áreas de coadjuvação dos coordenadores e assessores, bem como a sua articulação com o gabinete e o secretário-geral, consta de regulamento aprovado pelo Provedor de Justiça e publicado no Diário da República.
3 – Por regulamento aprovado pelo Provedor de Justiça e publicado no Diário da República podem ser criadas extensões da Provedoria de Justiça nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
Artigo 18.º
Garantia de autoridade
O Provedor de Justiça, os provedores-adjuntos de Justiça, os coordenadores e os assessores são considerados autoridades públicas, inclusive para efeitos penais.
Artigo 19.º
Auxílio das autoridades
Todas as autoridades e agentes de autoridade devem prestar ao Provedor de Justiça o auxílio que lhes for solicitado para o bom desempenho das suas funções.
CAPÍTULO III
Atribuições
Artigo 20.º
Competências
1 – Ao Provedor de Justiça compete:
a) Dirigir recomendações aos órgãos competentes com vista à correção de atos ilegais ou injustos dos poderes públicos ou à melhoria da organização e procedimentos administrativos dos respetivos serviços;
b) Assinalar as deficiências de legislação que verificar, emitindo recomendações para a sua interpretação, alteração ou revogação, ou sugestões para a elaboração de nova legislação, as quais serão enviadas ao Presidente da Assembleia da República, ao Primeiro-Ministro e aos ministros diretamente interessados e, igualmente, se for caso disso, aos Presidentes das Assembleias Legislativas das regiões autónomas e aos Presidentes dos Governos Regionais;
c) Emitir parecer, a solicitação da Assembleia da República, sobre quaisquer matérias relacionadas com a sua atividade;
d) Promover a divulgação do conteúdo e da significação de cada um dos direitos e liberdades fundamentais, bem como da finalidade da instituição do Provedor de Justiça, dos meios de ação de que dispõe e de como a ele se pode fazer apelo;
e) Intervir, nos termos da lei aplicável, na tutela dos interesses coletivos ou difusos, quando estiverem em causa entidades públicas, empresas e serviços de interesse geral, qualquer que seja a sua natureza jurídica.
2 – Compete ao Provedor de Justiça integrar o Conselho de Estado.
3 – Compete ao Provedor de Justiça requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade de normas, nos termos do artigo 281.º, n.os 1 e 2, alínea d), da Constituição.
4 – Compete ao Provedor de Justiça requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação e verificação de inconstitucionalidade por omissão, nos termos do n.º 1 do artigo 283.º
5 – As recomendações à Assembleia da República e às Assembleias Legislativas das regiões autónomas são publicadas nos respetivos jornais oficiais.
Artigo 21.º
Poderes
1 – No exercício das suas funções, o Provedor de Justiça tem poderes para:
a) Efetuar, com ou sem aviso, visitas de inspeção a todo e qualquer setor da atividade da administração central, regional e local, designadamente serviços públicos e estabelecimentos prisionais civis e militares, empresas e serviços de interesse geral, qualquer que seja a sua natureza jurídica, ou a quaisquer entidades sujeitas ao seu controlo, ouvindo os respetivos órgãos e agentes e pedindo as informações, bem como a exibição de documentos, que reputar convenientes;
b) Proceder a todas as investigações e inquéritos que considere necessários ou convenientes, podendo adotar, em matéria de recolha e produção de provas, todos os procedimentos razoáveis, desde que não colidam com os direitos e interesses legítimos dos cidadãos;
c) Procurar, em colaboração com os órgãos e serviços competentes, as soluções mais adequadas à tutela dos interesses legítimos dos cidadãos e ao aperfeiçoamento da ação administrativa.
2 – A atuação e intervenção do Provedor de Justiça não são limitadas pela utilização de meios graciosos e contenciosos previstos na Constituição e nas leis nem pela pendência desses meios, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.
Artigo 22.º
Limites de intervenção
1 – O Provedor de Justiça não tem competência para anular, revogar ou modificar os atos dos poderes públicos e a sua intervenção não suspende o decurso de quaisquer prazos, designadamente os de recurso hierárquico e contencioso.
2 – Ficam excluídos dos poderes de inspeção e fiscalização do Provedor de Justiça os órgãos de soberania e os órgãos de governo próprio das regiões autónomas, com exceção da sua atividade administrativa e dos atos praticados na superintendência da Administração Pública.
3 – As queixas relativas à atividade judicial que, pela sua natureza, não estejam fora do âmbito da atividade do Provedor de Justiça serão tratadas através do Conselho Superior da Magistratura, do Conselho Superior do Ministério Público ou do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, conforme os casos.
Artigo 23.º
Relatório e colaboração com a Assembleia da República
1 – O Provedor de Justiça envia anualmente à Assembleia da República, até 30 de abril, um relatório da sua atividade, anotando as iniciativas tomadas, as queixas recebidas, as diligências efetuadas e os resultados obtidos, o qual é publicado no Diário da Assembleia da República.
2 – A atividade referida no n.º 2 do artigo 1.º consta de anexo autónomo ao relatório mencionado no número anterior e é remetido pelo Provedor de Justiça ao organismo internacional a que disser respeito.
3 – A fim de tratar de assuntos da sua competência, o Provedor de Justiça pode tomar parte nos trabalhos das comissões parlamentares competentes, quando o julgar conveniente e sempre que estas solicitem a sua presença.
CAPÍTULO IV
Procedimento
Artigo 24.º
Iniciativa
1 – O Provedor de Justiça exerce as suas funções com base em queixas apresentadas pelos cidadãos, individual ou coletivamente, ou por iniciativa própria, relativamente a factos que por qualquer outro modo cheguem ao seu conhecimento.
2 – As queixas ao Provedor de Justiça não dependem de interesse direto, pessoal e legítimo, nem de quaisquer prazos.
Artigo 25.º
Apresentação de queixas
1 – As queixas podem ser apresentadas oralmente ou por escrito, por simples carta, fax, correio eletrónico ou outro meio de comunicação, e devem conter a identidade e morada do queixoso e, sempre que possível, a sua assinatura e meios adicionais de contacto, bem como a identificação da entidade visada.
2 – Quando apresentadas oralmente, são reduzidas a auto, que o queixoso assina sempre que saiba e possa fazê-lo.
3 – As queixas podem ser apresentadas diretamente ao Provedor de Justiça ou a qualquer agente do Ministério Público, que lhas transmite imediatamente.
4 – Quando as queixas não forem apresentadas em termos adequados, é ordenada a sua substituição.
5 – É garantido o sigilo sobre a identidade do queixoso sempre que tal seja solicitado pelo próprio e quando razões de segurança o justifiquem.
Artigo 26.º
Queixas transmitidas pela Assembleia da República
A Assembleia da República, as comissões parlamentares e os Deputados podem ouvir o Provedor de Justiça e solicitar-lhe as diligências necessárias à prossecução das petições ou queixas que lhes sejam enviadas.
Artigo 27.º
Apreciação preliminar das queixas
1 – As queixas são objeto de uma apreciação preliminar tendente a avaliar da sua admissibilidade.
2 – São indeferidas liminarmente as queixas:
a) Sem qualquer possibilidade de identificação do queixoso, se tal elemento for essencial à apreciação da matéria, ou da entidade visada;
b) Manifestamente apresentadas de má fé ou desprovidas de fundamento;
c) Que não sejam da competência do Provedor de Justiça.
3 – As decisões de abertura do processo, bem como de indeferimento liminar, devem ser levadas ao conhecimento do queixoso, pelo meio mais célere e eficaz.
Artigo 28.º
Instrução
1 – A instrução consiste em pedidos de informação, inspeções, exames, inquirições ou qualquer outro procedimento razoável que não colida com os direitos fundamentais dos cidadãos e é efetuada por meios informais e expeditos, sem sujeição às regras processuais relativas à produção de prova.
2 – As diligências são efetuadas pelo Provedor de Justiça e seus colaboradores, podendo também a sua execução ser solicitada diretamente aos agentes do Ministério Público ou quaisquer outras entidades públicas com prioridade e urgência, quando for caso disso.
Artigo 29.º
Dever de cooperação
1 – Os órgãos e agentes das entidades referidas no n.º 1 do artigo 2.º têm o dever de prestar todos os esclarecimentos e informações que lhes sejam solicitados pelo Provedor de Justiça.
2 – As entidades referidas no número anterior prestam ao Provedor de Justiça toda a colaboração que por este lhes for solicitada, designadamente informações, efetuando inspeções através dos serviços competentes e facultando documentos e processos para exame, remetendo-os ao Provedor, se tal lhes for pedido.
3 – O disposto nos números anteriores não prejudica as restrições legais respeitantes ao segredo de justiça nem a invocação de interesse superior do Estado, nos casos devidamente justificados pelos órgãos competentes, em questões respeitantes à segurança, à defesa ou às relações internacionais.
4 – O Provedor de Justiça pode fixar por escrito prazo não inferior a 10 dias para satisfação de pedido que formule com nota de urgência.
5 – O Provedor de Justiça pode determinar a presença na Provedoria de Justiça, ou noutro qualquer local que indicar e que as circunstâncias justifiquem, de qualquer trabalhador ou representante das entidades referidas no n.º 1, mediante requisição à entidade hierarquicamente competente, ou de qualquer titular de órgão sujeito ao seu controlo, a fim de lhe ser prestada a cooperação devida.
6 – O incumprimento não justificado do dever de cooperação previsto nos n.os 1, 2, 4 e 5 do presente artigo, por parte de trabalhador ou representante das entidades referidas no n.º 1, constitui crime de desobediência, sem prejuízo do procedimento disciplinar que no caso couber.
Artigo 30.º
Depoimentos
1 – O Provedor de Justiça pode solicitar a qualquer cidadão depoimentos ou informações sempre que os julgar necessários para apuramento de factos.
2 – O mero dever de sigilo, que não decorra da Constituição ou da lei, de quaisquer cidadãos ou entidades, cede perante o dever de cooperação com o Provedor de Justiça no âmbito da competência deste.
3 – Considera-se justificada a falta ao serviço determinada pelo dever de comparência.
4 – Em caso de recusa de depoimento ou falta de comparência no dia e hora designados, o Provedor de Justiça pode notificar, mediante aviso postal registado, as pessoas que devam ser ouvidas, constituindo crime de desobediência qualificada a falta injustificada de comparência ou a recusa de depoimento.
5 – As despesas de deslocação e outras que, a pedido do convocado, forem autorizadas pelo Provedor de Justiça são pagas por conta do orçamento da Provedoria de Justiça.
Artigo 31.º
Arquivamento
1 – São mandados arquivar os processos:
a) Quando o Provedor de Justiça conclua não serem da sua competência;
b) Quando o Provedor conclua que a queixa não tem fundamento ou que não existem elementos bastantes para ser adotado qualquer procedimento;
c) Quando a ilegalidade ou injustiça invocadas já tenham sido reparadas.
2 – As decisões de arquivamento devem ser levadas ao conhecimento do queixoso, pelo meio mais célere e eficaz.
Artigo 32.º
Encaminhamento
1 – Quando o Provedor de Justiça reconheça que o queixoso tem ao seu alcance um meio gracioso ou contencioso, especialmente previsto na lei, pode limitar-se a encaminhá-lo para a entidade competente.
2 – Independentemente do disposto no número anterior, o Provedor deve informar sempre o queixoso dos meios contenciosos que estejam ao seu alcance.
Artigo 33.º
Casos de pouca gravidade
Nos casos de pouca gravidade, sem caráter continuado, o Provedor de Justiça pode limitar-se a uma chamada de atenção ao órgão ou serviço competente ou dar por encerrado o assunto com as explicações fornecidas.
Artigo 34.º
Audição prévia
Fora dos casos previstos nos artigos 30.º e 32.º, o Provedor de Justiça deve sempre ouvir os órgãos ou agentes postos em causa, permitindo-lhes que prestem todos os esclarecimentos necessários antes de formular quaisquer recomendações.
Artigo 35.º
Participação de infrações e publicidade
1 – Quando no decurso do processo resultarem indícios suficientes da prática de infrações criminais ou disciplinares ou contraordenações, o Provedor de Justiça deve dar conhecimento delas, conforme os casos, ao Ministério Público ou à entidade hierarquicamente competente para a instauração de processo disciplinar ou contraordenacional.
2 – Quando as circunstâncias o aconselhem, o Provedor pode ordenar a publicação de comunicados ou informações sobre as conclusões alcançadas nos processos ou sobre qualquer outro assunto relativo à sua atividade, utilizando, se necessário, os meios de comunicação social estatizados e beneficiando, num e noutro caso, do regime legal de publicação de notas oficiosas, nos termos das respetivas leis.
Artigo 36.º
Irrecorribilidade dos atos do Provedor
Sem prejuízo do disposto no artigo 44.º, os atos do Provedor de Justiça não são suscetíveis de recurso e só podem ser objeto de reclamação para o próprio Provedor.
Artigo 37.º
Queixas de má fé
Quando se verifique que a queixa foi feita de má fé, o Provedor de Justiça participa o facto ao agente do Ministério Público competente, para a instauração do procedimento criminal nos termos da lei geral.
Artigo 38.º
Recomendações
1 – As recomendações do Provedor de Justiça são dirigidas ao órgão competente para corrigir o ato ilegal ou injusto ou a situação irregular dos respetivos serviços.
2 – O órgão destinatário da recomendação deve, no prazo de 60 dias a contar da sua receção, comunicar ao Provedor de Justiça a posição que quanto a ela assume.
3 – O não acatamento da recomendação tem sempre de ser fundamentado.
4 – Se as recomendações não forem atendidas, e sempre que o Provedor não obtiver a colaboração devida, pode dirigir-se ao superior hierárquico competente ou, sendo caso disso, ao respetivo ministro da tutela.
5 – Se o órgão executivo da autarquia local não acatar as recomendações do Provedor, este pode dirigir-se à respetiva assembleia deliberativa.
6 – Se a Administração não atuar de acordo com as suas recomendações ou se recusar a prestar a colaboração pedida, o Provedor pode dirigir-se à Assembleia da República, expondo os motivos da sua tomada de posição.
7 – As recomendações do Provedor de Justiça são sempre comunicadas aos órgãos ou agentes visados e, se tiverem origem em queixa apresentada, aos queixosos.
Artigo 39.º
Isenção de custos e selos e dispensa de advogado
Os processos organizados perante o Provedor de Justiça são isentos de custos e selos e não obrigam à constituição de advogado.
CAPÍTULO V
Provedoria de Justiça
Artigo 40.º
Autonomia, instalação e fim
1 – A Provedoria de Justiça tem por função prestar o apoio técnico e administrativo necessário ao desempenho das atribuições definidas na presente lei.
2 – A Provedoria de Justiça é dotada de autonomia administrativa e financeira.
3 – A Provedoria de Justiça funciona em instalações próprias.
Artigo 41.º
Pessoal
A Provedoria de Justiça dispõe de um mapa de pessoal próprio, nos termos da respetiva lei orgânica.
Artigo 42.º
Competências administrativa e disciplinar
Compete ao Provedor de Justiça praticar todos os atos relativos ao provimento e à situação funcional do pessoal da Provedoria de Justiça, e exercer sobre ele o poder disciplinar.
Artigo 43.º
Orçamento do serviço e respetivas verbas
1 – A Provedoria de Justiça tem um orçamento anual, elaborado nos termos da respetiva lei orgânica.
2 – A dotação orçamental da Provedoria de Justiça consta de verba inscrita no orçamento da Assembleia da República.
3 – O Provedor de Justiça tem competência idêntica à de ministro para efeitos de autorização de despesas.
Artigo 44.º
Recurso contencioso
Das decisões do Provedor de Justiça, praticadas no âmbito da sua competência de gestão da Provedoria de Justiça, cabe recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos gerais.
CAPÍTULO VI
Disposições finais e transitórias
Artigo 45.º
Remissão
A designação «Provedoria de Justiça» substitui, para todos os efeitos, a de «Serviço do Provedor de Justiça» constante da legislação em vigor ou de quaisquer outros atos com eficácia legal.
Artigo 46.º
Alterações à Lei Orgânica
O Governo procederá por decreto-lei às alterações necessárias à Lei Orgânica da Provedoria de Justiça, Lei n.º 10/78, de 2 de março, no prazo de 180 dias.
Artigo 47.º
Norma revogatória
É revogada a Lei n.º 81/77, de 22 de novembro.